Gostos não se discutem: Dietas das orcas do Atlântico Norte podem ter impactos nas presas no Ártico



Estudar as preferências alimentares das orcas (Orcinus orca) é fundamental para perceber os seus impactos nas teias tróficas, especialmente quando as alterações climáticas, ao fazerem subir a temperatura das águas marinhas, estão a fazer com que esses predadores se desloquem cada vez mais para norte, em direção ao Ártico.

Embora já se conheçam relativamente bem os hábitos alimentares das populações de orcas do noroeste do Oceano Pacífico, caracterizados por uma variedade de tipos de alimentos, sobre as preferências das orcas do Atlântico Norte ainda pouco se sabe.

Mas um grupo de cientistas de vários países debruçou-se sobre essas populações e, através da análise da composição dos ácidos gordos de cerca de 200 orcas e de 900 presas de diferentes espécies, acreditam ter conseguido criar uma imagem nítida do que esses mamíferos marinhos preferem comer.

“Num contexto de alterações climáticas, é cada vez mais urgente compreender e ser capaz de quantificar as dietas das orcas”, explica Anaïs Remili, da Universidade McGill, nos Estados Unidos da América, e uma das autoras de um artigo publicado recentemente na revista ‘Journal of Animal Ecology’.

Para a investigadora, saber como os hábitos alimentares das orcas do Atlântico estão a mudar devido aos efeitos do aquecimento do planeta é essencial para se poder avaliar os impactos da deslocação mais para norte desses animais sobre as populações de espécies-presa dessas regiões mais frias.

Mas mesmo entre as populações de orcas do Atlântico Norte, os diferentes grupos podem preferir umas presas em vez de outras. Por exemplo, os cientistas dizem que na região leste do Ártico canadiano, as orcas preferem alimentar-se de outros cetáceos, como narvais e belugas, ao passo que na costa atlântica do Canadá a preferência recai sobre as baleias-de-bossa e espécies de focenídeos. Contudo, pouco menos de metade dessas orcas opta por caçar preferencialmente focas.

Preferências alimentares das orcas na região do Atlântico Norte.
Crédito: Anaïs Remili (coautora do artigo)

Por outro lado, as orcas nas águas da Noruega, Ilhas Faroé e Islândia tendem a alimentar-se principalmente de peixes, como o arenque, e as que nadam perto da Gronelândia caçam especialmente leões-marinhos.

Os investigadores dizem que esta é a primeira vez que é feito um estudo com grande nível de detalhe acerca dos hábitos alimentares das orcas, podendo, inclusivamente, perceber quais as presas preferidas por alguns indivíduos.

“Quantificar as dietas das orcas e de outros predadores de topo é crucial num contexto de alterações ambientais”, salienta Melissa McKinney, da mesma universidade e outras das autoras do artigo, uma vez que, à medida que o ambiente se vai transformando, fortemente impulsionado pelas alterações climáticas antropogénicas, permite perceber a capacidade que esses animais têm, ou não têm, para se adaptarem à deslocação das suas espécies-presa.

A cientista afirma, no entanto, que ainda há muito trabalho por fazer, pois os resultados desta investigação mostraram claramente que mesmo dentro da mesma população as preferências alimentares são diferentes, pelo que os efeitos das alterações climáticas sobre as populações de presas terão consequências distintas para cada indivíduo, dependendo do que preferem comer.

“À medida que os oceanos aquecem, as dinâmicas de comunidade são afetadas, especialmente nas latitudes mais elevadas”, escrevem os investigadores, que destacam que “as alterações climáticas já levaram a aumentos da presença de predadores, como as orcas, no Ártico”, algo que, dizem, poderá afetar as suas dietas habituais.

Além disso, quanto mais novos predadores começarem a caçar nas águas marinhas árticas, maior pressão será feita sobre as populações de espécies-presa, e, numa altura em que a conservação da biodiversidade deverá estar no topo das agendas políticas, saber ao certo como o aumento de predadores afeta as populações de presas é essencial para se poder antever possíveis desequilíbrios ecológicos e tentar encontrar soluções.





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