Cientistas descobrem como as formigas se tornaram “potências ecológicas”

As colónias de formigas são consideradas das sociedades mais complexas do reino animal. Constituídas por castas nas quais indivíduos se especializam em determinadas tarefas, são governadas por uma rainha, que assegura o futuro do grupo, e suportadas por inúmeras obreiras, que garantem o funcionamento do formigueiro.
Mas nem sempre terá sido assim. Dois investigadores da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, analisaram as características, dietas e vidas sociais das larvas de mais de 700 espécies de formigas e acreditam ter descoberto o que terá permitido a diferenciação nas colónias e, assim, dado azo a sociedades cada vez mais complexas e especializadas.
Atualmente, as larvas de formigas são alimentadas por adultos, que lhes levam pedaços de comida já parcialmente digerida. Nem todas recebem a mesma quantidade nem o mesmo tipo de alimentos, pelo que as recebem os petiscos mais nutritivos e as que comem mais serão criadas para serem as próximas rainhas, daquela colónia ou de outro para a qual migrarão quando forem adultas. As outras larvas darão origem a mais formigas obreiras ou a soldados.
No entanto, antes as larvas procuravam e obtinham os seus próprios alimentos, não dependendo do cuidado de adultos. Mas à medida que as formigas se iam tornando cada vez mais especializadas nas suas tarefas nas colónias, também as larvas foram perdendo a sua autonomia, passando a depender da comida que lhes era trazida.
Ao controlarem o crescimento das larvas, as formigas passaram também a controlar, na prática, o futuro do formigueiro, sobretudo ao nível da sua composição, determinando que larvas serão obreiras, as que serão soldados e as que se tornarão rainhas.
“Ao assumirem o controlo da nutrição das larvas, as formigas adultas foram capazes de esculpir uma morfologia consideravelmente mais distinta e especializada das rainhas e das obreiras, revelando níveis sem precedentes de complexidade social”, explica, em comunicado, Arthur Matte, coautor do artigo publicado na revista ‘PNAS’.
Os investigadores dizem que esse maior controlo sobre os papéis que as larvas assumirão quando forem adultas permitiu criar castas cada vez mais especializadas e aumentar o tamanho das colónias, e levou à perda da capacidade de reprodução das obreiras, passando a tarefa de criar descendência a estar exclusivamente concentrada nas rainhas e deixando as obreiras entregues às suas funções. Tudo isso permitiu que as formigas se tornassem, dizem os autores, em “potências ecológicas”, em sociedade altamente organizadas e complexas capazes de moldar ecossistemas inteiros.
Por isso, o controlo nutricional das larvas pelos adultos foi “um ponto de viragem crítico na evolução das formigas”, dizem os cientistas em comunicado, “com implicações profundas para o entendimento das dinâmicas das sociedades cooperativas de insetos”.
Adria LeBoeuf, a outra autora do artigo, salienta que a mudança no controlo do desenvolvimento das larvas “reflete transições fundamentais na evolução, como o surgimento da vida multicelular, em que células individuais perderam a sua autonomia para funcionarem como parte de um organismo maior”.