Cientistas da Universidade do Porto estudam “fadiga de compaixão” em cuidadores informais de gatos de rua



Um grupo de cientistas da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) está a avaliar a experiência e os mecanismos que podem aliviar a “fadiga de compaixão” sofrida por cuidadores informais de gatos de rua, um tema ainda pouco valorizado socialmente.

Em comunicado, a instituição explica que a “fadiga de compaixão” é um esgotamento emocional e mental que afeta quem cuida de outros e lida com o sofrimento alheio. Dizendo que é “um tema ainda pouco valorizado socialmente”, acrescenta que esta condição tem sido estudada em profissionais de saúde e em médicos veterinários, frequentemente expostos a dilemas éticos complexos.

“Importa, agora, analisar o que acontece com os cuidadores informais de animais.”

A equipa é multidisciplinar, incluindo especialistas de áreas como a Psicologia, a Medicina Veterinária e a Bioestatística, e tem como principal objetivo dar a conhecer a realidade e procurar soluções e políticas públicas, à semelhança do que já acontece em vários países.

Cristina Costa Santos, investigadora e docente da FMUP e que faz parte da equipa, diz que “o primeiro passo para resolver um problema é conhecê-lo”.

“Tanto quanto sabemos, não existem estudos sobre cuidadores informais de gatos de rua. No entanto, basta passearmos pelo Porto e observarmos as inúmeras colónias de gatos errantes para percebermos que, por trás de cada colónia, de cada taça de água ou de comida, está pelo menos um cuidador”, sublinha.

E foi precisamente através desse contacto informal com cuidadores de animais de rua que surgiu a ideia de desenvolver este projeto.

“Tivemos a perceção de que este cansaço emocional pode ser ainda mais intenso entre cuidadores informais de gatos de rua. São pessoas que não conseguem ficar indiferentes ao sofrimento dos animais, mas que podem sofrer também as consequências emocionais dessa compaixão”, avisa a investigadora.

“Com vontade política, é possível fazer diferente”

A equipa pretende também desfazer estereótipos e produzir conhecimento, como, por exemplo, sobre o perfil de quem cuida.

“Embora o senso comum tenda a associar o cuidador informal de gatos errantes a uma mulher com bastante idade, com baixa escolaridade e sem ocupação, acreditamos que essa imagem não corresponde à realidade. O nosso estudo poderá revelar uma realidade bem mais diversa e surpreendente”, explica Cristina Costa Santos.

A cientista refere que estes cuidadores estão, na prática, “a substituir-se à responsabilidade legal dos municípios”, mas que, ainda assim, “serão praticamente esquecidos pelas câmaras e juntas de freguesia e, pior ainda, tantas vezes incompreendidos ou até ameaçados pelos próprios vizinhos”.

Além disso, essas pessoas, muitas vezes, acartam com despesas com alimentação e com cuidados veterinários que excedem as suas possibilidades.

Os investigadores acreditam que Portugal pode aprender com o que já se faz noutros países, combinando políticas públicas com envolvimento comunitário.

“Existem exemplos internacionais que demonstram que, com vontade política, é possível fazer diferente. A Holanda, que implementou uma política eficaz de esterilização obrigatória e tendencialmente gratuita (ou altamente subsidiada) para gatos errantes e domésticos, é um caso de sucesso”, refere Cristina Costa Santos.

Em Portugal, “algumas autarquias já têm programas de Captura, Esterilização e Devolução (CED), mas o investimento é ainda muito limitado e insuficiente. No panorama geral, representa apenas uma gota no oceano”, acrescenta.

Para a investigadora, seria igualmente essencial “a aplicação rigorosa da lei, com multas pesadas e até pena de prisão para quem abandonar animais”, bem como “a educação e a criação de uma cultura de proteção animal”, através de “campanhas educativas regulares nas escolas e nos meios de comunicação”.

Outra medida que considera importante é “apoiar de forma efetiva os cuidadores informais, seja através de apoio financeiro para alimentação e cuidados veterinários, de suporte logístico para abrigo e assistência aos gatos, ou ainda de acompanhamento emocional e psicológico aos próprios cuidadores”.

Além de Cristina Costa Santos e Ivone Duarte, professoras e investigadoras da FMUP, a equipa conta com Rui Vidal, Paulo Vieira de Castro e Sara Lisboa.

A instituição informa que quem quiser participar voluntariamente neste estudo, que, assegura, foi aprovado pela Comissão de Ética da FMUP, poderá deixar o seu contacto através do formulário de manifestação de interesse.






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