Subida da temperatura do mar dizima populações de invertebrados ao largo da Austrália



Estima-se que nos últimos 100 anos os oceanos tenham aquecido, em média, 1,5 graus Celsius, um aquecimento fortemente intensificado pelo efeito de estufa provocado pelas emissões de gases gerados pelas atividades humanas, pela desflorestação e pela degradação ambiental.

A par desse fenómeno a longo-prazo, desde a década de 2010 que as ondas de calor marinhas, breves períodos de subida significativa da temperatura numa área limitada do oceano, aumentaram 50%, podendo durar poucas semanas ou estender-se por mais de um ano. De acordo com a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), já foram registadas ondas de calor marinhas desde as águas mais superficiais às em maior profundidade, em todas as latitudes e que abrangendo todos os tipos de ecossistemas marinhos.

E esses fenómenos só tenderão a priorar, uma vez que os especialistas do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) calculam que até ao 2100 as ondas de calor marinhas serão 50 vezes mais frequentes do que eram na era pré-industrial e serão 10 vezes mais intensas.

À semelhança do que acontece em terra, estes períodos de subida significativa e persistente da temperatura no mar podem ter impactos bastante negativos na vida marinha, podendo provocar a morte de grandes números de animais e plantas e a destruição de habitats. O branqueamento dos corais é um reflexo dessas ondas de calor, uma vez que esses pequenos invertebrados não têm capacidade para escapar.

Um grupo de investigadores da Austrália, dos Estados Unidos e da Suécia fazem agora soar mais um alarme, alertando que os invertebrados ao largo da costa ocidental australiana estão a sofrer duras perdas populacionais devido ao aumento da temperatura do mar.

Num artigo publicado esta semana na revista ‘Frontiers in Marine Science’, revelam que a biodiversidade na Ilha de Rottnest, a cerca de 18 quilómetros da costa, sofreu um “declínio catastrófico” devido às ondas de calor marinhas.

Há 40 anos que esta equipa de cientistas estuda a diversidade de moluscos e de equinodermes (como ouriços-do-mar e estrelas-do-mar) nos recifes rochosos não só de Rottnest, mas também noutros locais ao longo da costa ocidental australiana. Apesar de a ilha contar com zonas de santuário, em que a vida marinha está protegida por lei face aos impactos das atividades humanas, perceberam que entre 2007 e 2021 a biodiversidade nessa região sofreu grandes perdas, algo que acreditam terem sido causadas pelas águas quentes da Corrente Leeuwin, que corre ao longo da costa ocidental australiana.

Por outro lado, a vida marinha nas zonas costeiras, que não está exposta a essa corrente, manteve um nível de diversidade superior às áreas protegidas de Rottnest, onde as populações de moluscos, sobretudo no seu limite ocidental, terão caído 90% ou até mais.

Fred Wells, da Curtin University e principal autor do artigo, explica que nos últimos anos a costa ocidental da Austrália tem sido afetada por “temperaturas oceânicas anormalmente altas”, fruto de ondas de calor marinhas. Com o aquecimento da água do mar, os investigadores esperavam ver o aumento de espécies tropicais, mais bem adaptadas às temperaturas elevadas.

Contudo, viram que, por exemplo, o extremo mais ocidental da Ilha Rottnest, chamado de West End, tanto as espécies tropicais, como as de zonas temperadas e as que são endémicas da Austrália ocidental tinham sofrido perdas populacionais consideráveis.

Os investigadores assinalam que estas observações deixam claro que, apesar de todas as proteções legais concedidas aos recifes de Rottnest, “essas áreas não são imunes aos efeitos das alterações climáticas globais”. E esperam que, no futuro, as larvas de moluscos e equinodermes de outras regiões da ilha e da Austrália possam permitir recuperar as populações dizimadas pelo calor marinho.

O futuro, segundo as previsões científicas, reserva ondas de calor oceânicas mais frequentes, mais duradouras e mais intensas, antevendo-se eventos de mortalidade massiva de várias espécies, principalmente das que não têm capacidade para migrar para locais mais amenos. Por isso, e para que seja possível cumprir os objetivos que saíram da cimeira global da biodiversidade (COP15), em dezembro passado, de proteger 30% das áreas marinhas até 2030, será preciso prestar maior atenção às previsões de ondas de calor na altura de criar áreas protegidas nos mares.





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