O que é que nos faz recordar os nossos sonhos?
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Algumas pessoas acordam a recordar vividamente os sonhos da noite e conseguem contar histórias precisas vividas durante os mesmos, enquanto outras têm dificuldade em lembrar-se de um único pormenor. Porque é que isto acontece?
Um novo estudo, conduzido por investigadores da IMT School for Advanced Studies Lucca, e publicado na Communications Psychology, explora os factores que influenciam a chamada “recordação dos sonhos” – a capacidade de recordar os sonhos ao acordar – e revela quais as caraterísticas individuais e os padrões de sono que moldam este fenómeno.
A razão pela qual existe uma diferença tão grande na recordação dos sonhos continua a ser um mistério. Alguns estudos concluíram que as mulheres, os jovens ou as pessoas com tendência para sonhar acordadas tendem a recordar melhor os sonhos noturnos. Mas outros estudos não confirmaram estes resultados. E outras hipóteses, como a de que os traços de personalidade ou as capacidades cognitivas contam, receberam ainda menos apoio dos dados.
Durante a recente pandemia de COVID-19, o fenómeno das diferenças individuais na recordação dos sonhos matinais atraiu uma atenção renovada do público e da ciência quando foi registado um aumento abrupto da recordação dos sonhos matinais em todo o mundo.
A recordação de sonhos, definida como a probabilidade de acordar de manhã com impressões e memórias de uma experiência de sonho, mostrou uma variabilidade considerável entre indivíduos e foi influenciada por múltiplos fatores.
O estudo revelou que as pessoas com uma atitude positiva em relação aos sonhos e uma tendência para vaguear pela mente tinham uma probabilidade significativamente maior de recordar os seus sonhos. Os padrões de sono também parecem desempenhar um papel fundamental: os indivíduos que passaram por períodos mais longos de sono leve tinham uma maior probabilidade de acordar com uma memória dos seus sonhos.
Os participantes mais jovens apresentaram taxas mais elevadas de recordação de sonhos, enquanto os indivíduos mais velhos tiveram frequentemente “sonhos brancos” (uma sensação de ter sonhado sem recordar quaisquer pormenores). Este facto sugere alterações relacionadas com a idade nos processos de memória durante o sono.
Além disso, surgiram variações sazonais, com os participantes a reportarem uma menor recordação dos sonhos durante o inverno em comparação com a primavera, o que sugere a potencial influência de fatores ambientais ou circadianos.
“Os nossos resultados sugerem que a recordação dos sonhos não é apenas uma questão de acaso, mas um reflexo da forma como as atitudes pessoais, os traços cognitivos e a dinâmica do sono interagem”, explica o autor principal Giulio Bernardi, professor de psicologia geral na Escola IMT. “Estes conhecimentos não só aprofundam a nossa compreensão dos mecanismos subjacentes ao sonho, como também têm implicações na exploração do papel dos sonhos na saúde mental e no estudo da consciência humana”, acrescenta.
“Os dados recolhidos no âmbito deste projeto servirão de referência para futuras comparações com populações clínicas”, sublinha Valentina Elce, investigadora da Escola do IMT e primeira autora do estudo. “Isto permitir-nos-á avançar com a investigação sobre as alterações patológicas do sonho e o seu potencial valor prognóstico e diagnóstico”, conclui.