Das aves aos mamíferos, da terra à água: Mais de 150 espécies selvagens em todo o mundo contaminadas por químicos
Em todos os continentes, mais de 150 espécies de animais selvagens estão a ser contaminadas por químicos usados no retardamento de chamas. Pelo mundo fora, orcas, chimpanzés, pandas vermelhos, rãs, aves e borboletas, bem como várias espécies ameaçadas, têm acumuladas nos seus tecidos e órgãos substâncias usadas para tornar produtos menos inflamáveis, mas que alguns consideram que causam mais dano que benefício.
Uma investigação liderada pelo Green Science Policy Institute (GSPI) revela que foram encontrados químicos que estão associados a cancros do fígado, tiroide e rins em múltiplas espécies de animais selvagens, mas, apesar de serem conhecidos os seus malefícios, continuam a ser amplamente usados numa ampla gama de produtos, como mobília, dispositivos eletrónicos e outros objetos que podem fazer parte do dia-a-dia de muitas pessoas.
Para Lydia Jahl, cientista do GSPI e uma das principais autoras deste trabalho, esse tipo de químicos, na verdade, não torna os produtos menos inflamáveis, “mas podem ser prejudiciais para as pessoas e os animais”.
Entre os químicos encontrados em animais selvagens estão os policlorobifenilos (PCB) e éteres difenílicos polibromados (PBDEs), bem como novos químicos que agora substituem essas substâncias já em desuso, como parafinas cloradas e organofosfatos.
Em comunicado, o GSPI explica que o uso de organofosfatos retardantes de chama “está a proliferar, embora mesmo níveis baixos possam prejudicar o QI, a atenção e a memória das crianças”.
Os investigadores alertam que estes químicos acumulam-se nas teias tróficas marinhas e terrestres, espalhando-se desde as presas aos predadores de topo, e que concentrações de PCB nas orcas têm sido associados à redução da taxa de sobrevivência das crias e a sistemas imunitários fragilizados.
Os cientistas avisam mesmo que os grupos de orcas residentes na Gronelândia, no Estreito de Gibraltar e no Havai têm sido particularmente afetadas pelo retardantes de chama que escorrem para os mares, e recordam que um outro estudo, de 2018, já previa que metade das populações de Orcinus orca podem colapsar ao longo dos próximos 100 anos devido à contaminação por PCB.
“As orcas não deveriam de ter de nadar num mar de retardantes de chamas. A ciência é clara sobre como esses químicos prejudicam o seu desenvolvimento – bem como o das nossas crianças”, salienta Arlene Blum, diretora-executiva do GSPI. E acrescenta que “temos de atualizar padrões ineficientes de inflamabilidade para impedir que essas substâncias tóxicas afetem o ambiente, os animais selvagens e nos próprios”.
Além das orcas, foram também encontrados químicos em rãs que vivem perto de instalações de resíduos eletrónicos na China, que causam a redução dos seus fígados, e em chimpanzés em áreas protegidas no Uganda.
O trabalho resultou de uma revisão de vários estudos feitos sobre a presença de químicos retardantes de chama nos tecidos e órgãos de animais selvagens por todo o mundo, e serviu para criar um mapa interativo que mostra quais os animais afetados por retardantes de chamas e onde estão localizados no planeta.
Jahl diz que esse mapa “ilustra as consequências globais de se estar repetidamente a substituir retardantes de chama prejudiciais por outros que são igualmente prejudiciais”.
“Em vez deste ciclo sem fim de substituições lamentáveis”, afirma a especialista em química ambiental, “temos de avaliar se muitos dos padrões de inflamabilidade que impulsionam o uso de retardantes de chama têm sequer algum benefício”.
De acordo com o mapa, já foi confirmada a contaminação por esses químicos de 49 espécies de mamíferos marinhos, 25 espécies de mamíferos terrestres, 51 espécies de aves e 26 espécies de peixes, incluindo 16 espécies ameaçadas de extinção, como a beluga, a baleia-azul, o colobo-vermelho-do-uganda (Piliocolobus tephrosceles) e a lontra-marinha (Enhydra lutris).