Há mais municípios empenhados nas crianças mas “ainda falta muito”
O número de municípios empenhados em colocar os direitos das crianças no centro das suas políticas tem aumentado, mas “ainda falta muito”, destaca a Unicef Portugal, que há uma década gere o programa Cidades Amigas das Crianças.
“A perspetiva está a mudar” e, apesar de “exigente”, o programa tem atraído um número “progressivo” de adesões, aponta à Lusa a diretora executiva do escritório em Portugal da Unicef, agência das Nações Unidas para a defesa e promoção dos direitos das crianças.
Fazendo o balanço de uma década de Cidades Amigas das Crianças, Beatriz Imperatori destaca que observar o território pelo olhar das crianças é “uma corrida de fundo”, que exige “um compromisso de médio, longo prazo”, e não um “toma lá um selo” e já está.
“Não podemos continuar […] a gerir, seja ao nível nacional, seja ao nível local, a criança de uma forma fragmentada”, recomenda, salientando que, a este respeito, “os municípios têm conseguido aquilo que o Estado ainda não conseguiu”, nomeadamente implementando mecanismos de coordenação que passam, por exemplo, por formações regulares e acompanhamento de proximidade.
Estes mecanismos são uma das maiores exigências do programa Cidades Amigas das Crianças, que em Portugal conta atualmente com 32 municípios e que vai assinalar a sua primeira década com uma conferência em Ermesinde, no município de Valongo, na quarta-feira.
“Criar novos mecanismos para ir conhecer a dimensão das crianças é exigente”, reconhece a diretora da Unicef, acrescentando que é com a adesão à rede que “muitos municípios […] pela primeira vez olham para o seu território na perspetiva das crianças”.
Daí também que alguns municípios, “uma minoria”, tenham desistido do programa, sobretudo “por falta de meios”.
Já “reconhecidos” como amigos das crianças estão 19 municípios portugueses: Albergaria-a-Velha; Braga; Cascais; Castro Daire; Fornos de Algodres; Funchal; Guimarães; Lisboa; Madalena do Pico; Ovar; Penafiel; Porto; Póvoa de Lanhoso; Seia; Torres Novas; Valongo; Vila Franca de Xira; Vila Nova de Famalicão; Vila Verde.
A estes juntam-se 13 candidatos: Celorico da Beira; Espinho; Esposende; Fafe; Fundão; Maia; Marco de Canaveses; Mêda; Monção; Ourém; Praia da Vitória; Pombal; Vila Nova de Gaia.
“Os 30 municípios que neste momento estão connosco, independentemente de já serem reconhecidos na sua plenitude ou terem iniciado agora o seu processo, são, de facto, municípios que nos entusiasmam, porque nós vemos as mudanças acontecer”, afirma Imperatori, preferindo não destacar este ou aquele, mas uma boa prática: “a participação consequente” das crianças, modelo que prevê, “de uma forma periódica e formalizada, […] assembleias ou reuniões especificamente criadas para ouvir as crianças, com uma agenda programada, e depois existe um compromisso da própria gestão local em […] devolver às crianças aquilo que foi feito”.
Ou seja, envolver as crianças “passa a ser uma prática integrada, sistémica”, gerando “um compromisso intergeracional”, aponta.
“Nós vamos ter uma reunião com crianças, elas vão falar e as coisas acabam ali. Portanto, as crianças falam, os adultos ouvem e já está. Esta é a [prática] não consequente e não é esta que nós queremos”, defende.
Por outro lado, aconselha, é também importante adotar uma perspetiva “não paternalista”, pois “uma criança é uma pessoa que tem uma opinião própria e que, obviamente, deve ser gerida na sua esfera, mas isso traz ao território e ao município benefícios muito grandes”.
“Quando trabalhamos bem para as crianças ou com as crianças, não é só a criança que estamos a impactar, tem um efeito multiplicador do bem-estar que é muito grande, pode ser três vezes, quatro vezes, se pensarmos no número de adultos que diretamente se relaciona com a criança”, aponta.
Para a conferência agendada para quarta-feira, a Unicef Portugal convidou “muitos [municípios], dentro e fora da rede, curiosos e interessados”, esperando que mais adiram ao programa, porque “a relação que se cria entre municípios sobre o tema, sobre a política local para as crianças, os direitos das crianças na política local, é uma rede muito rica”.
O programa Cidades Amigas das Crianças “é uma construção” e assim os municípios vizinhos “vão olhar e vão dizer ‘isto é interessante’”, acrescenta.
“É um bocadinho uma onda que vamos gerando e progressivamente os municípios vão aderindo”, salienta.