“Máscaras de térmitas” ajudam larvas de varejeiras a infiltrar termiteiras

O mundo natural está repleto de impostores, animais que se fazem passar por outros. Essa tática permite escapar aos olhos de predadores, imitar presas para ser mais fácil capturá-las e infiltrar e conquistar territórios de outras espécies, até adversárias.
Também entre os humanos esses estratagemas não são novidade nenhuma – pense nos romances e filmes de espionagem, por exemplo. Mas, agora, uma nova investigação científica revela que as larvas de varejeiras, moscas de grandes dimensões da família Calliphoridae, são capazes de se “vestirem a rigor” para enganar térmitas e viverem, indetetáveis, nas suas termiteiras.
Na cordilheira Anti-Atlas, no sul de Marrocos, uma equipa internacional de cientistas descobriu como é que as larvas de varejeiras conseguem enganar as térmitas, fazendo-se passar por um elemento da colónia.
Os investigadores deslocaram-se a essa parte do mundo para estudar borboletas, mas o tempo chuvoso fez com que muitas não levantassem voo. Por isso, decidiram procurar formigas. Levantaram uma pedra e foi então que se depararam com uma colónia de térmitas que incluía três larvas de mosca, de uma espécie que nunca antes tinham visto.
Análises genéticas posteriores revelaram que se trata de uma espécie do género Rhyncomya, que inclui outras espécies que já foram encontradas em termiteiras. Contudo, esta espécie desconhecida desenvolveu uma tática especialmente curiosa para se infiltrar nas colónias de térmitas.
Ao estudarem as larvas com mais atenção, identificaram na parte traseira do animal uma espécie de “máscara de térmita”, constituída por “uma ‘cabeça’ não funcional com antenas e palpos”, que imita quase na perfeição a cabeça de uma térmita. E inclui também dois pequenos pontos escuros, semelhantes a olhos, que, na realidade, são os orifícios pelos quais a larva respira.
Além do disfarce visual, a larva desta espécie de varejeira usa também uma camuflagem de odores. As colónias de térmitas, tal como as das formigas, são ferozmente protegidas face a invasores, usando sinais químicos para identificar quem está a mais. Quando detetam um intruso, os soldados atacam-no e desfazem-no em pedaços.
Mas estas larvas conseguem imitar os odores dos anfitriões, mantendo-se, assim, a salvo das investidas fatais.
Em laboratório, os investigadores perceberam que o odor emanado pela larva é indistinguível do odor das térmitas em cujos ninhos elas vivem. “Este odor é fundamental para interagirem com as térmitas e beneficiarem do seu estilo de vida comunal”, explica, em comunicado, Roger Vila, um dos principais autores do artigo publicado na revista ‘Current Biology’. “É um disfarce químico.”
E é bastante eficaz, pois, de acordo com a investigação, as térmitas parecem alimentar a larva de varejeira como se se tratasse de uma larva sua.

Foto: Vlad Dinca, coautor do artigo
“As larvas não são apenas toleradas, mas comunicam constantemente com as térmitas através de contacto com os seus tentáculos tipo antena”, aponta Vila, acrescentando que “até parece que as térmitas as alimentam, mas isso não foi ainda inequivocamente demonstrado”.
Os cientistas acreditam que a relação entre a larva de varejeira e as térmitas pode ser uma forma de “parasitismo social” ou de simbiose.
“Esta descoberta convida-nos a repensar os limites e o potencial das relações simbióticas e do parasitismo social na natureza”, salienta Vila. “Mas, acima de tudo, devemos perceber o quanto ainda não sabemos sobre a vasta diversidade e especialização dos insetos, que são organismos essenciais nos ecossistemas”, destaca.