Fraca ligação entre áreas marinhas protegidas da Europa não garante defesa da biodiversidade
A ligação entre as várias áreas marinhas protegidas da Europa não é forte o suficiente para garantir conservação da biodiversidade, indica um estudo de investigadores do Centro de Ciências do Mar (CCMAR), associado à Universidade do Algarve.
“A rede de áreas marinhas na Europa é desestruturada e o potencial de conectividade entre elas é fraco”, disse à Lusa um dos seis investigadores que realizaram o estudo.
Esta conectividade é essencial para preservar a diversidade genética das populações, crucial na manutenção e recuperação dos recursos marinhos à “luz das mudanças climáticas ou catástrofes ambientais”, afirmou Jorge Assis.
Muitas áreas protegidas foram criadas por decreto, mas “não têm planos de ordenamento”, pelo que a solução para o problema passa pela “reclassificação das áreas existentes” e não tanto pela criação de novas zonas, afirma o investigador, considerando que as áreas de proteção existentes têm de fazer parte de uma rede coesa com várias “rotas de conectividade” para a biodiversidade marinha.
Jorge Assis sublinhou a “pouca probabilidade” que as espécies marinhas têm de viajar de uma zona protegida para outra, “no tempo útil que as suas fases de desenvolvimento possuem para se dispersar”, para que novas populações possam prosperar em novos habitats.
Alguns dos resultados do estudo dos investigadores do CCMAR demonstraram que “mesmo os peixes, que potencialmente têm uma maior capacidade para dispersar, não conseguem mover-se entre as áreas protegidas do Mar Mediterrâneo e as adjacentes das costas Atlânticas, como as que se situam ao longo de Portugal continental”.
“Mesmo que consigam, existe uma descontinuidade enorme entre a Península Ibérica e Mar do Norte e até nas áreas protegidas das Ilhas Britânicas e Mar Báltico”, afirmou.
A zona que apresenta “maior conectividade” é a do Mediterrâneo “que serve por si só como uma entidade de gestão favorável para espécies como os peixes, mas as restantes regiões da Europa estão altamente desestruturadas e desconectadas”.
O caso das macroalgas é apontado como um “exemplo extremo” da reduzida capacidade de dispersão por novos habitats, com o estudo a concluir que “a falta de áreas protegidas ao longo das costas Europeias não permite que estas espécies dispersem entre refúgios”.
Este estudo teve como base outros anteriores onde os investigadores compararam simulações de computador com “informação genética” de várias espécies, o que lhes permitiu confirmar que os padrões das correntes oceânicas influenciam a “conectividade entre populações”.
“Se houver muitos indivíduos a dispersarem de um lado para o outro, existirá troca de genes e as populações ficarão mais parecidas. Se elas estiverem separadas, a sua diferenciação genética poderá tornar-se elevadíssima”, disse Jorge Assis à Lusa.
Em preparação está já um novo estudo para tentar perceber quais as áreas protegidas “mais importantes”, que poderão permitir estabelecer corredores de ligação entre regiões afastadas – caso do oeste e do leste do Mediterrâneo – e salientar o seu papel crucial no contexto Europeu e a necessidade de manter os planos de gestão e níveis de conservação adequados.
O estudo teve como base a Convenção das Nações Unidas sobre a Biodiversidade que estabeleceu que “em 2020, 10% do mar deveria ter zonas protegidas interligadas entre si”, meta que não foi alcançada e, entretanto, atualizada para “30% até 2030”.
No entanto, os investigadores afirmam “não haver recursos financeiros e humanos” para estudar no terreno qual o “grau efetivo de ligação existente entre cada uma das áreas”, trabalho essencial para avaliar o impacto real das zonas protegidas. Em alternativa foi adotada uma abordagem com base em simulações de computador.
O grupo trabalhou com “as 172 áreas protegidas que oferecem o maior nível de proteção” e tentou perceber se essas permitem que a biodiversidade marinha se movimente entre cada uma delas, “desde o Mediterrâneo ao Báltico, incluindo as zonas insulares da Madeira e Canárias e o Norte de África”, este último considerado essencial como “zona de continuidade do Mediterrâneo”.
Simulando em computador um oceano virtual, com a geografia da Europa e das áreas marinhas protegidas e informação real de satélites sobre a direção das correntes do oceano, foi criado o cenário de “uma vez por dia durante 10 anos serem libertadas de todas dessas zonas partículas virtuais simbolizando uma ‘semente’ de um organismo a viajar na coluna de água”.
“Essas partículas virtuais viajaram num oceano virtual, transportadas pelas correntes marítimas inferidas por dados reais de satélites, até arrojarem numa costa. Se no trajeto passassem por uma área protegida essa informação seria guardada nos resultados para determinar quais as áreas protegidas que estão potencialmente ligadas”, explicou Jorge Assis.
Se o fizessem dentro do tempo útil das fases de desenvolvimento que os diferentes organismos marinhos possuem para dispersar – maior para os peixes e crustáceos e bem menor para algas e plantas – significaria que poderiam ter encontrado um local protegido para se fixarem e reproduzirem, mas o que análise dos dados revelou é que faltam corredores de biodiversidade.