Primatas que fazem beatbox: Orangotangos são capazes de produzir dois sons em simultâneo
Até agora, considerava-se que apenas as aves canoras e os humanos proficientes em beatbox eram capazes de produzir dois sons distintos em simultâneo. Mas uma nova investigação vem revelar que existe outro grupo de animais capazes de tal feito acústico: os orangotangos.
Os investigadores Adriano Lameira e Madeleine Hardus passaram cerca de 3800 horas a observar duas populações de orangotangos selvagens nas florestas da Indonésia, em particular na província de Kalimantan Central e na ilha de Sumatra. Num artigo publicado esta terça-feira na ‘PNAS Nexus’, revelam que os indivíduos de ambos os grupos evidenciavam a mesma habilidade vocal.
Lameira, da Universidade de Warwick, no Reino Unido, explica que nós, humanos, usamos os lábios, a língua e a maxila para produzirmos sons sem precisarmos de usar a nossa voz, e podemos conjugá-los, simultaneamente, com sons vocais criados com a laringe através da expulsão de ar. Esta é uma técnica usada por quem pratica beatbox e que lhes permite fazer sons de vogais e de consoantes de uma só vez.
“Os orangotangos também são capazes de produzir os dois tipos de sons”, diz o cientista, “e ambos ao mesmo tempo”.
Os orangotangos machos foram observados a usar essa técnica em situações de combate, ao passo que as fêmeas tendem a recorrer a ela para, por exemplo, alertar o resto do grupo para a presença de predadores.
“O facto de duas populações distintas de orangotangos terem sido observados a fazer dois chamamentos em simultâneo é prova de que se trata de um fenómeno biológico”, sugere Lameiras.
Madeleine Hardus acredita que esta descoberta abrirá novas vias de investigação sobre a evolução da comunicação humana, e que a nossa capacidade para produzir dois sons ao mesmo tempo pode ter sido legada pelo antepassado que partilhamos com os orangotangos.
Por os humanos serem “anatomicamente capazes” de fazer beatbox, a investigadora afirma que levantam-se questões “sobre de onde essa capacidade veio” e até mesmo sobre a origem da linguagem humana. “Sabemos agora que a resposta poderá estar na evolução dos nossos antepassados”, aponta.
Estudos estimam que os humanos e os orangotangos tenham divergido há aproximadamente 13 milhões de anos e há quem defenda que os orangotangos, e não os chimpanzés, são o parente evolutivo mais próximo do Homo sapiens.
Para Lameira, “agora que sabemos que esta habilidade vocal é parte do repertório dos grandes símios, não podemos ignorar as ligações evolucionárias”, e avança que é possível que, quando surgiu, linguagem humana primordial soasse a algo parecido com beatbox, “antes de a evolução organizar a linguagem na estrutura consoante-vogal que hoje conhecemos”.