O social nos ESG: “O parente menos convidado para a festa” da sustentabilidade, diz Margarida Couto do GRACE



As empresas estão cada vez mais cientes de que a sua prosperidade depende da sua sustentabilidade. Pelo menos é essa a convicção de Margarida Couto, que acredita que essa é uma consciência cada vez mais “aguda” por parte do setor e que não há uma sem a outra.

A presidente da direção do GRACE, uma associação empresarial que congrega mais de duas centenas de organizações que reconhecem a incontornabilidade da responsabilidade social e da sustentabilidade, falava esta manhã, em Lisboa, num evento dedicado ao lugar da dimensão social dos ESG, promovido pelo Santander Portugal.

Margarida Couto, esta manhã no evento promovido pelo Santander Portugal, em Lisboa.
Foto: Filipe Pimentel Rações

Para Margarida Couto, o pilar social dos ESG, um conjunto de indicadores que ajudam as organizações a caminharem em direção à sustentabilidade, é, se não “o parente pobre” nessas estratégias, pelo menos “é o parente menos convidado para a festa”.

As empresas que não olharem com a devida atenção para os ESG, que não são a própria sustentabilidade, mas sim o ‘mapa’ que permitirá chegar até lá, “não são empresas que terão um lugar confortável no futuro”, avisou a empresária, uma vez que “ser competitivo e ser próspero é ser sustentável”.

As organizações terão de responder a vários desafios para poderem fazer face às crises planetárias – alterações climáticas, poluição e perda de biodiversidade – ou arriscar a irrelevância, a alienação de trabalhadores e de investidores e acionistas.

E os bons exemplos devem começar, desde logo, nas camadas de direção, criando um movimento de cima para baixo e que seja possível sustentar a longo-prazo por toda a organização. Sem uma boa governança – o ‘G’ em ESG – tudo o resto pode redundar no ‘greenwashing’, ou seja, no mascarar da verdadeira sustentabilidade das empresas.

Os cinco grandes desafios do ‘S’ que as empresas terão de enfrentar

Para os próximos anos, Margarida Couto, apesar de reconhecer que “existem muitos mais”, salientou cinco: a Diversidade, a Integração de Pessoas com Deficiência, o Futuro do Trabalho, os Direitos Humanos e o Impacto na Comunidade.

Sobre o primeiro, a líder do GRACE escolheu focar-se nas desigualdades entre homens e mulheres, não porque os outros tipos de diversidade sejam menos importantes, mas porque poderá ser o mais visível e um problema mais facilmente resolvido, haja consciência dele.

Apesar de as entradas no Ensino Superior serem dominadas pelas mulheres desde há várias décadas, e de terem, em média, níveis mais altos de formação académica, continuam a estar sub-representadas nos órgãos de direção das empresas.

Margarida Couto evidenciou a existência de “vieses inconscientes” por parte das administrações, de maioria masculina, e que “é um dever fiduciário haver mais mulheres” em cargos executivos.

A crescente digitalização e a transição energética também exigirão mudanças. “A quantidade de empregos que vão desaparecer será brutal”, alertou, indicando a necessidade da aposta, por parte das empresas, no desenvolvimento das competências dos seus trabalhadores, por exemplo, através de programas de requalificação ou de aquisição de novos conhecimentos e capacidades.

Estimativas do Fórum Económico Mundial referem que até 2025 cerca de 55% de todos os trabalhadores a nível global precisarão de adquirir novas competências para se poderem adaptar à realidade em transformação.

“É preciso olhar para a nossa força de trabalho e prepará-la para a empregabilidade”, mesmo que não seja dentro da organização que promove essa formação, afirmou.

Os Direitos Humanos são outra questão que as empresas têm de ter bem presente. Não basta garantir que dentro de portas não há violações dos direitos fundamentais, mas é preciso alargar essas estratégias a toda a cadeia de fornecimento, “para que possam dormir de consciência tranquila”, disse Margarida Couto.

No entanto, lamentou que, atualmente, “as empresas não estão a olhar com a atenção que deviam” para as questões das violações dos Direitos Humanos em toda a sua cadeia.

Por outro lado, considera ser um dever ético das organizações a integração de pessoas com deficiência nas suas estruturas, não por caridade, mas porque é o mais correto a fazer. Sobretudo numa altura em que se teme a falta de talento qualificado para as novas profissões e para os chamados ‘empregos verdes’, rejeitar uma importante fatia da população ativa com base em preconceitos ou porque ‘dá trabalho’ seria contrário aos objetivos do desenvolvimento das próprias organizações, além de contrair os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, em especial o número 11, que pretende “tornar as cidades e comunidades inclusivas, seguras, resilientes e sustentáveis”.

Por fim, o último desafio destacado por Margarida Couto prende-se com o impacto das empresas na comunidade.

“As empresas não são ilhas. Existem em sociedades”, afirmou, acrescentando que essas organizações devem ser agentes ativos e participativos da vida das comunidades em que atuam, procurando retribuir e contribuir para o seu bom desenvolvimento.

E traçou uma linha entre os problemas sociais e os efeitos das alterações climáticas, explicando que responder às crises planetárias é também responder aos desafios sociais, uma vez que são as comunidades que estão mais vulneráveis à partida que mais sofrem os priores efeitos.

Mudar a forma como se faz negócio para garantir que é possível continuar a fazê-lo

Segundo um estudo feito em 2017 pela organização sem fins lucrativos CDP, apenas 100 empesas eram responsáveis por cerca de 70% de todas as emissões globais de gases com efeito de estufa desde 1988. Uma outra investigação, publicada na ‘Nature Climate Change’ em 2020 pela University College London e pela Tianjin University, revelou que as emissões das cadeias de fornecimento globais das empresas multinacionais emitem cerca de um quinto de todas as emissões de dióxido de carbono a nível mundial.

Hoje já serão poucos os que rejeitam o papel das alterações climáticas como fator de instabilidade social e económica, sobretudo em países mais pobres, que são também os mais expostos a esses impactos. E sem sociedades estáveis, dificilmente as empresas conseguem singrar.

Por isso, todas as vertentes nos ESG devem ser mobilizadas em conjunto, de forma articulada e com visão de longo-prazo, sabendo sempre que as ‘dores de crescimento’ são inevitáveis, mas que o resultado será o melhor para todos, empresas e sociedades.

Citando a célebre antropóloga norte-americana Margaret Mead, Pedro Castro e Almeida, Presidente Executivo do Santander Portugal, deixou uma mensagem a todas as empresas e organizações que querem fazer mais e melhor e ser cada vez mais sustentáveis: “Nunca duvidem que um pequeno grupo de indivíduos totalmente comprometidos pode mudar o mundo”.





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