Poluição: Pesticidas provenientes da agricultura ameaçam saúde do Rio Ave
Há cerca de 30 anos, o Rio Ave figurava na lista dos rios mais poluídos de Portugal e até mesmo da Europa, devido às descargas da indústria têxtil que marcava forte presença na região. No entanto, hoje a ameaça da poluição mantém-se, desta feita devido à atividade agrícola que ocorre na bacia hidrográfica do Ave.
Em abril passado, uma mancha de poluição foi detetada no Rio Ave, em Vila do Conde. Várias notícias indicavam que foi a Polícia Marítima que deu conta do incidente e que a Câmara Municipal de Vila do Conde ativara um plano de contingência que, em poucas horas, resultou na resolução da situação.
Apesar de terem sido levantadas suspeitas de que terá tido origem industrial, na altura não se sabia ainda ao certo o que teria provocado a mancha poluente. Contudo, uma investigação realizada por investigadores da Universidade do Porto sugere uma causa: contaminação por pesticidas usados pela indústria agrícola.
Maria João Rocha, primeiro autora do artigo publicado este ano na revista ‘Marine Pollution Bulletin’, explica, em comunicado, que “apesar das concentrações atuais de pesticidas serem inferiores às registadas noutro estudo publicado em 2002, continuam a utilizar-se quantidades demasiado altas destes compostos na bacia do Ave”.
Os cientistas perceberam que “38% dos compostos analisados mantêm-se acima das concentrações recomendadas pela legislação portuguesa” e identificaram ainda “pesticidas não autorizados e/ou banidos na União Europeia devido à sua toxicidade e/ou carcinogenicidade”.
A investigação decorreu ao longo de um ano e resultou na recolha e análise de 56 tipos diferentes de pesticidas em amostras de água e de partículas em suspensão em oito “zonas-chave” do Rio Ave, como perto dos seus efluentes, no estuário e na zona costeira.
Os especialistas admitem preocupação face aos resultados obtidos, não apenas porque podem ameaçar o ecossistema que caracteriza esse rio, mas também devido às implicações que esses pesticidas podem ter para a saúde humana.
“Isto poderá suceder, quer por via do consumo de alimentos contaminados (vegetais e animais), quer pelo contacto físico com estas águas ou com os próprios pesticidas no momento da sua aplicação por agricultores”, salienta Maria João Rocha.
Para a cientista e docente, é preciso implementar medidas que permitam combater este tipo de situações, como a “identificação das fontes de contaminação” e o “fornecimento de informação detalhada sobre os componentes dos pesticidas a todos os seus utilizadores”, sejam eles frequentem, como agricultores, ou esporádicos, que os usam em jardins ou espaços públicos.
“Estas medidas, em conjunto com um aumento da vigilância local, são pontos de partida essenciais para se contribuir para despoluir esta região e melhorar a qualidade do ecossistema e da vida de animais e humanos, numa perspetiva ‘One Health’”, observa a investigadora, acrescentando que “a continuidade da monitorização de pesticidas no Ave poderá aferir do sucesso das políticas”.