Mineração em mar profundo: São cada vez mais os que dizem ‘não’, mas porta ainda não está totalmente fechada
Nas últimas duas semanas, o Conselho da Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA), o órgão das Nações Unidas responsável pela regulação das atividades no fundo do mar, esteve reunido em Kingston, na Jamaica, para continuar as negociações sobre as regras de exploração de minerais nessas regiões oceânicas remotas, além das jurisdições nacionais.
Apesar de muitos terem previsto que desse encontro sairia a ‘luz verde’ para dar início à era da mineração nas profundezas marinhas, os 36 Estados-membros do Conselho não conseguiram chegar a um acordo, numa altura em que mais e mais governos apelam a uma moratória a essa atividade, ecoando os alertas feitos por cientistas e ambientalistas de que não se conhece ainda suficientemente bem a vida no fundo do mar para que se possa prever e minimizar os impactos da mineração.
Face ao impasse, a finalização do regulamento da mineração em mar profundo foi adiada para julho de 2025, o que pode ser entendido como uma vitória para os seus opositores, mas a porta mantém-se entreaberta, uma vez que desde o início do mês de julho as empresas passaram a poder candidatar-se a licenças provisórias. Apesar de a exploração de minerais em águas internacionais ser ainda proibida ao abrigo do direito internacional marítimo, são permitidas operações de prospeção.
A República da Irlanda, o Canadá, o Brasil, a Finlândia e Portugal foram os países que mais recentemente que expressarem publicamente as suas preocupações sobre a mineração em mar profundo, com o governo português a defender uma pausa precaucionária até que as regras estejam adequadamente definidas.
“Temos que fazer uma pausa precaucionária e penso que somos acompanhados por múltiplos países no mundo e, portanto, o que exigimos é a clarificação do quadro regulamentar e sobretudo o desenvolvimento de maiores atividades na área da investigação científica, do conhecimento científico, prevendo todas as lacunas, preenchendo todas as lacunas que existem”, disse à agência Lusa o ministro da Economia e do Mar, António Costa e Silva, na semana passada.
As organizações ambientalistas portuguesas saudaram a posição do executivo, argumentando que a falta de regulamentação e o ainda escasso conhecimento científico sobre esses habitats marinhos não permitem ainda “a avaliação efetiva desta atividade”, nem garantem “que os eventuais impactos decorrentes dessa atividade sejam plenamente compreendidos e não causem efeitos nocivos no ambiente marinho”.
Até agora, França foi o único país a defender publicamente a proibição da mineração em mar profundo, mas o coro de vozes contra, ou pelo menos hesitantes, soma já 21 governos.
Agora, os olhos estão postos na reunião da Assembleia da ISA, o órgão máximo dessa instituição, em que os 168 Estados-membros debaterão, até dia 28, os crescentes apelos a uma pausa e em que poderá ser acordada a implementação de uma moratória efetiva, depois de no primeiro dia do encontro as delegações terem acordado incluir esse tópico na agenda de trabalhos.
This morning at the #ISA Assembly several countries supported the inclusion of the agenda item where–for the first time in ISA history–all 168 Member States can formally discuss a pause on #DeepSeaMining. 🇨🇱🇨🇷🇵🇼🇻🇺🇫🇷🇩🇪🇨🇭🇧🇷🇮🇪🇪🇸🇧🇪🇵🇹🇲🇨#DefendTheDeep #ISA28 pic.twitter.com/MQCjY3iaTd
— DSCC (@DeepSeaConserve) July 24, 2023
E a oposição vem também de dentro da própria Organização das Nações Unidas (ONU). No passado dia 10, o Comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Türk, escreveu na rede social Twitter que “a mineração em mar profundo ameaça a biodiversidade marinha” e a capacidade dos oceanos para absorverem dióxido de carbono, “arriscando danos irreversíveis aos nossos ecossistemas vitais e ao clima”.
Türk apelava a que os Estados-membros da ISA “implementem uma moratória”, argumentando que, no contexto da tripla crise planetária – alterações climáticas, perda de biodiversidade poluição – é tempo de “priorizar a ciência sobre o lucro”.