Estudo contraria ideia de que lobos estão a perder o medo dos humanos (vídeo)



Os lobos são dos animais não-humanos mais controversos do mundo. Alvo de uma ampla gama de emoções, opiniões e perceções, do amor e admiração ao ódio e à repulsa, esses canídeos selvagens foram empurrados quase até à extinção, e chegaram mesmo a desaparecer de várias regiões na Europa e na América do Norte.

Fruto de ações de conservação e de proteção legal, que assinalam uma mudança na opinião pública (que não é universal, no entanto) a favor deles, os lobos, segundo relatos, estão a tornar-se mais ousados, a aproximar-se mais de locais de presença humana, como aldeias. Estão a perder o medo dos humanos, diz-se, gerando conflitos que resultam em perdas para ambos os lados.

Contudo, uma investigação publicada recentemente na revista ‘Current Biology’ mostra que, pelo menos numa floresta na Polónia, os lobos continuam a recear o “superpredador” humano.

Na floresta Tuchola, no norte desse país, um grupo de cientistas realizou uma experiência que, segundo eles, corrobora a ideia da “universalidade do medo dos lobos em relação aos humanos”, mesmo onde a espécie selvagem é protegida por lei.

Numa área de cerca de mil quilómetros quadrados em Tuchola, a equipa colocou câmaras-altifalantes, que captam imagens e emitem sons. Quando um animal passava a menos de 10 metros do dispositivo, eram ativados áudios de humanos a falarem calmamente em polaco, de cães a ladrar ou de vocalizações de pássaros.

De acordo com os resultados obtidos, era duas vezes mais provável que os lobos fugissem quando ouviam as gravações de vozes humanas do que quando escutavam os sons de aves. O mesmo se verificou para os veados e javalis, presas do lobo.

Os cientistas dizem que o medo dos humanos faz com que os lobos limitem grande parte das suas atividades aos períodos noturnos, quando os humanos estão menos ativos, precisamente para evitarem encontros com a nossa espécie. E apontam que isso não é só verdade para aquela floresta polaca, como para todo o continente europeu.

Como tal, declaram que a predominância notívaga dos lobos em todo o continente é prova de que, em toda essa área, os canídeos selvagens continuam a ter medo dos humanos.

“Os lobos não são uma exceção no medo que têm dos humanos, e têm boas razões para temer-nos”, diz, citada em comunicado, Liana Zanette, da Western University (Canadá) e coautora do artigo.

“Estudos globais mostram que os humanos matam presas a ritmos muito mais elevados do que outros predadores e que matam grande carnívoros, como os lobos, em média nove vezes mais do que o ritmo a que eles morrem naturalmente, fazendo dos humanos um ‘superpredador’”, salienta.

Zanette diz também que a proteção legal conferida aos lobos não faz com que eles percam o medo que têm dos humanos. “A proteção legal não altera o medo dos lobos em relação aos humanos, porque a proteção legal não significa que não se mate lobos, significa que não se os extermina. É uma distinção importante”, observa a investigadora.

Na União Europeia, onde o estatuto de proteção do lobo foi reduzido de “estritamente protegido” para “protegido” em meados deste ano, no seguimento de proposta avançada pelo executivo comunitário de Ursula von der Leyen, os lobos, apesar de protegidos, continuam a ser mortos lega e ilegalmente por humanos a um ritmo setes vezes maior do que a sua taxa de mortalidade natural, apontam os autores desta investigação.

Por isso, “a este ritmo, qualquer lobo verdadeiramente destemido que não evite os humanos será, a breve trecho, um lobo morto”, refere Zanette.

Com esta investigação, os autores declaram que fica cientificamente demonstrado que a proteção legal não cria lobos sem medo dos humanos, algo que dizem ser fundamental para reforçar os esforços de promoção de uma coexistência mais pacífica entre um dos últimos grandes predadores da fauna europeia e os humanos.

“Não há nenhum lobo mau que não tenha medo do ‘superpredador’ humano”, assegura a cientista, destacando que o que é importante é limitar o acesso dos lobos a fontes de alimento que levem esses animais a aproximar-se dos humanos, incluindo o reforço da proteção do gado e a eliminação de focos de resíduos que possam atrai-los para perto de vilas e aldeias.






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