Primeiros primatas terão usado ombros e cotovelos como ‘travões’ para descerem das árvores
Olhe para os seus cotovelos. Depois para os seus ombros. Essas articulações permitem-nos alcançar as prateleiras mais altas e lançar objetos, mas terão primeiro evoluído nos primatas de hábitos arborícolas como mecanismos para ajudá-los a descerem das árvores em segurança.
De acordo com investigadores da Dartmouth College e da Universidade Estadual do Ohio, nos Estados Unidos da América, os primatas, incluindo os humanos, terão evoluídos ombros rotativos e cotovelos flexíveis para desacelerar a descida das árvores à medida que os seus corpos se iam tornando cada vez mais pesados.
Depois de terem abandonado as florestas e transitado para habitats mais abertos, como savanas, os primeiros humanos fizeram uso dessas articulações para recolher alimentos e para manipular ferramentas que lhes permitiam caçar e defender-se de predadores e inimigos.
Através da análise de vídeos e imagens estáticas de chimpanzés e pequenos macacos da espécie Cercocebus atys em ambiente selvagem, os cientistas procuraram perceber quais as diferenças entre as duas espécies no que toca à subida e à descida das árvores. Embora ambas escalem os troncos de forma semelhante, com os cotovelos perto do corpo, ao descerem, os chimpanzés estendem os braços por cima da cabeça para suportarem o corpo, apoiando-se em ramos, muito à semelhança de um humano a descer de um escadote.
Num artigo publicado esta quarta-feira na revista ‘Royal Society Open Science’, os autores lembram que os humanos e os primatas, como os chimpanzés, são muito mais próximos uns dos outros, em termos genéticos e evolutivos, do que ambos são do grupo dos macacos. E argumentam que o estudo das semelhanças no que toca à descida (seja de árvores ou escadotes) ajudará a compreender melhor história da evolução do Homo sapiens.
Para Luke Fannin, primeiro autor, a descida, ou downclimbing, é um “fator incrivelmente importante” que ajuda a perceber as diferenças anatómicas entre macacos e primatas “que eventualmente acabaram por se manifestar nos humanos”, mas tem sido “subvalorizado”.
“O downclimbing representou um desafio físico muito significativo dado o tamanho dos primatas e dos primeiros humanos”, diz o investigador, apontando que a seleção natural beneficiou aqueles que estavam munidos de ombros e cotovelos flexíveis que lhes permitiam descer em segurança das árvores, sem caírem e morrerem.
Outro dos cientistas envolvido na investigação, Jeremy DeSilva, considera que a Antropologia se tem focado muito em como os primatas sobem às árvores, mas não tem prestado atenção à descida. “Temos ignorado a segunda metade deste comportamento”, admite.
“Os primeiros primatas evoluíram há 20 milhões de anos em florestas dispersas onde teriam de subir a uma árvore para encontrar alimento, e depois descer para passarem à próxima árvore”, explica DeSilva. Para o investigador, “os grandes primatas não se podem dar ao luxo de cair, porque tal poderia resultar na sua morte ou em ferimentos graves”, pelo que “a seleção natural terá favorecido aquelas anatomias que permitiam uma descida em segurança”.
Olhando para a história da evolução humana, os cientistas apontam que os Australopitecos subiam às árvores à noite para se protegerem de predadores e voltavam a descer quando a escuridão se dissipava. Também o Homo erectus, outro dos nossos antepassados e que já usava o fogo, terá desenvolvido ombros mais largos e rotativos que, em conjunto com cotovelos flexíveis, terá permitido o uso de armas de arremesso, como arcos e flechas ou pedras.
DeSilva diz que os traços anatómicos que hoje temos, e que, por exemplo, permitem que jogadores de râguebi lancem bolas com grande precisão e a grande distância, muito devem a esses primatas ancestrais. “É a mesma anatomia dos primeiros primatas com uns quantos ajustes”, afirma.