Como o Cisne Verde pode causar a próxima crise financeira mundial
O Banco de Compensações Internacionais (da sigla inglesa, BIS) é uma organização internacional responsável pela supervisão bancária. Visa a promover a cooperação entre os bancos centrais e outras agências na procura da estabilidade monetária e financeira. Sediado em Basileia, na Suíça, reúne 55 bancos centrais de todo o mundo. Luis Awazu Pereira da Silva, diretor-geral adjunto do BIS, deixa algumas reflexões sobre as alterações climáticas e o papel da banca na manutenção da estabilidade financeira.
1.
Os políticos estão preocupados com os riscos relacionados com o clima, devido a catástrofes e uma série de eventos que põem em risco a estabilidade financeira. Assim, muitos bancos e supervisores começaram a incluir as alterações climáticas na agenda: 65 nos últimos dois anos aderiram ao Network for Greening the Financial System (NGFS).
Surge o termo Green Swan (‘Cisne Verde’), comparado ao Black Swan (BS)
Black Swan – É um evento imprevisto com consequências extremas
Green Swan – Evento climático fora do normal; é diferente do BS porque se espera que algum dia de facto algo aconteça
Para a prevenção do Green Swan é preciso uma grande cooperação, entre as mais diversas entidades (bancos, governos) e mudar mentalidades.
O Covid-19 é um novo risco global.
O autor define a Covid-19 como um Green Swan, porque as alterações climáticas e as pandemias estão a aumentar devido às mudanças no ambiente e nos ecossistemas que afetam a vida humana. Assistimos a uma crescente perda de biodiversidade, e os cientistas afirmam que a destruição dos habitats, a industrialização da agricultura e a desflorestação levam ao aumento do risco do ser humano apanhar novas doenças (por exemplo, proximidade com espécies com os morcegos que transmitem doenças). O aumento da temperatura também pode estar ligado ao aparecimento de novos vírus, anteriormente inativos.
O que podemos mudar tendo como exemplo a covid-19 e como preparar a sociedade e a exonomia? O intuito é arranjar uma solução para mitigar ou prevenir maiores riscos de Green Swan ligadas ao clima.
2. Riscos globais, coisas em comum e diferenças
O que têm em comum:
• O impacto causado pelos Black e Green Swan às economias e à sociedade;
• Serem inesperados;
• Sem uma propagação linear;
• Os efeitos sentem-se em vários setores e vários países ao mesmo tempo;
• Têm uma grande intensidade e magnitude;
• Ambos envolvem externalidades negativas a nível global; nem o governo nem o setor privado podem calcular os riscos associados aos bens e serviços nesta situação.
Os riscos ligados ao clima e às pandemias como a Covid-19 têm efeitos semelhantes e devastadores nos setores financeiros: causam desemprego, recessões e uma depreciação do valor nas classes de ativos.
Um estudo recente da BIS revela que o custo a curto prazo da covid-19 é mais alto que outras epidemias, devido à paragem súbita global (para cumprir as medidas de prevenção e ao confinamento).
Diferenças entre os dois:
A previsão:
Os Green Swans são eventos que se sabe que podem acontecer, como a ciência confirma hoje em dia. Mas desconhece-se o tempo exato e a forma como irão ocorrer.
Os Black Swans não se prevêm e são eventos muito negativos que só podem ser explicados e racionalizados após a sua ocorrência, como é o caso de uma crise financeira global.
Quem os explica:
Green Swan – cientistas, embora sejam precisos economistas para explicarem o seu impacto económico e financeiro. Isto porque são consequências diretas das nossas ações no ambiente.
Black Swan – economistas e analistas financeiros
O seu impacto:
Green Swan – São maioritariamente irreversíveis; impacto massivo e direto nas vidas humanas
Black Swan – Têm efeitos duradouros mas conseguem ser corrigidos; impacto direto e massivo mas material
Recomendações:
Green Swan – Precisam de ação imediata
Black Swan – Aprendem com os eventos a criar novas estratégias
3. Necessidade de maior cooperação e coordenação global
Os eventos Green Swan são complexos e precisam da ação de todos: é preciso alertar. A NGFS tem tido um papel importante neste sentido, junto de outras ONGs, da sociedade civil e de bancos multilaterais de desenvolvimento (MDBs).
A velocidade com que a covid-19 se propaga levou à cooperação de vários países no combate ao vírus.
Em primeiro lugar, é preciso uma coordenação global para promover a mudança de metodologias e de mentalidades em relação a este risco. É preciso investigar e compreender melhor os riscos ligados ao clima, criar novas estratégias, e novas medidas preventivas com custos acrescidos.
Em relação aos ricos relacionados com o clima, é preciso coordenação em várias entidades:
· Nos governos, com leis como a de baixo carbono, que promovam investimentos mais sustentáveis;
· Coordenação com o setor financeiro para desenvolver regulações adequadas e ligadas ao clima.
Um destaque para os Bancos multilaterais de desenvolvimento, para apoiar políticas públicas de mitigação de crises internacionais e avaliar e avaliar a sustentabilidade da dívida após a crise;
· Criar padrões mais ecológicos e recorrendo a novas abordagens ligadas ao capital natural, criando uma ligação entre a economia e o ambiente.
O autor refere que uma coordenação entre agências globais que investigam a estabilidade macrofinanceira e agências que investigam as vulnerabilidades de saúde pública a nível local e global, poderia ser uma mais-valia. Seria uma espécie de seguro de segurança global ou regional, para o risco de pandemia, o que podia levar a uma mitigação mais rápida numa fase inicial de propagação. Segundo o relatório, muitos países desenvolveram estratégias de mitigação após a SARS, mas quase nenhumas foram implementadas.
A crise atual pode alertar e incentivar a prevenção em relação às alterações climáticas, além das medidas que temos para as mitigar.
4.
A Covid-19 parece-se com um Green Swan: Trás consequências negativas a nível global, tem uma grande probabilidade de acontecer e revela forças não lineares que interagem entre si causando grandes catástrofes. Ao pôr inúmeras vidas humanas em risco, necessita de cooperação conjunta para a sua resolução.
É necessário repensar as relações entre a eficiência e a resiliência nos sistemas socioeconómicos para prevenir esta situação.
Com a covid-19, várias medidas podem ser adotadas de forma a que não haja no futuro mais “choques económicos”. Cortar em despesas, analisar as despesas públicas, adotar medidas mais sustentáveis e investir em projetos que mitiguem esses riscos.
5.
É necessário usar a crise de covid-19 como um exemplo e usá-la como incentivo para não criar mais medidas que aumentem os riscos relacionados com o clima, como as alterações climáticas.
A recuperação é um desafio. E a recuperação com uma reduzida pegada de carbono é outro ainda maior. Os países estão a contar as despesas e a contrair os custos, estão focados nas dívidas e o interesse principal é uma rápida recuperação.
No entanto, houve também uma chamada de atenção para as mudanças que a covid-19 causou no mundo. A redução imediata dos gases de efeito de estufa e de outros gases poluentes foi notória em todo o mundo. Se as pessoas se preocuparem em reduzir estas emissões, e pensarem em adotar políticas mais verdes, previnem também que uma nova paragem como a atual gerada pela crise pandémica.
Ao mesmo tempo, a situação apontou para fragilidades nos sistemas, o que pode melhorar a sua eficiência a longo prazo.
Os governos podem aproveitar a situação, que mostra os riscos reais que podemos viver face às alterações climáticas, para adotar novas políticas mais sustentáveis. Várias empresas começaram a desenvolver mais carros elétricos, as empresas perceberam que o teletrabalho é eficiente e prático, pelo que podem cortar despesas em viagens.
Para existir uma recuperação positiva, é necessário repensar três aspetos: A adequação aos riscos globais, o seu preço face às externalidades negativas e a resiliência do sistema no que toca a evitar eventos Green Swan.
Cita «Antonio Machado: “Caminante no hay camino, se hace camino al andar” or “Walker, there is no road. The road is made as you walk”.