Charles Godfray: “É errado excluir os transgénicos. Não vão alimentar África, mas podem ajudar”
A comida nunca foi tão barata como é hoje nos países ocidentais e, talvez por isso, haja tanto desperdício, afirmou Charles Godfray, professor da Universidade de Oxford e director do programa Oxford Martin para o Futuro da Alimentação, na primeira conferência do ciclo que a Fundação Gulbenkian e o Público dedicam ao Futuro da Alimentação.
Numa conferência presenciada por centenas de pessoas – incluindo um repórter do Green Savers – e que tinha como tema “O desafio de alimentar 10 mil milhões de pessoas de forma sustentável e equitativa”, Charles Godfray começou por alertar para o facto de os alimentos que comemos – e o modo como são produzidos – terem um impacto significativo na saúde pública, no ambiente e na economia.
“Nos países ricos a comida é muito barata, nunca nenhuma civilização gastou tão pouco em alimentos como a nossa”, afirmou, acrescentando ainda que aumentar moderadamente o preço dos alimentos seria um bom compromisso para diminuir a fome e o desperdício alimentar.
Paralelemente, acrescentou, a população mundial está a aumentar – em meados do século teremos cerca de 9 mil milhões de pessoas. “E vão ser mais ricos, principalmente nos países em desenvolvimento, China, Índia, e quanto mais rico se é, mais se deseja uma dieta variada, ou seja, alimentos que exigem mais recursos para serem produzidos”, explicou Godfray.
Tendo em conta este cenário, Godfray considera que vamos assistir a uma maior procura e ameaças no abastecimento, até porque a “forma como produzimos comida neste momento é insustentável”.
Segundo o especialista, “há ainda mil milhões de pessoas que vão para a cama com fome e desperdiçamos 30% dos alimentos produzidos. Os progressos que tínhamos conseguido na redução da fome estão a parar e grande parte por causa dos preços da comida”.
Godfray falou também dos impostos sobre os alimentos calóricos e bebidas açucaradas como um bom ponto de partida, mas alertou que é preciso um consenso público sobre os riscos semelhantes ao que legitimou os governos a restringir o consumo do tabaco.
Para Godfray, a solução passa pela “intensificação sustentável” da agricultura: “A resposta há 15 anos seria que temos de aumentar a área de cultivo. Hoje, sabemos que isso tem enormes custos ambientais. Temos de encontrar uma solução para produzir mais comida na mesma porção de terra e com menos efeitos ambientais”.
Apesar de ser biólogo de formação, o especialista não descarta o uso de transgénicos: “É errado excluí-los. Não vão alimentar África, mas podem ajudar. Temos de pegar no conhecimento dos artesãos e do movimento orgânico, mas também juntar alguma ciência”.