Cientistas revelam que alterações climáticas tornaram a seca 20 vezes mais provável no hemisfério norte



Apesar de, pelo menos em Portugal, a estação estival já ter terminado e dado lugar ao outono, um calor atípico faz-se ainda sentir um pouco por todo o país, e a precária segurança hídrica, e também alimentar, continua a gerar preocupação. Contudo, as alterações climáticas impulsionadas pela ação humana podem esbater as fronteiras entre as quatro estações do ano e originar novos regimes climáticos que terão impactos em praticamente todas as sociedades do mundo.

Um estudo publicado esta quarta-feira pela organização World Weather Attribution, e que contou com a colaboração de cientistas da Suíça, da Índia, dos Países Baixos, de França, dos Estados Unidos e do Reino Unido, faz-nos deparar com um cenário alarmante.

Uma das principais conclusões aponta que, no hemisfério norte do planeta, onde se concentram as economias mais industrializadas e também de onde são emitidos os maiores níveis de poluição, a perda de humidade do solo durante o verão que passou, e que originou períodos de seca graves cujas consequências ainda enfrentamos, tornou-se, pelo menos, 20 vezes mais provável devido “às alterações climáticas humanamente induzidas”.

Quando às regiões da Europa central e ocidental, os cientistas avançam que a seca tornou-se entre três a quatro vezes mais provável devido aos mesmos fatores. As altas temperaturas e a escassez de chuva nessas áreas, explicam, “tiveram enormes impactos numa variedade de setores, incluindo na saúde humana, na energia, na agricultura e nos abastecimentos municipais de água”. E acrescentam que tal “foi exacerbado, por exemplo, por fracas infraestruturas e por fugas”, numa altura em que “os preços dos alimentos e da energia estavam já altos, devido à conjugação de impactos sociais e económicos”.

Apesar de as alterações climáticas já terem sido apontadas como o principal fator que impulsionou a gravidade da seca em muitos países, esta investigação confirma cientificamente essa suspeita, tendo como base a análise de dados resultantes de observação e conjugando-os com modelos climáticos, o que conduziu os especialistas à conclusão de que “as alterações climáticas provocadas pelos humanos aumentaram a probabilidade de eventos de seca”.

“Na Europa, temperaturas do ar acima da média foram reportadas desde o início de 2022, e a primavera foi seca na maior parte do continente”, detalham, salientando que, no verão que se seguiu, “uma sequência de ondas de calor, combinadas com a escassez generalizada de chuva, criou condições secas e quentes” que culminaram no que o programa ambiental da União Europeia descreveu como o verão “mais quente de sempre”.

Estimativas avançadas pelo estudo indicam que mais de 24 mil pessoas terão morrido no ‘velho continente’ devido ao calor, com França a registar 11 mil morte e a Alemanha mais de oito mil.

As condições de seca prolongada que se fizeram sentir durante a primeira metade do ano nos países europeus, e a consequente descida do nível de água nos reservatórios, “resultaram em reduções significativas nas colheitas de verão”, algo que os cientistas consideram que não deverá surpreender, visto que a agricultura é “a indústria mais consumidora de água na região”.

Contudo, “a Europa é apenas uma de muitas regiões no hemisfério norte que sofreu com a seca persistente e com as ondas de calor”. No sudoeste dos EUA e no norte do México, foram registados os períodos mais secos “em mais de 1.200 anos, levando a que três reservatórios de água, que forneciam 60 por cento da água a essas regiões, ficassem vazios”.

A seca na Europa “aconteceu numa altura em que os seus impactos interagiam com riscos não-climáticos”, pormenorizam os especialistas, criando impactos multidimensionais que se desenrolaram em cascata.

“Por exemplo, os impactos na produção elétrica devido ao calor e à seca coincidiram com o aumento dos preços da energia fruto do conflito na Ucrânia”, afirmam, indicando que situação semelhante foi observada ao nível da produção e abastecimento mundiais de bens alimentares “devido às exportações reduzidas da Rússia e da Ucrânia, bem como aos preços elevados dos fertilizantes”.





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