‘Síndrome dos traços urbanos’: Como os animais selvagens se adaptam à vida nas cidades



Apesar de poderem ser consideradas epítomes da presença humana, as cidades não são, por isso, desprovidas de vida selvagem. Inúmeras espécies de aves, de invertebrados, de mamíferos e outras tantas formas de vida não-humana partilham essas ‘selvas de betão’ connosco, quer demos por elas ou não.

Mas a vida nas cidades não é igual à de áreas campestres, pelo que os animais que se mudam para os centros urbanos têm de se adaptar às novas condições para poderem sobreviver e subsistir. A esse conjunto de características que permitem às espécies selvagens prosperar nas cidades, um grupo de cientistas apelidou de ‘síndrome dos traços urbanos’.

A investigação, divulgada esta semana na ‘Nature Communications’, cobriu 379 cidade em seis continentes e contou com a participação de dezenas de cientistas de todo o mundo.

Um deles é Frank La Sorte, investigador do Laboratório de Ornitologia da Universidade de Cornell, nos Estados Unidos da América. Em comunicado, explica que “as mudanças mais pronunciadas entre os organismos que vivem nas cidades são na reprodução e na procura de alimento”.

O cientista aponta que, no caso das aves, os ambientes urbanos tendem a favorecer espécies mais pequenas, que são capazes de sustentar dietas variadas e que produzem menos ovos em cada postura do que os membros rurais da mesma espécie.

A postura de menos ovos pelas aves urbanas, diz La Sorte, “tem sido associada a maiores níveis de sobrevivência” e a um maior crescimento das crias que nascem.

Quanto às aves, hábitos alimentares mais generalistas parecem ser a adaptação mais eficaz para a vida nas cidades, uma vez que, como afirma o investigador, “os especialistas desaparecem gradualmente”, por estarem dependentes de fontes de alimento particulares e não serem tão flexíveis.

Contudo, à medida que os especialistas vão desaparecendo, também é reduzida a biodiversidade urbana, podendo colocar em risco o bom funcionamento dos ecossistemas nessas áreas marcadas por uma forte presença humana.

“Os ecossistemas nas cidades são fortemente transformados e geridos, e vegetação nativa intacta tende a ser escassa”, sublinha La Sorte, que acrescenta que “quando mais componentes de um ecossistema forem preservados e suportados, mais saudável será todo o ecossistema urbano”.

Mas essa ‘síndrome dos traços urbanos’ não se manifesta da mesma forma em todas as espécies que vivem nas nossas cidades. Os besouros, por exemplo, tendem a ser mais velozes em terra do que os seus conspecíficos de cenários campestres, ao passo que os répteis e as aves são mais lentos.

Os autores deste trabalho lamentam que o registo e a compilação de informação sobre as espécies selvagens que vivem nas nossas cidades, bem como sobre os ecossistemas que constituem, sejam escassos e não sejam recolhidos de forma sistemática. Só dessa forma, dizem, seria possível comparar o desenvolvimento da vida selvagem urbana de diferentes cidades e perceber os impactos da urbanização nessas comunidades de animais.

Mais e maiores parques e espaços verdes podem ser uma forma de compensar, ainda que apenas parcialmente, a perda de habitats provocada pela expansão das cidades, transformando-as em verdadeiros ecossistemas urbanos em que são acauteladas as necessidade de diversas espécies, e não apenas da nossa.





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