Zero diz que plantação de abacates em Alcácer do Sal pode ser “machadada” na conservação



A associação ambientalista Zero considerou sexta-feira que o projeto de plantação de pera-abacate previsto no concelho de Alcácer do Sal (Setúbal), cuja consulta pública terminou na quarta-feira, “pode ser mais uma machadada” na conservação da natureza.

De acordo com a Zero, em comunicado enviado à agência Lusa, o projeto do grupo Aquaterra “propõe a instalação de um empreendimento agroindustrial, com mais de 800 hectares (ha), para a produção e exportação de abacate, em plena Zona Especial de Conservação (ZEC) da Comporta/Galé, em área de habitats dunares”.

Esta “monocultura de regadio dependerá de 34 furos de captação de água subterrânea e do abastecimento do perímetro de rega do Vale do Sado”, apontou.

O período de consulta pública do Estudo de Impacte Ambiental (EIA) do Projeto Agroflorestal das Herdades de Murta e Monte Novo, em Alcácer do Sal, promovido pela empresa Expoente Frugal Lda, do grupo Aquaterra, decorreu entre 12 de dezembro de 2023 e a passada quarta-feira.

O processo, que está agora em análise, contou com 341 participações, de acordo com a informação disponível no portal Participa (www.participa.pt), consultado hoje pela agência Lusa.

No entender da associação Zero, este projeto pode pôr em causa os recursos hídricos da região.

“Para a produção de abacate, o promotor dimensionou o sistema de rega contando com um uso anual de mais de quatro milhões de metros cúbicos (4 hm³) de água, cerca de 3 hm³ provenientes de águas subterrâneas e 1 hm³ do Aproveitamento Hidroagrícola do Vale do Sado (AHVS)”, lê-se no comunicado.

Segundo a Zero, “para justificar o direito ao uso destas quantidades de água subterrânea, o grupo Aquaterra contraria os valores considerados pela entidade competente quanto aos recursos hídricos disponíveis nos aquíferos, propondo critérios próprios para pintar um cenário mais favorável a fim de justificar uma maior extração de água”.

“A massa de água subterrânea em questão, denominada Bacia Tejo–Sado/Margem Esquerda, tem já apresentado indícios de sobre-exploração nalgumas áreas”, alertou.

E, “quanto ao uso da água proveniente das barragens do Vale do Gaio e Pego do Altar, esta só poderia ser feita com uma autorização de água a título precário, dado que os terrenos a regar estão fora do perímetro de rega” do AHVS, frisou a Zero.

No documento, a associação lembrou que “o Governo restringiu a contratualização de água proveniente de perímetros de rega coletivos públicos para culturas permanentes, como salvaguarda da capacidade de gestão da água face a situações de maior escassez”.

“O projeto desenvolve-se nos limites da Reserva do Estuário do Sado, em ecossistemas com habitats dunares com zimbrais e outras espécies protegidas ao abrigo da Diretivas Habitats e Aves”, e onde foram “identificadas espécies RELAPE, endemismos ibéricos e lusitânicos”.

Para a Zero, a “proliferação de projetos turísticos e de intensificação agrícola tem levado a uma artificialização da ZEC da Comporta/Galé, ultrapassando já os 4.000 ha”.

“Caso o projeto venha a ser aprovado, as áreas incompatíveis com a conservação dos valores naturais protegidos irão atingir cerca de 17 a 18% da área classificada, pondo em causa a integridade” desta ZEC.

A associação ambientalista ressalvou que “a artificialização de áreas classificadas” está a pôr em “risco” as “metas de proteção da natureza”

“No entanto, de pouco serve possuir área com proteção legal para a conservação e recuperação da biodiversidade se, na prática, largas proporções são transformadas através de empreendimentos incompatíveis com estes fins. Por uma questão de honestidade, para o cálculo deveriam ser apenas consideradas as áreas onde esta proteção efetivamente ocorre”, argumentou.





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