Consumidores podem ter mais benefícios com uma maior liberalização do medicamento
Em 2005, foi a aprovada a venda de medicamentos não sujeitos a receita médica (MNSRM) fora das farmácias, o que originou a criação de locais como as parafarmácias ou a venda destes fármacos em hipermercados.
“Considero que esta experiência foi bem-sucedida. Correu bem porque foi bem preparada do ponto de vista jurídico, do ponto de vista material e do ponto de vista informativo”, defendeu António Correia de Campos”, ministro da Saúde do Governo de José Sócrates que liderou a liberalização do mercado, esta quarta-feira no seminário “Liberdade de Escolha no Acesso ao Medicamento”, na Fundação Calouste Gulbenkian.
Dez anos volvidos, a Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde – Infarmed – está a trabalhar numa chamada “3ª lista” de MNSRM de venda exclusiva em farmácias. O objectivo é que os consumidores possam ter acesso a mais medicamentos sem a necessidade de recorrerem ao médico mas tendo a oportunidade de serem aconselhados por farmacêuticos.
Para as principais entidades do sector farmacêutico, o balanço positivo que fazem destes dez anos justifica que o mercado liberalizado do medicamento seja expandido através do alargamento da lista de fármacos disponíveis nestes locais de venda – que não as farmácias – e que já representam um volume de negócios anual de mais de €40 milhões.
“A Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) defende o alargamento da lista de MNSRM, pois traduz-se em benefícios para o consumidor – melhor preço e mais segurança – e para o Estado – uma maior poupança sem abalar os valores da saúde pública”, afirmou Ana Isabel Trigo Morais, directora-geral da APED, também durante o evento.
Também o Infarmed é favorável a este alargamento. “A automedicação pode traduzir-se em benefícios para os cidadãos, como um mais rápido acesso ao medicamento, dispensa da consulta médica, eliminação do tempo de espera e dos encargos”, referiu Eurico Castro Alves, presidente do Infarmed. Castro Alves defende ainda que o alargamento dos MRSRM é “indispensável para a viabilidade do Sistema Nacional de Saúde” pois permite “libertar recursos para serem aplicados em outras áreas” da saúde. Porém, o presidente da entidade reguladora indica que um alargamento dos MNSRM traduz-se numa maior responsabilidade dos operadores do mercado, que “têm a responsabilidade de controlar e aconselhar sobre os medicamentos”.
Ordem céptica a maior liberalização
Embora a posição da maior parte das associações e partes interessadas do mercado farmacêutico seja a favor de uma maior liberalização, a Ordem dos Farmacêuticos revela-se céptica a uma maior liberalização do mercado. “Em 2005, Portugal foi mais além do que era feito em outros países. Na altura, a Ordem dos Farmacêuticos opôs-se a uma lista tão grande de venda de MNSRM”, indicou Ema Paulino, representante da Ordem.
Actualmente, a Ordem “não se opõe à lista porque acha que pode retirar pressões a outras estruturas”, mas reitera que a automedicação sem o acompanhamento de profissionais devidamente qualificados pode representar riscos para a segurança do consumidor. “A ordem defende que exista uma avaliação prévia à venda do medicamento. Alguns podem ser vendidos fora das farmácias mas devem ser em menores dosagens e embalagens. Outros têm de ser obrigatoriamente feitos nas farmácias”.
Também Fernando Martins do Vale, da Ordem dos Médicos indica que a automedicação deve ser feita de forma mais consciente. “O abuso do paracetamol pode causar necrose hepática e provocar a morte”, adverte. “Não defendo que a venda deva ser exclusiva nas farmácias, mas não deve ser feita em qualquer lugar. É preciso que os medicamentos sejam vendidos com cuidados”, defende.
Já a Associação Nacional de Farmácias (ANF) tem uma posição divergente das duas entidades anteriores. “As farmácias não têm qualquer problema com a venda e a concorrência de outras superfícies”, afirmou Humberto Martins, em representação da instituição. A maior associação do sector nunca concordou com a venda dos MNSRM fora das farmácias, mas já que a liberalização foi feita a ANF sugere que a venda deste tipo de medicamentos seja alargada a mais locais.
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