Seca: Criadores da churra da Terra Quente transmontana apreensivos com futuro da raça
Os produtores de ovinos da terra quente transmontana mostram-se apreensivos com a perda anual de efetivo desta raça autóctone devido ao aumento do preço dos fatores de produção e às consequências das alterações climáticas.
“A seca tem um grande impacto na alimentação e pastoreio dos animais, porque poucos são os alimentados à manjedoura. Esta é uma raça autóctone que se alimenta essencialmente das pastagens. Este ano, este tipo de alimento escasseia, o que leva os pastores a reduzirem o efetivo”, disse o presidente do conselho de administração da Associação Nacional de Criadores de Ovino de Raça Churra da Terra Quente (ANCOTEQ), Bruno Cordeiro, com sede em Torre de Moncorvo.
“Tenho 250 cabeças de gado ovino de raça churra e desde que me lembro este foi o pior ano para arranjar palha para dar aos animais. Já na vizinha Espanha também há pouca e a preços muito elevados. Não sei como vou conseguir alimentar o meu gado no inverno”, rematou.
A churra da terra quente é conhecida pela qualidade da sua carne e derivados do leite, produtos que ostentam chancela de Denominação de Origem protegida (DOP) e que está circunscrita aos concelhos de Torre de Moncorvo, Mirandela, Macedo de Cavaleiros, Mogadouro, Carrazeda de Ansiães, Vila Flor e Freixo de Espada à Cinta, no distrito de Bragança, e Vila Nova de Foz Côa, no distrito da Guarda.
“Com a falta de pastagens, tenho de recorrer à compra de rações e forragens, o que diminuiu o rendimento das explorações com o consequente aumento dos custos com alimentação para o gado. Os animais têm de comer 365 dias por ano e os produtores não conseguem ter um nível de vida aceitável”, vincou o dirigente.
Bruno Cordeiro acrescentou ainda que os produtores mais idosos ainda vão aguentando porque gostam dos animais. Por seu lado, as gerações mais novas procuram outros modos de vida, dada a falta de rendimento provocada por diversos fatores, com as alterações climáticas à cabeça das preocupações.
O dirigente aponta para uma redução no efetivo da churra de terra quente que, atualmente, conta com cerca de 11.800 fêmeas e onde a perda de efetivo ronda os 15%.
Já José Martins, um produtor pecuário do concelho de Macedo de Cavaleiros não tem dúvida que cada ano agrícola que passa é pior que o anterior.
“Não nos podemos mostrar indiferentes às alterações climáticas e à seca associada, bem como a perda de rendimento, uma situação que nos afeta a todos os que temos lavoura”, descreveu
O pastor falou ainda em falta de organismos que regulem o setor pecuário para haver o escoamento dos animais e os seus derivados como a carne, leite e lã.
“Se este ano está a ser difícil, o próximo será muito, mas muito difícil”, anteviu José Martins.
João Barros, produtor de ovinos de raça churra da Terra Quente, é da opinião que o aumento dos fatores de produção, devido à guerra na Ucrânia, associados à seca, não acompanha os preços de venda dos borregos ou do leite para fazer queijo DOP.
“A seca e a inflação são os dois fatores de desgraça dos produtores pecuários, o que leva a perda de efetivo”, atirou o produtor com origem em Torre de Moncorvo.
Segundo João Barros, o preço do quilo de palha paga-se a 80 cêntimos e um fardo de aveia com grão comprava-se a 30 a 35 euros, hoje custa 200 euros. “Uma situação que se torna insuportável”, disse.
Segundo descreve a ANCOTEQ, a raça ovina churra da Terra Quente tem um papel importante na sustentabilidade dos territórios e das gentes da região onde se encontra inserida, sendo a pastorícia uma atividade vital para a fixação das populações em regiões mais desfavorecidas.
“Esta raça contribui ainda para o aumento da rentabilidade das explorações agrícolas, preservando o ambiente – uma vez que aproveitam os escassos recursos disponíveis, que de outra forma não seriam aproveitados, e acaba mesmo por valorizar as culturas, essencialmente pela incorporação de matéria orgânica”, indica esta associação de produtores.