Degelo está a impedir que o zooplâncton chegue à superfície e pode ameaçar ecossistemas polares
O aquecimento do planeta está a tornar o gelo marinho nas regiões polares mais fino e mais escasso. Previsões apontam que o Ártico, no remoto polo norte da Terra, poderá ter o seu primeiro verão sem gelo já em 2030.
Com menos gelo a cobrir a superfície do mar, é cada vez mais a luz solar que penetra no oceano, não só agravando o degelo, mas também alterando as dinâmicas ecológicas. Num artigo divulgado esta semana na ‘Nature Climate Change’, investigadores europeus e canadianos dizem que, ao chegar cada vez mais fundo, a radiação solar pode impedir que o zooplâncton, pequenos crustáceos, como o krill, que são a base das cadeias alimentares dos ecossistemas árticos, emirjam das zonas mais escuras do oceano.
Isto, porque o zooplâncton tende a preferir áreas crepusculares, com pouca luz. Em condições normais, o congelamento da superfície do mar bloqueia grande parte da radiação que vem do sol, fazendo com que esses animais minúsculos subam até zonas mais perto da superfície, servindo de alimento a várias espécies que habitam essas áreas da coluna de água.
Assim, nas regiões polares, a migração do zooplâncton é determinada pelas estações. No verão, mantém-se em zonas mais escuras e mais profundas, e no inverno emerge. Além de oferecer um ‘escudo’ contra a luz solar, o gelo marinho é também uma importante zona de alimentação para o zooplâncton, uma vez que nas suas faces inferiores se concentram algas das quais esses pequenos animais se alimentam.
Com cada vez menos gelo a ser formado por causa do aumento da temperatura nos polos, o ciclo de migração do zooplâncton será afetado, assim preveem os cientistas, que através de sensores de medição biofísica estudaram o ecossistema ártico e os efeitos do degelo.
Gaëlle Veyssière, investigadora do British Antarctic Survey e uma das principais autoras do artigo, explica que a migração do zooplâncton para zonas mais profundas está a acontecer cada vez mais cedo e estão a emergir cada vez mais tarde. “Isto significa que o zooplâncton manter-se-á em águas mais profundas durante períodos de tempo mais longos”, salienta.
Já Hauke Flores, primeiro autor, aponta que no futuro o gelo marinho formar-se-á mais tarde, no final do outono, o que reduzirá a quantidade de algas que se formam e alojam nesses blocos, resultando na escassez de alimento para o zooplâncton.
Os cientistas dizem que um declínio das populações de zooplâncton, poderá ter “consequências catastróficas” para várias outras espécies de animais que dependem deles como fonte de alimento, entre eles focas e baleias.
Ainda assim, dizem que se o aquecimento global for limitado a 1,5 graus Celsius face a níveis pré-industriais, e tal como plasmado no Acordo de Paris de 2015 assinado por quase 200 governos, é possível evitar os piores impactos sobre a migração vertical do zooplâncton, e, assim, atenuar a probabilidade de um desastre ecológico no Ártico e em outras regiões semelhantes.