‘Gentrificação verde’: Quando tornar as cidades mais ambientalmente sustentáveis pode agravar as desigualdades sociais



As estimativas das Nações Unidas apontam para que em 2050 cerca de 2,5 mil milhões de pessoas vivam em cidades por todo o mundo. A maior pressão demográfica e também ambiental que será colocada sobre os grandes centros urbanos exige adaptações que os tornem mais sustentáveis e resilientes aos efeitos das alterações climáticas.

Mas um grupo de cientistas de Espanha alerta que tornar as cidades mais ‘verdes’ poderá aprofundar ainda mais as desigualdades sociais já existentes e excluir os grupos mais vulneráveis.

Num artigo publicado na revista ‘Nature’, o coletivo científico explica que o que chamam de ‘gentrificação verde’ acontece quando os planos municipais para criar ou restaurar espaços verdes faz disparar os preços das habitações e força os residentes com menores posses financeiras a deslocarem-se para zonas mais periféricas, dando o lugar a novos residentes com maior poder de compra.

“Como resultado, os preços de arrendamento e de compra aumentam substancialmente de forma a que os grupos mais vulneráveis não possam sustentar tais preços e têm de se deslocar para áreas residenciais menos atrativas com uma menor qualidade de vida”, explicam os especialistas.

Com uma investigação que analisou os mercados imobiliários e as condições sociodemográficas de 28 cidades em 9 países da Europa e da América do Norte, foi possível constatar que “o planeamento de espaços verdes aumentou os processos de gentrificação em 17 das cidades analisadas”. Os resultados demonstram que, apesar de os benefícios inegáveis que têm para a saúde e o bem-estar humano, os espaços verdes de qualidade não estão realmente ao alcance de todos, nem de todas as carteiras.

A equipa de cientistas descobriu que a ‘gentrificação verde’ é mais forte nas cidades da América do Norte do que na Europa, devido à falta de políticas sociais que impeçam essa deslocação e que tentem controlar o desenvolvimento imobiliário.

Um outro estudo, mais recente, divulgado na ‘Environmental Research Letters’, detalha um pouco mais esse processo e aponta que os parques e os jardins urbanos são a principal causa da gentrificação nos Estados Unidos, ao passo que na Europa isso é principalmente impulsionado pela criação de áreas de lazer e corredores verdes.

Margarita Triguero-Mas, do Massachussets Institute of Technology (MIT) e a principal autora desse artigo, destaca que “conseguimos corroborar a nossa hipótese inicial de que cidades mais verdes tornam-se mais desiguais”, acrescentando que foi possível identificar várias infraestruturas verdes que causavam mais disrupção social do que benefícios para a saúde da população residente.

“A investigação também mostrou que a gentrificação verde contribui para a exclusão de sociocultural de residentes vulneráveis, especialmente imigrantes e pessoas racializadas”, detalha Isabelle Anguelovski, outra autora.

Atlanta, Copenhaga, Montreal, Nantes e Vancouver são as cidades em que a ‘gentrificação verde’ é mais evidente, embora o fenómeno tenha também sido notado em Barcelona, Boston, Denver, Edimburgo, São Francisco e Seattle.

Contudo, Isabelle Anguelovski diz que “estes resultados não significam que as infraestruturas verdes são negativas”, ressalvando que são muito benéficas para a saúde mental e física de quem as usa.

O problema está no planeamento, frisa, que deve ser mais inclusivo e evitar que estratégias de melhoria da qualidade de vida acabem por causar o desalojamento. E isso só pode ser feito, por exemplo, com políticas de combate à especulação imobiliária, de promoção da habitação social e de proteção de espaços verdes informais.





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