COP27: “Ainda é possível limitar o aquecimento a 1,5°C”, mas é “improvável”, diz Liga para a Proteção da Natureza
A 27.ª Conferência da Partes (COP27) da Convenção-quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas avança a todo o vapor, reunindo centenas de líderes políticos de todo o mundo, milhares de participantes, organizações da sociedade civil e representantes do setor privado.
Depois de um verão marcado por cheias devastadoras, secas extremas e ondas de calor sem precedentes, que pode ser entendido como prova de que as alterações climáticas não podem já ser ignoradas, são altas as expectativas de que da cimeira resultem ações concretas para proteger o planeta, mas a esperança, para alguns, não é muita.
Para Jorge Palmeirim, presidente da Direção Nacional da Liga para a Proteção da Natureza (LPN), “ainda é possível atingir o objetivo de limitar o aquecimento a 1,5°C mas, infelizmente, improvável”, apontando que, para isso acontecer, seria necessário reduzir em metade as emissões de gases com efeito de estufa até 2030.
“Os governantes de todo o mundo teriam de ajustar as medidas que tomam ao seu discurso”, afirma num artigo de opinião publicado no site da associação. “A sustentabilidade está hoje na boca de quase todos os políticos do Mundo, passando a imagem de que o problema climático está no centro das suas preocupações, mas na maior parte dos casos a prática demonstra o contrário.”
Assinalando que é fundamental passar da retórica política à ação concreta, Jorge Palmeirim afirma que “é hora de os governos enfrentarem de frente o agravamento do problema das alterações climáticas, assumindo compromissos de redução de emissões mais ambiciosos e estratégias transparentes, indicando explicitamente como vão ser implementadas no terreno”.
O ambientalista argumenta que a guerra da Rússia contra a Ucrânia, que despoletou uma crise energética na Europa e que fez com que vários Estados procurassem resolver o problema recorrendo a soluções do passado – por exemplo, reativando ou estendendo a vida útil de centrais elétricas a carvão e subsidiando a indústria dos combustíveis fósseis – está “claramente a agravar o egoísmo das nações”.
“Estão criadas condições para o falhanço da cimeira e, mais grave, estão criadas as condições para um substancial recuo na implementação de medidas de redução de emissões já assumidas”, destaca, acrescentando que o financiamento fornecimento pelos vários Estados à guerra, a par da crise económica alimentada pela crescente inflação, limita “as disponibilidades financeiras para apoiar os países em desenvolvimento na adaptação e mitigação climática”.
O apoio dos países mais ricos às nações mais pobres e mais vulneráveis aos impactos das alterações climáticas, e a compensação por danos e prejuízos associados, está no topo da agenda da comunidade internacional reunida na COP27, no Egipto. No entanto, é um tema que ainda causa muitas divisões, com os Estados menos industrializados a exigirem que os congéneres do hemisfério Norte do planeta permitam que possam aceder a fundos para se tornarem mais resilientes e sustentáveis.
Jorge Palmeirim explica que “o cenário mais provável é termos os países ricos a investirem fortemente na produção interna de energia verde, mais por motivações de independência energética que climáticas, resultando numa diminuição do consumo de combustíveis fósseis e, portanto, do seu preço”. Porém, escreve que “com pouca capacidade para fazer investimentos na conversão da produção de energia, os países em desenvolvimento poderão, então, cair na tentação de continuar na dependência de combustíveis fósseis cada vez mais baratos”.
O biólogo, que é também Professor Associado no Departamento de Biologia Animal da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, indica que as estratégias de adaptação aos efeitos das alterações climáticas poderão passar, por exemplo, pelo desenvolvimento e implementação de soluções tecnológicas que fortaleçam a resiliência dos territórios, por “medidas que tirem partido dos serviços dos ecossistemas para melhorar essa resiliência”, pela conceção de novas estratégias agrícolas e por regimes legais e financeiros “que alterem o comportamento dos humanos de forma a minimizarem o seu impacto”.
“Independentemente dos esforços que venhamos a fazer, é importante não esquecer que temos estado a alterar algo de gigantesco: o clima do Planeta”, acautela Jorge Palmeirim, reconhecendo que “há certas consequências para as quais não haverá boas medidas de adaptação”, pelo que “a nossa qualidade de vida vai, em alguns aspetos, ficar diminuída”.
“Vamos ter de pagar pelos erros que cometemos, mas se persistirmos nesses erros o pagamento vai ser bem mais doloroso”, avisa o dirigente da LPN.