50 anos do 25 de abril na área do ambiente: Qual a evolução das atividades humanas, poluentes e remediação?



De 24 a 26 de abril, a Green Savers aborda, com a ajuda de especialistas, a evolução de alguns setores da área do ambiente nestes 50 anos do 25 de abril. Para o Professor e investigador no Instituto Universitário de Ciências da Saúde da CESPU, Ricardo Dinis-Oliveira, nos últimos 50 anos, as atividades humanas “tiveram um impacto significativo no meio ambiente, com algumas tendências evoluindo de forma positiva e outras com impactos preocupantes”.

No entanto, para o também coordenador da unidade de investigação 1H-ToxRun, que reúne especialistas que investigam a relação entre inúmeras atividades humanas e as suas consequências,  a conscientização ambiental e regulamentações mais rigorosas para proteger o meio ambiente “têm francamente aumentado nos últimos anos, nomeadamente através da promoção de práticas mais limpas e sustentáveis, desenvolvimento de tecnologias verdes e o investimento em energias renováveis, como energia solar, eólica e hidroelétrica”.

– Qual a evolução das atividades humanas no meio ambiente nos últimos 50 anos?

Nos últimos 50 anos, as atividades humanas tiveram um impacto significativo no meio ambiente, com algumas tendências evoluindo de forma positiva e outras com impactos preocupantes. O desenvolvimento industrial e urbano, que conduziu à expansão de cidades, resultou numa maior pressão sobre os recursos naturais, à emissão de muitas partículas finas (PM2.5) poluentes e à emissão de gases tóxicos de efeito estufa, como o dióxido de carbono, o ozono, o metano e óxido nitroso, contribuindo para as mudanças climáticas globais. Por outro lado, o desmatamento e a perda da biodiversidade em vastas áreas de habitat natural (com espécies de plantas e animais a enfrentarem ameaças crescentes de extinção) a contaminação dos recursos com microplásticos e com resíduos de fármacos e pesticidas, justificam também muita atenção da nossa parte.

Verdade seja dita, a conscientização ambiental e regulamentações mais rigorosas para proteger o meio ambiente têm francamente aumentado nos últimos anos, nomeadamente através da promoção de práticas mais limpas e sustentáveis, desenvolvimento de tecnologias verdes e o investimento em energias renováveis, como energia solar, eólica e hidroelétrica. Essas tecnologias oferecem alternativas para a geração de energia, reduzindo a dependência de combustíveis fósseis.

Como toxicologista, um dos acontecimentos poluentes mais impactantes que presenciei, e cujo verdadeiro efeito adverso o mundo estará ainda longe de compreender, passa pelo Teflon, muitas vezes considerado uma das maiores descobertas químicas para evitar que os alimentos se agarrem às frigideiras. A história desoladora do PFOA-C8 – ácido perfluorooctanóico – e a contaminação do sangue de milhões de pessoas, deixa qualquer cientista inquieto pelo risco de causar tumores e bioacumulação, com efeitos crónicos imprevisível.

– Quais os maiores desafios no combate à poluição atmosférica longo dos últimos 50 anos?

As estatísticas da Agência Europeia do Ambiente recordam-nos que a poluição atmosférica continua a ser o principal problema de saúde ambiental na União Europeia. Sem dúvida que as diversas fontes de poluição, incluindo emissões industriais, veículos motorizados, queima de biomassa, atividades agrícolas com pesticidas, explorações mineiras, uso de metais pesados em vários setores industriais, atividades domésticas com o uso de desinfetantes, detergentes e a contaminação dos recursos naturais com vários outros tipos de químicos estão entre as maiores preocupações.

Por isso, abordar todas estas fontes de poluição de forma eficaz requer abordagens multidisciplinares e coordenação entre diversos setores, que passam por promover o transporte sustentável, especialmente em regiões densamente povoadas, reduzir as emissões industriais e melhorar a qualidade do ar, combater sem reservas as mudanças climáticas que estão na base de várias patologias e de eventos climáticos extremos, como incêndios florestais e ondas de calor e na redução da qualidade do ar.

Lidar com a interconexão entre mudanças climáticas e poluição atmosférica requer uma abordagem holística e transdisciplinar e medidas adaptativas que transcendem as fronteiras nacionais, onde o One Health (ou uma só saúde) desempenha um papel fundamental considerando o animal, o humano e o ambiente perfeitamente interligados. Os poluentes ambientais estão na génese de patologias respiratórias, cardiovasculares, dermatológicas, infeciosas, neurológicas, neoplásicas, endócrinas, neurológicas, entre outras, contaminam vários alimentos com impacto humano e em animais domésticos e selvagens, podendo inclusive causar desequilíbrios ecológicos, com perda de habitat e extinção de espécies.

– A prevenção da contaminação do solo é muito importante para evitar a degradação deste recurso. Em Portugal, como é que se concretiza?

Em Portugal, a prevenção da contaminação do solo é uma preocupação com sinais animadores de boas iniciativas, que passam por uma legislação ambiental, licenciamento ambiental para projetos e atividades que podem representar um risco de contaminação do solo, monitorização e controlo de potenciais fontes industriais e aterros sanitários, gestão de resíduos, promoção de programas de educação ambiental e de práticas ambientalmente sustentáveis entre a população. Por exemplo, muito tem sido feito em matéria de remediação de solos em antigas zonas de explorações mineiras, como o minas de volfrâmio e urânio.

Lamentavelmente, permanece por regular a amplamente falada legislação ProSolos (Prevenção da Contaminação e Remediação dos Solos), que persiste em não ser implementada há quase 10 anos. São bandeiras desta legislação, o condicionar a venda de terrenos, onde estiveram instaladas atividades de risco de poluição do solo, a apresentação de um relatório do estado de contaminação do respetivo solo e a criação de um Atlas da Qualidade do Solo, onde estariam referenciadas as situações de risco de contaminação do solo.

Numa escala mais alargada, importaria que várias das políticas europeias em matéria de proteção dos solos estivessem alinhadas com as recomendações da OMS.

– Como é que se assegura que a contaminação que ocorreu no passado e a que venha a ocorrer no futuro fruto de acidentes ou práticas dolosas não coloque em risco nem a saúde humana nem o ambiente?

Assegurar que a contaminação ambiental não coloque em risco a saúde humana, animal e ambiental envolve uma combinação de medidas preventivas, fomentando práticas industriais seguras, tecnologias limpas e o uso responsável de recursos naturais, equipas dedicadas à monitorização do ar, água e solo para detetar precocemente qualquer contaminação em áreas mais problemáticas, regulamentação adequada e dissuasora de práticas ambientalmente reprováveis, e implantação de medidas de remediação ambiental para limpar e restaurar o ecossistema afetado.

Neste âmbito não podemos esquecer de promover a investigação científica em Portugal, pois são precisos muitos mais métodos e técnicas para combater a poluição. Foi, aliás, recentemente notícia a utilização de resíduos de cortiça para remover iões de metais pesados, corantes e antibióticos e o desenvolvimento de vários métodos analíticos para monitorizar e estudar a toxicidade de resíduos de fármacos na água.

De salientar que 2021 viu nascer uma unidade de investigação (1H-TOXRUN) com mais de 50 doutorados só dedicados a estudos de toxicidade e intoxicações. Entre 2 e 3 de maio teremos o III Congresso Internacional sobre os grandes desafios do século XXI, em que investigadores nacionais e internacionais partilharão o seu conhecimento e investigação que posicionam a Toxicologia neste guarda-chuva da One Health.

Uma certeza: para os poluidores, o tempo joga sempre a seu favor pois beneficiam de um estado de graça de inovação, até que provas irrefutáveis ponham a descoberto os potenciais efeitos adversos. Só uma investigação dedicada consegue encurtar este tempo e proteger o ambiente.

 

 





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