Alenquer dá a conhecer as árvores autóctones e mais emblemáticas do concelho para impulsionar a sua conservação



Quantos de nós realmente atentamos nas árvores pelas quais passamos, por vezes todos os dias, quando nos deslocamos para o trabalho ou quando desfrutamos de um passeio durante o fim de semana?

Para muitos, esses gigantes do reino das plantas podem passar despercebidos, meros apontamentos na paisagem que temos diante dos nossos olhos, e, por isso, acabamos por não reconhecer que são, na realidade, seres vivos, muitos deles com dezenas ou centenas de anos de vida, e que desempenham papéis cruciais, como a regulação do clima, a manutenção e promoção da biodiversidade, e a saúde dos solos de que nós, tanto como outros animais, plantas e fungos, dependemos de formas que nem imaginamos.

Numa altura em que os alarmes climáticos soam quase ininterruptamente, chamando-nos à defesa do planeta e dos ecossistemas que o compõem, a proteção das árvores deve assumir um lugar dianteiro. Mas para isso é preciso que conheçamos a natureza que nos rodeia e saibamos, em particular, quais as árvores que, fruto de processos evolutivos bem demorados, estão mais bem adaptadas às condições dos vários territórios e que melhor podem adaptar-se ao aquecimento global e a todas as suas consequências nefastas, como secas e incêndios cada vez mais frequentes, intensos e duradouros.

Foi a constatação da urgência do momento que vivemos que levou a Câmara Municipal de Alenquer a criar uma exposição fotográfica itinerante que pretende dar a conhecer a toda a população as árvores autóctones, ou nativas, mais emblemáticas do concelho. O objetivo é não só “contribuir para a preservação de espécies autóctones”, mas também “sensibilizar para a necessidade de alteração de comportamentos individuais e coletivos, tanto em áreas públicas como privadas”, adiantou a Câmara Municipal à ‘Green Savers’.

A exposição, que arrancou no passado dia 23 de novembro por ocasião do Dia da Floresta Autóctone, faz parte de um projeto mais amplo do executivo municipal que pretende “fomentar a preservação destas espécies, não só face à sua reduzida representatividade no território, como pela importância ecológica deste património natural único”.

A Câmara Municipal alerta que “as espécies arbóreas autóctones das áreas urbanas e semiurbanas, tanto públicas como privadas, estão severamente ameaçadas de extinção” e que este projeto “contribui não só para a preservação destas espécies e da Biodiversidade a elas associada, como também para fomentar a importância dos seus serviços na resiliência dos territórios às alterações climáticas, na qualidade de vida das pessoas e no bem-estar social”.

Depois de ter tido a sua na Biblioteca Municipal de Alenquer, a exposição, aberta ao público, está agora no polo do Carregado, e apresenta 22 fotografias, duas por cada árvore e por cada freguesia, cuja população elegeu a árvore que melhor representa a sua localidade.

As equipas de Ambiente do município optaram por mostrar duas fotografias de cada uma das árvores escolhidas para demonstrar o seu aspeto durante os períodos da primavera/verão e do outono/inverno. Dessa forma, mostra-se à população que esses espécimes da flora, tal como muitos animais, atravessam ‘transformações’ ao longo do ano, e que o facto de estarem sem folhas não significa que estejam mortas, apenas que enfrentam condições em que ter folha, por exemplo, é mais dispendioso, em termos energéticos, do que mantê-las.

As fotografias foram captadas pelos fotógrafos da natureza Daniel Pinheiro e Luís Pinheiro, da Wildstep Productions, e mostram árvores em vários contextos: imersas num contexto urbano, a lançar sombra sobre uma exploração agrícola ou embrenhadas numa paisagem selvagem que lembra as densas florestas dos trópicos. Além de terem sido escolhias por serem autóctones, as árvores selecionadas para a exposição apresentam também copas frondosas e formas peculiares, sendo que algumas delas parecem crescer na horizontal, desafiando as leis da gravidade.

As biólogas Carmen Dionísio e Sara Soares, da equipa de Conservação da Natureza da Câmara de Alenquer, contaram-nos que as árvores autóctones com maior representatividade no concelho são o sobreiro, o carvalho e o freixo, que são também as que estão “completamente adaptadas” ao clima do país e “são as mais resilientes às alterações climáticas”.

As especialistas disseram que a maioria das árvores exibidas na exposição “está em propriedade privada”, o que exigiu um diálogo com proprietários e a sua sensibilização para a preservação desses espécimes devido à sua importância ecológica, como fontes de promoção de biodiversidade e da saúde dos solos, bem como pelos serviços de ecossistemas fornecidos, como a retenção de água e das terras, a polinização e a redução da temperatura de superfície.

A exposição é apenas uma das faces mais visíveis de um trabalho que arrancou na primavera de 2021, que procurou fazer um levantamento das espécies de árvores existentes no concelho, quer em áreas protegidas, quer fora delas, e transmitir esse conhecimento sobre o património natural de Alenquer à população.

Outra vertente deste projeto mais amplo foi a criação de uma ‘Rota das Árvores Emblemáticas e Autóctone’, que, nas palavras da Câmara de Alenquer, é um verdadeiro “museu ao ar livre”, que atravessa as 11 freguesias e que leva o público a conhecer presencialmente as árvores escolhias por cada uma dessas populações.

Mapa da Rota das Árvores Emblemáticas de Alenquer
Fonte: CM Alenquer

Cada uma das árvores tem um painel, um pequeno ‘bilhete de identidade’, onde são “transmitidos conhecimentos relativos à ecologia, distribuição, importância e necessidade de conservação da espécie, através de uma abordagem que visa a sensibilização ambiental com uma linguagem simples e acessível a qualquer público-alvo, bem como ilustrações científicas elaboradas pelo premiado Prof. Fernando Correia”, detalha a câmara no seu portal online.

Este projeto foi elaborado sobre a ideia de que só conhecendo a natureza que temos à nossa volta podemos perceber a importância de preservá-la, reconhecer os seus valores ecológicos, culturais e sociais, pois muitas destas árvores em exposição, seres antigos, terão certamente acompanhado, ainda que sem serem vistas, muitos dos residentes de Alenquer ao longo das suas vidas.

“Se calhar, a própria população de Alenquer já passou por algumas destas árvores 20, 30, 40 vezes e nunca tinha olhado para elas”, assinalou Paulo Marques, chefe da divisão de Ambiente da Câmara Municipal, apontando que essas árvores são “monumentos vivos” que devem ser devidamente valorizados por todos.

O vereador do Ambiente, Paulo Franco, salientou, por sua vez, que a exposição despertou a atenção das pessoas para um património natural local que desconheciam e destacou que o envolvimento direto das freguesias foi fundamental para o projeto, pois permitiu “congregar vontades” e criar um movimento coletivo para valorizar as árvores que, no final de contas, acabam por representar cada uma dessas localidades.

O responsável avançou que o executivo de Alenquer está a desenvolver uma Rede Municipal de Conservação da Natureza e, a esse respeito, sublinhou que a participação dos privados é essencial, pois existe “um património bastante importante” fora das áreas protegidas. A isto Paulo Marques acrescentou que “a maioria do património natural é privado”, podendo ser zonas sem aptidão agrícola e muitas vezes ao abandono, pelo que o diálogo privado-público não pode ser descurado no desenho de planos de conservação da natureza, “para o que lá está não se perca”.

Além disso, está também a ser criado um regulamento do arvoredo, que Paulo Franco considera ser “um passo fundamental” para proteger as árvores do concelho. Apesar de esse ser hoje um requisito legal obrigatório, Alenquer quer ir mais longe, não se limitando ao arvoredo em meio urbano e também abrangendo os espaços naturais.

“Num contexto de alterações climáticas, é fundamental dar estes passos e dar foco, uma vez mais, aos municípios, que têm uma importância bastante grande”, disse o vereador, não só porque os efeitos serão diferentes de região para região, mas também porque o conhecimento detalhado do território e o seu acompanhamento contínuo são elementos centrais das estratégias de mitigação e adaptação.

Por isso, disse que “apostar em recursos humanos, em competências e em conhecimento” é essencial para que os municípios possam fazer frente aos efeitos das alterações climáticas, “valorizar tudo o que é autóctone” e, sobretudo, “mudar mentalidades”.

Conhecer as árvores e a importância da sua conservação é um passo na direção certa para criar sociedades em maior harmonia com o mundo natural, que, no final de contas, é o nosso. Assim, mudar perspetivas é fundamental para valorizar e proteger a diversidade biológica, para revitalizar áreas naturais degradadas e para restaurar ecossistemas, e, na senda da cimeira global da biodiversidade (COP15) que terminou esta semana, inaugurar uma nova era na relação entre os humanos, as outras formas de vida e a paisagem.





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