Quase 88.000 europeus já pediram uma Lei de Restauro da Natureza
Quase 88.000 cidadãos da União Europeia (UE) já enviaram um pedido aos responsáveis políticos dos seus países para que apoiem uma Lei de Restauro da Natureza, a ser debatida nas instâncias europeias mas em risco de ser rejeitada.
A Comissão Europeia (CE) apresentou em junho de 2022 uma proposta de legislação sobre restauro de ecossistemas danificados, uma medida que as organizações ambientalistas aplaudiram, porque, além de evitar o colapso de ecossistemas, a lei permitiria prevenir efeitos mais nefastos das alterações climáticas e diminuir o aquecimento global.
A proposta está a ser avaliada em diversas comissões do Parlamento Europeu mas a ação de “lóbis” europeus está a enfraquecer a proposta da CE, um dos motivos para o apelo de mais de 200 organizações não-governamentais europeias, que já conta com o apoio de mais de 87.500 pessoas (dados referentes às 16:00 de hoje).
Há uma semana a comissão de Agricultura do parlamento deu parecer negativo à proposta de lei que impunha objetivos de reparação por destruição causada à natureza.
A proposta da CE será avaliada na comissão de Ambiente no próximo dia 15 e a votação em plenário deve acontecer em julho, ou ser mesmo adiada para setembro, pelo que a campanha das organizações não-governamentais vai manter-se até essa altura, sendo o objetivo chegar a pelo menos 100.000 assinaturas.
Joaquim Teodósio, da organização ambientalista Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), alertou, em declarações à Lusa, que a “proposta forte” da CE, que vem complementar a Lei do Clima, dá resposta à crise climática e à crise da biodiversidade mas está a ser enfraquecida.
“Chegou-se mesmo ao limite de haver uma moção para rejeitar a lei, já nem é só alterar a lei. É um sinal de que há pressões fortes contra a iniciativa, que na verdade é essencial para a espécie humana, porque sem um comprometimento em relação às alterações climáticas e à perda de biodiversidade estamos condenados”, disse.
Além disso, acrescentou, rejeitar ou enfraquecer a proposta da CE “é virar as costas” a compromissos assumidos pela UE na última cimeira das Nações Unidas para a biodiversidade, realizada em dezembro do ano passado em Montreal, Canadá.
Se for aprovada conforme a proposta inicial da CE, a Lei de Restauro da Natureza terá um “claro enfoque” na recuperação, além de um compromisso claro dos países, que de forma legal serão obrigados a cumprir as medidas.
Depois, acrescenta Joaquim Teodósio, a proposta contém medidas de apoio para a transformação de alguns setores. E especialmente a Península Ibérica teria muito a ganhar, com o apoio comunitário para medidas necessárias de proteção da natureza.
“A lei dava-nos mais capacidade para começar a recuperar muito do que necessitamos. Fico triste de ver eurodeputados portugueses a votar contra a lei”, lamentou.
Na carta que as organizações não-governamentais propõem que se escreva aos ministros e eurodeputados pede-se aos responsáveis políticos que expressem o apoio a uma Lei Europeia do Restauro da Natureza forte e a adotá-la até ao final de 2023.
“Estamos assustados: a perda de biodiversidade e o colapso do clima estão a colocar em perigo a sobrevivência do nosso planeta, e da própria humanidade. À medida que a natureza continua a diminuir, secas, inundações e incêndios estão a tornar-se cada vez mais frequentes; já estão a ceifar vidas e a arriscar a segurança alimentar, destruindo ao mesmo tempo os meios de subsistência, o planeta e a economia”, diz o texto.
“Restaurar a natureza significa restaurar o nosso maior aliado no combate às crises climáticas e de biodiversidade, restaurar a nossa saúde e bem-estar geral, e restaurar a resiliência das nossas economias”, acrescenta.
O pacote legislativo da CE implica a obrigação de os Estados membros restaurarem 20% do património natural até 2030 e todos os ecossistemas degradados até 2050.
Outros dos objetivos propostos são a inversão do declínio das populações de polinizadores, reverter perda de espaços verdes urbanos, aumento da biodiversidade dos ecossistemas agrícolas, recuperação de habitats ou redução para metade do uso de pesticidas químicos.
A SPEA alerta que os “lóbis” da agricultura e das pescas têm divulgado notícias falsas, como a de que a lei poderá causar insegurança alimentar.
A proposta da CE visa reverter o declínio da natureza em toda a Europa, que tem mais de 80% dos seus habitats degradados.
O relatório do estado da natureza na Europa em 2020 indicava que Portugal tinha 72% dos seus habitats degradados.