Biodiversidade em Portugal está “sob grande pressão”. Um terço das espécies de mamíferos estão ameaçadas de extinção
Esta terça-feira, foi apresentado publicamente o novo Livro Vermelho dos Mamíferos de Portugal Continental, que revela que das 82 espécies avaliadas pelos especialistas, 27 (cerca de um terço) estão ameaçadas de extinção. O boto, a orca e o morcego-rato-pequeno estão entre os mais ameaçados, na categoria ‘Criticamente em Perigo’.
Esta obra pretende contribuir para “a planificação de medidas de conservação” da biodiversidade, ao apresentar o risco de extinção de cada espécie de mamíferos terrestres e marinhos da fauna de Portugal Continental e disponibilizar ao público, e aos decisores políticos, “informação de base para o minimizar”.
Alertando que “Em Portugal, a Biodiversidade também está sob grande pressão, sendo urgente implementar medidas de conservação que consigam diminuir os riscos da perda de espécies”, este trabalho resultou da colaboração entre várias dezenas de cientistas e centros de investigação académica, Organizações Não-Governamentais e instituições públicas.
Embora em 2005 ter sido já lançado um Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal, este é o primeiro que se dedica exclusivamente aos mamíferos, com uma “ambição de ir além do seu objetivo de avaliar o risco de extinção das espécies em Portugal Continental”, e congregando “toda a informação existente sobre a ocorrência de mamíferos no território nacional, incluindo dados museológicos, resultados de censos e de programas de monitorização, trabalhos científicos, dados sobre a atividade cinegética e relatórios”, explica a coordenação do projeto em comunicado enviado às redações.
Livro revela aumento de espécies ameaçadas de extinção em Portugal continental
O novo Livro Vermelho mostra também que 10 espécies de mamíferos continentais foram avaliadas como estando ‘Em Perigo’, um aumento dos 2,2% de 2005 para os atuais 9,2%.
Na secção dos carnívoros, surgem o lobo, o lince-ibérico, o gato-bravo e toirão, sendo que dos insetívoros aparecem a toupeira-de-água, o musaranho-anão-de-dentes-vermelhos e o musaranho-de-dentes-brancos-pequeno.
Entre essa dezena de espécies ‘Em Perigo’ contam-se também um trio de morcegos: morcego-de-ferradura-mediterrânico, morcego-de-ferradura-mourisco e o morcego-lanudo.
Na categoria de ‘Vulnerável’ estão 14 espécies, como o coelho-ibérico e a lebre-ibérica que, segundo os autores, “agravaram o seu estatuto desde a última avaliação”, sendo que há também “um aumento da percentagem das espécies de roedores nesta categoria”.
Face à avaliação feita há 18 anos no Livro Vermelho dos Vertebrados, o Livro Vermelho dos Mamíferos demonstra “um agravamento de 22,8% para 29,7% das categorias Criticamente em Perigo (CR), Em Perigo (EN), Vulnerável (VU) e Quase Ameaçada (NT)”. Embora os especialistas afirmem que parte desse aumento se deve ao “maior conhecimento sobre as espécies”, destacam também que foi influenciando pela “degradação ambiental dos habitats adequados para a manutenção de populações estáveis” na região continental do país.
Com o estatuto de ‘Regionalmente Extinto’ volta a surgir o urso-pardo, a única espécie nessa categoria, sendo que ser registou um aumento da percentagem de espécies de cetáceos em todas as categorias de ameaça.
Novas espécies e velhas ameaças
O novo Livro Vermelho dos Mamíferos apresenta 14 novas espécies no continente, relativamente à avaliação de 2005, entre elas cinco que só muito recentemente foram identificadas: o morcego-hortelão-claro, o rato-das-neves e três cetáceos (golfinho-pintado-do-atlântico, baleia-de-bico-de-sowerby e baleia-de-bico-de-true).
No entanto, o que não parece ser novidade são os fatores que continuam a pressionar a fauna portuguesa, empurrado muitas espécies para o limiar da extinção. Dizem os especialistas que a “degradação e a destruição e fragmentação dos habitats naturais, devido à atividade humana, são os principais fatores de ameaça identificados para os mamíferos”.
Contudo, a isso acrescem as alterações climáticas, que apesar de só recentemente terem adquirido uma dimensão mediática e política global, não são propriamente novidade, e são “consideradas previsivelmente como um fator de ameaça à sobrevivência e manutenção de populações estáveis para a maioria das espécies analisadas no âmbito do projeto”, indicam os autores do projeto.
Também práticas agrícolas ambientalmente prejudiciais são outro fator de risco, uma vez que “a aplicação de pesticidas ou outros agrotóxicos é igualmente apontada como causa direta ou indireta de redução populacional, no caso dos morcegos, roedores e insectívoros”.
Além disso, “a contaminação dos cursos de água por elementos orgânicos ou inorgânicos é também preocupante para a sustentabilidade das espécies associadas aos meios aquáticos”, ao passo que o “controlo de predadores”, como a caça, “é um fator de ameaça identificado para o grupo dos carnívoros, enquanto que a sobrepesca ou a morte acidental em artes de pesca são fatores de ameaça para os pequenos cetáceos”.
Para proteger as espécies ameaçadas é preciso recuperar a Natureza
O quadro que é traçado, de agravamento do risco de extinção das espécies de animais não-humanos, é um que nos deve mobilizar para a ação. Por isso, os autores do Livro Vermelho dos Mamíferos salientam que a conservação destas espécies deve ter como prioridade a “recuperação de habitats, criação de mosaicos de habitats naturais ou seminaturais, reabilitação das áreas florestais autóctones, controlo e prevenção dos fogos florestais e adoção de práticas e sistemas de produção mais sustentáveis”.
No que toca às espécies aquáticas, em particular, as ações devem incidir sobre o combate a poluição e degradação dos cursos de água, ao passo que para animais como os morcegos que vivem em grutas “é fundamental a proteção legal e física dos abrigos, que dificultem o acesso de pessoas, mas permitam a circulação dos morcegos”, dizem os especialistas.
O ministro do Ambiente e Ação Climática, Duarte Cordeiro, assina o prefácio a este novo Livro Vermelho, escrevendo que “representa um instrumento de trabalho determinante para agências governamentais, académicos, associações de defesa do ambiente, empresas em geral, estudantes e todos os que têm interesse em saber mais sobre a biodiversidade”.
E afiança que “[q]uestões como os planos de ordenamento e a gestão de áreas protegidas, a investigação centrada em mamíferos, a avaliação de impactes ambientais ou o apoio aos decisores públicos serão favorecidas por esta publicação”.