Investigadores desenvolvem rins embrionários humanizados dentro de porcos durante 28 dias
Os investigadores dos Institutos de Biomedicina e Saúde de Guangzhou criaram com sucesso embriões quiméricos contendo uma combinação de células humanas e suínas. Quando transferidos para mães suínas substitutas, os rins humanizados em desenvolvimento apresentavam estrutura e formação de túbulos normais após 28 dias.
Esta é a primeira vez que os investigadores conseguem fazer crescer um órgão sólido humanizado dentro de outra espécie, embora estudos anteriores tenham utilizado métodos semelhantes para gerar tecidos humanos, como sangue ou músculo esquelético, em porcos. O trabalho foi publicado a 7 de setembro na revista Cell Stem Cell.
Os investigadores centraram-se nos rins porque são um dos primeiros órgãos a desenvolver-se e são também o órgão mais frequentemente transplantado na medicina humana.
“Os órgãos de rato foram produzidos em ratos, mas as tentativas anteriores de cultivar órgãos humanos em porcos não foram bem-sucedidas”, afirma o autor sénior Liangxue dos Institutos de Biomedicina e Saúde de Guangzhou, da Academia Chinesa de Ciências e da Universidade de Wuyi. “A nossa abordagem melhora a integração das células humanas nos tecidos recetores e permite-nos cultivar órgãos humanos em porcos”, acrescenta.
A integração de células estaminais humanas em embriões de suínos tem sido um desafio, porque estas células superam as humanas e ambas têm necessidades fisiológicas diferentes. “Temos estado a trabalhar em mecanismos para ultrapassar a eficiência extremamente baixa da quimera interespécies”, diz o autor sénior Guangjin Pan dos Institutos de Biomedicina e Saúde de Guangzhou. “Identificámos um par de fatores críticos que melhoram a formação de quimeras interespécies, facilitando a competição entre células”, acrescenta.
No total, os investigadores transferiram 1820 embriões para 13 mães de aluguer. Após 25 ou 28 dias, interromperam a gestação e extraíram os embriões para avaliar se as quimeras tinham conseguido produzir rins humanizados.
Os investigadores recolheram cinco embriões quiméricos para análise (dois aos 25 dias e três aos 28 dias após a implantação) e verificaram que tinham rins estruturalmente normais para a sua fase de desenvolvimento e eram compostos por 50-60% de células humanas. Aos 25-28 dias, os rins encontravam-se na fase de mesonefros (a segunda fase de desenvolvimento dos rins); tinham formado túbulos e botões de células que acabariam por se tornar ureteres, ligando o rim à bexiga.
A equipa também investigou se as células humanas estavam a contribuir para outros tecidos dos embriões, o que poderia ter implicações éticas, especialmente se fossem encontradas células humanas abundantes em tecidos neurais ou germinativos e os porcos fossem levados a termo. Demonstrou que as células humanas se encontravam maioritariamente localizadas nos rins, enquanto o resto do embrião era composto por células de porco.
“Descobrimos que se criarmos um nicho no embrião de porco, as células humanas vão naturalmente para esses espaços”, explica o autor sénior Zhen Dai dos Institutos de Biomedicina e Saúde de Guangzhou. “Vimos muito poucas células neurais humanas no cérebro e na medula espinal e nenhuma célula humana na crista genital, indicando que as células estaminais pluripotentes humanas não se diferenciaram em células germinativas”.
Os investigadores afirmam que esta situação pode ser evitada eliminando outros genes nas células estaminais pluripotentes humanas, o que pode ser testado em estudos futuros.
Equipa pretende que rins se desenvolvam durante mais tempo
Agora que otimizaram as condições para o crescimento de rins humanizados em quimeras humano-porco, a equipa pretende permitir que os rins se desenvolvam durante mais tempo. Estão também a trabalhar para gerar outros órgãos humanos em porcos, incluindo o coração e o pâncreas.
O objetivo a longo prazo é otimizar esta tecnologia para o transplante de órgãos humanos, mas os investigadores reconhecem que o trabalho será complexo e poderá demorar muitos anos. O crescimento de um órgão humanizado totalmente funcional num porco exigiria alguns passos adicionais porque os órgãos são compostos por vários tipos de células e tecidos.
Neste estudo, os investigadores criaram um nicho para apenas um subconjunto de células, o que significa que os rins tinham células vasculares derivadas de porcos, o que poderia causar rejeição de órgãos se fossem utilizados num cenário de transplante.
“Uma vez que os órgãos não são compostos por apenas uma linhagem celular, para termos um órgão em que tudo provém do ser humano, teríamos provavelmente de fazer a engenharia dos porcos de uma forma muito mais complexa, o que também traz alguns desafios adicionais”, afirma o autor sénior Miguel A. Esteban dos Institutos de Biomedicina e Saúde de Guangzhou.
Entretanto, esta tecnologia poderá ser utilizada para estudar o desenvolvimento de órgãos humanos e doenças do desenvolvimento.
“Antes de chegarmos a esse estado tardio de fabrico de órgãos que podem ser colocados na prateleira para a prática clínica, este método fornece uma janela para o estudo do desenvolvimento humano”, diz Esteban. “É possível rastrear as células humanas injetadas e manipulá-las para estudar doenças e a formação de linhagens celulares”, conclui.