Aquecimento global: Cientistas preveem “aumento exponencial” de fogos no Ártico até 2050 com emissões massivas de CO2
“O aquecimento global está a exacerbar as condições que causam fogos florestais em muitas regiões, incluindo no Ártico, onde extensas turfeiras armazenam grandes quantidades de carbono”. O alerta é feito por cientistas de Espanha, França, Países Baixos e Indonésia, que argumentam que “aquecimento climático no curto-prazo causará um aumento exponencial de área ardida nos solos árticos rico em carbono antes de meados deste século”.
Num artigo publicado na revista ‘Science’, os especialistas alertam que os fogos no Ártico podem libertar “grandes quantidades de carbono” de turfeiras atualmente no pergelissolo, ou seja, estão ‘aprisionadas’ num solo permanentemente congelado. Contudo, com o aumento da temperatura do planeta, esse gelo poderá vir a derreter, expondo ao risco de incêndio essa vegetação que armazena grandes quantidades de carbono. De recordar que o Programa Ambiental das Nações Unidas (UNEP) considera que as turfeiras têm capacidade para armazenar duas vezes mais carbono do que todas as florestas do mundo.
O verão de 2020 foi o mais quente dos últimos 20 anos na região, tendo os fogos queimado “uma grande área sem precedentes de solos ricos em carbono”, escrevem os cientistas, indicando que incêndios de grandes dimensões no Ártico deverão tornar-se cada vez mais frequentes até 2050, “porque a tendência térmica está a chegar a um limite no qual pequenos aumentos de temperatura estão associados a aumentos exponenciais da área ardida”.
Entre 2019 e 2020, registou-se uma área ardida de perto de 4,7 milhões de hectares do Ártico siberiano, quase metade da dimensão consumida pelas chamas no total dos 40 anos anteriores. Os fogos de 2019 e 2020 foram responsáveis pela emissão de cerca de 150 milhões de toneladas de dióxido de carbono para a atmosfera, agravando ainda mais o aquecimento global através de um mecanismo de retroalimentação.
Estima-se que a região acima do círculo polar ártico esteja a aquecer quatro vezes mais rapidamente do que o resto do mundo, pelo que, quando maior o degelo, mais vegetação fica exposta a condições favoráveis a ocorrência de incêndios, que emitem mais dióxido de carbono e impulsionam a subida da temperatura, num ciclo vicioso.
Há dois anos, os cientistas mediram uma área ardida superior a 2,5 milhões de hectares, tendo sido libertada uma quantidade de dióxido de carbono equivalente às emissões de Espanha durante um ano. A temperatura média nessa parte da Sibéria acima do círculo polar ártico foi três vezes superior à que se registava e 1980, com a cidade de Verkoiansk, no nordeste da Rússia, a chegar a uns abrasadores 38 graus Celsius, o maior valor de sempre.
No artigo, os cientistas desenham dois cenários. Num deles, nada é feito para combater as alterações climáticas e as temperaturas continuam a subir incessantemente. Nesse quadro, fogos massivos como os que se registaram em 2020 acontecerão todos os anos no Ártico siberiano.
No outro cenário, relativamente mais otimista, em que as concentrações de gases com efeito de estufa estabilizam e a temperatura média da Terra deixa de aumentar a partir de 2050, preveem que eventos drásticos como os de 2020 só deverão ocorrer, em média, a cada 10 anos.
A concretização de um ou de outro cenário depende inteiramente das sociedades humanas, especialmente dos governos, que esta semana e na próxima estarão reunidos no Egipto, para a 27.ª cimeira mundial do clima, a COP27, que da qual se espera que resultem compromissos mais ambiciosos para combater as alterações climáticas e para se concretizar as metas acordadas nas COP de Paris e de Glasgow.
Os solos do Ártico retêm quantidades massivas de carbono orgânico, especialmente nas turfeiras, mas a subida da temperatura está a secar essas áreas, que costumam estar congeladas ou alagadas, tornando os incêndios muitos mais prováveis. Dessa forma, zonas que têm atuado como sumidouros de carbono, poderão passar a ser emissores, agravando ainda mais o aquecimento do planeta e agudizando a crise climática.