João Galamba de Oliveira. “Quando fotografo tenho o objetivo de perpetuar o belo e denunciar as desigualdades”



Tinha 20 anos quando sentiu o impulso de começar a fotografar, um gosto incutido pelo pai e um dos irmãos. As primeiras imagens foram de retratos de amigos e de ruas de Lisboa. Depois, em 2012, foi de férias a Timor. Gostou tanto do País que voltou cinco meses mais tarde para trabalhar. Ali, e em outros territórios asiáticos, tirou fotografias inesquecíveis. Em entrevista ao Green Savers, João Galamba de Oliveira deixa também um alerta: “Num mundo globalizado, há muitas tradições que tendem a desaparecer”.

Como nasceu a paixão pela fotografia?
Sempre gostei de fotografia, gosto incutido pelo meu pai e um dos irmãos que fotografavam regularmente, no entanto só aos 20 anos senti impulso de começar eu também a fotografar. E lembro-me do que me fez sentir essa súbita motivação. Perto da casa onde eu morava naquela altura, havia um stand Jaguar/Aston Martin e ao lado uma loja da Bang & Olufsen que tinha produtos na montra que ascendiam a largas dezenas de milhares de euros. Por esses dias um sem-abrigo passava o tempo a olhar pelas montras para a materialização da desigualdade social, para o luxo absurdo de que alguns podiam dispor. Ao vê-lo pensei que a fotografia poderia ser um instrumento de denúncia destas situações, e decidi juntar dinheiro para comprar uns meses depois a minha primeira máquina.
Quando começou a fotografar?
As minhas primeiras fotografias, em 2010, foram essencialmente retratos aos meus amigos e fotografia de rua em Lisboa. Muitas delas estragadas – tremidas e/ou desfocadas – por resultarem de experiências em modo manual, quando eu nem sabia bem o que significava diafragma ou obturador.
A que se deve a paixão por Timor?
Fui de férias a Timor-Leste em dezembro de 2012 e gostei tanto que, cinco meses depois, estava de volta para lá trabalhar. Nunca me esquecerei da sensação que foi pisar solo timorense pela primeira vez, o calor húmido, o tempo a correr devagar. Tinha 23 anos na altura e senti que não tinha nada a perder em tentar viver num outro país, o que se revelou simultaneamente uma experiência muito enriquecedora, mas também me ensinou o que significa a palavra saudade. Vivi 5 anos e meio longe do meu país, da minha família, dos meus amigos de infância e de adolescência, e isso impediu-me de estar presente em momentos importantes da vida deles: faltei a casamentos e a aniversários, a jantares de fim de semana e a cafés, faltaram muitos telefonemas de rotina. Por outro lado, criei raízes num novo país, aprendi que a palavra conforto pode não significar um sofá grande e uma tv plasma com netflix, mas uma água de coco ao pôr do sol.
Em que outros países fotografou?
Enquanto vivi em Timor-Leste tive a oportunidade de visitar vários países do sudeste asiático, nomeadamente a Indonésia, Malásia, Singapura, Tailândia, Laos…
As fotografias sobre Natureza são as suas preferidas?
Não diria que as fotografias sobre natureza sejam as minhas preferidas, diria antes que o tipo de fotografia que mais gosto é o documental. Quando fotografo tenho o objetivo de perpetuar o belo e denunciar as desigualdades. Num mundo em constante mudança, a fotografia deve servir como registo de alerta para o caminho errado que em certas situações se pode estar a tomar, como também para documentar aquilo que em nós, humanos, nos torna tão diferentes, tão únicos, mas também aquilo que nos aproxima e que são valores universais. Num mundo globalizado, há muitas tradições que tendem a desaparecer. E nem sequer preciso de ir para Timor-Leste para me aperceber que as tradições ancestrais estão a ceder passagem à cultura global do século XXI. Basta viajar por Portugal para nos reparar que há muitas tradições que muito provavelmente a geração do meu filho já não vai assistir: a arte xávega, a transumância… E a fotografia deve servir para isso, para perpetuar em memórias presentes e futuras aquilo que somos e/ou fomos.
Onde vive actualmente?
Vivo em Lisboa.
Como combina a paixão pela fotografia com a profissão de jurista?
O estilo de fotografia – documental – que faço aproxima-se de alguma forma da área do direito (laboral) em que trabalho. Ambas são atividades de relacionamento humano, em que exige que fale com as pessoas, que entenda os seus problemas e saiba um pouco das suas vidas. Como a profissão de jurista me ocupa a maior parte do tempo que tenho durante a semana, a fotografia fica relegada para os feriados e fins-de-semana.
Foi um dos finalistas do concurso #ClimateChange 2020. O que esta nomeação representou para si?
Trata-se de um concurso promovido e organizado através de uma aplicação de concursos de fotografia, a qual promove regularmente vários concursos dos mais variados temas. Houve cerca de dez mil fotografias a concurso e as cinquenta melhores fotografias (finalistas) foram escolhidas pelo júri, pelo que ter sido escolhido enquanto finalista foi sem dúvida uma grande conquista. Fico particularmente entusiasmado por ter sido com uma fotografia de Timor-Leste, país e povo que me acolheram como um dos seus, esperando que ajude as pessoas que veem a fotografia a lembrarem-se (ou a descobrirem) que no outro lado do mundo existe um pequeno país que sofre – como todos – dos problemas de alteração climática e de poluição, o que pode estar a contribuir para acabar com a biodiversidade que existe nas águas de Timor e que são a maior do mundo, segundo um estudo da Conservation International, com 642 espécies diferentes de coral e 314 diferentes espécies de peixe.




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