Plantações para compensar emissões de carbono “não são a solução”, avisam cientistas. O foco deve ser a conservação e o restauro
Programas de plantação de árvores nas regiões tropicais para mitigar as emissões de dióxido de carbono podem estar a causar mais danos do que benefícios, afetando a biodiversidade local e intensificando a degradação de habitats. Essas iniciativas são cada vez mais procuradas por empresas e governos para compensarem as emissões que geram e, assim, combater o aquecimento do planeta, mas os cientistas dizem que os benefícios das plantações ou reflorestações dependem das espécies plantadas, bem como da extensão das áreas utilizadas.
De acordo com ecólogos da Universidade de Oxford, que assinam um artigo publicado esta semana na revista ‘Trends in Ecology & Evolution’, “apesar da vastidão de funções e serviços de ecossistema fornecidos pelos ecossistemas tropicais, a sociedade reduziu o valor desses ecossistemas a apenas uma métrica: carbono”.
Essas regiões são bastante atrativas para programas de plantação, uma vez que as condições climáticas e físicas promovem o rápido crescimento das árvores e, consequentemente, uma rápida absorção de carbono. Contudo, os investigadores dizem que, ainda que algumas iniciativas tenham como objetivo a reflorestação de áreas degradadas, em muitos casos assiste-se à plantação de árvores em regiões que antes não as tinham, como pradarias, alterando, com efeitos potencialmente nefastos, as dinâmicas ecológicas locais.
Os autores escrevem que os programas de plantação para sequestro de carbono tendem a focar-se apenas numa ou noutra espécie, promovendo manchas vegetais homogéneas e desvirtuando a biodiversidade que caracteriza os ecossistemas tropicais. Apontando que existem “incentivos financeiros consideráveis” para as empresas privadas compensarem as suas emissões de carbono através de investimentos em plantações de árvores, o dinheiro pode estar a ser mal-empregado.
“A explosão das plantações para compensar emissões está a ser motivada pelo dinheiro, não pela ecologia”, alertam os cientistas, defendendo que o foco deve ser a priorização da proteção de ecossistemas originais, ao invés “do foco económico em projetos de captura de carbono”.
E explicam que, embora essas plantações de espécie única, com intuitos comerciais (para produção de pasta de papel e madeira, por exemplo), possam ser “economicamente valiosas”, o nível de biodiversidade que conseguem suportar é muito menor, quando comparadas com florestas compostas por vários tipos de árvores.
Além disso, os investigadores dizem que, mesmo em termos do carbono sequestrado, as plantações monoespecíficas “não são a solução” mais adequada.
“A atual tendência de plantação de árvores com foco no carbono está a levar-nos por um caminho que resultará na homogeneização biótica e funcional de larga-escala, com ganhos de carbono reduzidos. Uma área equivalente ao total dos Estados Unidos, do Reino Unido, da China e da Rússia teria de ser reflorestada para sequestrar um ano de emissões”, afirma Jesús Aguirre-Gutiérrez, primeiro autor do artigo.
A equipa recorda que os ecossistemas tropicais, com savanas e pradarias, já são sumidouros de carbono, armazenando grandes quantidades no solo, ao passo que as plantações de compensação tendem a armazenar a maior parte do carbono acima do solo, sendo, por isso, mais suscetíveis, por exemplo, às secas e aos incêndios.
“Assume-se muitas vezes que a plantação de árvores para capturar carbono também beneficia a biodiversidade e aumenta os benefícios socioeconómicos”, mas os investigadores consideram que “isso não é o que normalmente acontece”.
Como tal, argumentam que não se deve “promover a degradação dos ecossistemas através da plantação de árvores com a visão limitada da captura de carbono”, e que o foco deve, sim, estar na “conservação e restauro dos ecossistemas”, bem como na redução das emissões geradas pelos combustíveis fósseis.
“Só será possível conservar os ecossistemas e o seu funcionamento priorizando a biodiversidade além de uma única métrica com valor económico tal como o é o potencial de sequestro de carbono”, escrevem os cientistas.