Incêndios: Faixas de gestão de combustível “são apenas um paliativo”
O dirigente da Quercus, Domingos Patacho, alertou que as faixas de gestão de combustível são apenas “um paliativo” para evitar danos em pessoas e infraestruturas e considerou que, nos incêndios, os parques naturais são os parentes pobres da floresta.
“Na prática, podemos cortar 10 metros de mato junto de uma estrada, mas à volta pode estar um verdadeiro barril de pólvora. Por isso é que, depois, os incêndios tomam dimensões muito grandes e estas faixas de gestão de combustível são apenas um paliativo para evitar danos sobre as infraestruturas e sobre as pessoas”, defendeu.
Em janeiro, o ministro do Ambiente e Ação Climática, Duarte Cordeiro, afirmou que metade do território para onde está prevista a instalação e beneficiação da rede primária de faixas de gestão de combustível, no âmbito do combate aos fogos rurais, estará concluído em 2025, num investimento global de 120 milhões de euros para um total de 125.000 hectares.
As faixas de gestão de combustível servem para diminuir a superfície percorrida e a intensidade dos incêndios, permitindo o seu combate de forma mais eficaz.
Apesar de Domingos Patacho reconhecer que, nos últimos anos, se observaram algumas melhorias, o ambientalista considera, contudo, que “não são suficientes” perante a gravidade da situação de “abandono” da floresta em Portugal, onde “o sistema, aposta muito nas faixas de gestão de combustível” que, critica, tem “critérios desajustados”.
“Cortar árvores não impede propriamente a propagação dos incêndios, quando, depois, tudo o que são áreas de minifúndio não têm nenhum apoio do Estado ou uma gestão mínima ou sustentável”, lamentou, defendendo a importância da execução efetiva de políticas públicas por forma a conseguir que o território seja “menos inflamável”.
O especialista estranha ainda que “num país que tem tantas regras e leis”, os municípios sem Plano Municipal de Defesa da Floresta contra Incêndios (PMDFCI) em vigor não recebam “uma reprimenda”, ainda que considere que estes planos – que passam muito pela gestão das faixas de combustíveis – são “muito curtos” num contexto mais global de prevenção.
Engenheiro florestal de formação, Domingos Patacho diz ainda ver com muita “apreensão e preocupação” a forma como as áreas protegidas em Portugal são “desvalorizadas do ponto de vista dos incêndios”, sendo disso exemplo o fogo que deflagrou em agosto de 2022 no Parque Natural da Serra da Estrela, classificado como sexto maior ocorrido em Portugal, desde que há registos.
“Há uma prioridade de combater os incêndios quando estão perto de aldeias e isso percebe-se e depois há uma prioridade, agora com estas agências [de gestão do fogo], de tentar travar os incêndios em áreas de produção florestal, como o eucaliptal ou o pinhal, onde há rendimento para o proprietário florestal ou para a indústria”, afirmou.
Nos parques naturais, acrescentou, “não se investe tanto porque o interesse ali não é ter madeira para abastecimento industrial. O que nos parece é que são os parentes pobres das áreas florestais em Portugal”, rematou.
A Rede Nacional de Áreas Protegidas (RNAP) inclui atualmente 32 áreas de âmbito nacional, sete são monumentos naturais, nove reservas naturais, 13 parques naturais, duas paisagens protegidas e um parque nacional, o da Peneda-Gerês que em julho de 2022 também foi fustigado pelos incêndios, obrigando à evacuação de várias freguesias.
No caso do incêndio do Parque Natural da Serra da Estrela, que acompanhou de perto, Domingos Patacho apontada o dedo à gestão de meios, considerando “absolutamente escandaloso” a falta de meios aéreos em “algumas áreas do incêndio”.
“Se fosse uma área de produção florestal, área de eucalipto e pinho, teria meios aéreos alocados para combater o incêndio. Nota-se aqui um problema de alocação dos meios aparentemente vocacionados só para produção florestal, e não propriamente para as áreas florestais de conservação e dentro dos parques naturais e da Rede Natura 2000”, declarou.