Painéis solares usados podem ter nova vida e ajudar a reduzir desperdício

Investigadores australianos defendem a criação de um sistema nacional para reutilização segura de painéis solares e alertam para o crescente problema ambiental causado pelo fim de vida destes equipamentos.
A rápida adesão da Austrália à energia solar está a gerar um problema inesperado: toneladas de painéis solares fotovoltaicos (PV) a caminho dos aterros sanitários. Apesar de a maioria destes sistemas ter uma vida útil estimada entre 20 e 30 anos, muitos são removidos muito antes, contribuindo para um crescente volume de resíduos.
De acordo com o Conselho de Energia Australiano, estima-se que, até ao final deste ano, o país acumule cerca de 280 mil toneladas de painéis solares fora de uso.
No entanto, um estudo recente da Universidade da Austrália do Sul (UniSA) aponta soluções para prolongar a vida dos painéis e reduzir o impacto ambiental. A investigação, liderada pela doutoranda Ishika Chhillar, identificou os principais obstáculos à reutilização sustentável destes equipamentos e propõe estratégias para implementar uma economia circular no sector solar.
Reciclagem não chega
Segundo Chhillar, reciclar não é suficiente. A esmagadora maioria dos painéis ainda acaba em aterros, mesmo quando poderia ser reutilizada com segurança. O estudo destaca barreiras técnicas, económicas e regulatórias que impedem o reaproveitamento em larga escala.
“O baixo custo dos painéis novos prejudica o mercado de segunda mão. Além disso, não existem incentivos à reutilização, as políticas variam entre estados, não há responsabilização pelas instalações em segunda mão e faltam infraestruturas para testar e renovar os painéis usados,” explica a investigadora.
Falta de regulamentação e incentivos
Atualmente, a Austrália não possui um quadro nacional unificado para a reutilização de painéis solares. As regras diferem entre estados e territórios, e não existe um processo claro de aprovação para a revenda ou reinstalação de painéis usados. Este cenário gera receios entre instaladores, que temem potenciais responsabilidades legais.
“Sem normas e certificações claras, os compradores e instaladores ficam apenas com a palavra do vendedor. Um sistema de certificação oficial mudaria isso,” defende Chhillar.
A proposta passa pela criação de um programa credível de certificação, com protocolos de teste padronizados e classificações simples (como ouro, prata, bronze ou estrelas) que indiquem a eficiência restante e o tempo de vida estimado de cada painel.
Inovação digital para transparência
A transparência é outro elemento-chave. A professora associada Sukhbir Sandhu, especialista em sustentabilidade social e ambiental, sublinha a importância de soluções digitais para rastreabilidade.
“Se o histórico e o desempenho de cada painel estivessem registados numa base de dados acessível a compradores e reguladores, seria mais fácil avaliar se o painel está apto a ser reutilizado,” afirma.
Entre as soluções propostas estão etiquetas com QR codes ou até plataformas baseadas em blockchain, que permitiriam acompanhar o “passaporte digital” de cada painel ao longo do seu ciclo de vida.
“Isto permitiria decisões mais rápidas sobre a reutilização de painéis, sem necessidade de testes adicionais a cada mudança de dono,” acrescenta.
Um novo ciclo para a energia solar
Ao aplicar estas recomendações, a Austrália pode não só reduzir drasticamente o volume de resíduos, como também maximizar o retorno ambiental e económico do investimento em energia solar.
“Já temos práticas semelhantes noutros sectores, como os telemóveis, baterias e eletrónica,” diz Sandhu. “Se adotarmos uma abordagem estruturada à reutilização de painéis solares, o sector das renováveis pode prolongar significativamente o ciclo de vida destes recursos e contribuir para uma economia mais sustentável e circular”, conclui.