Gás de xisto garante supremacia económica dos EUA durante as próximas décadas
O gás de xisto está a mexer com o mundo. Se para uns é uma das grandes ameaças ambientais dos últimos anos, para outros é a galinha dos ovos de ouro. É o caso dos Estados Unidos. O país tem a quarta maior reserva deste tipo de combustível, atrás da China, Argentina e Argélia.
Um relatório apresentado esta segunda-feira pela Agência Internacional de Energia (AIE) indica que o aumento da prospecção, extracção e exportação do gás de xisto em território norte-americano vai impulsionar a indústria e a criação de postos de trabalho até pelo menos 2035, nos Estados Unidos. Assim, esta controversa forma de energia vem garantir a continuidade da supremacia económica do país sobre a Europa e Ásia durante as próximas duas décadas.
Face a esta vantagem energética, a AIE indica, refere o Financial Times (FT), que a Europa terá de encetar reformas para evitar ficar atrás dos Estados Unidos, a nível económico, durante os próximos 20 anos. “A Europa enfrenta desafios críticos. As políticas energéticas nunca se apresentaram como um pivô importante nas perspectivas económicas europeias”, afirma o economista-chefe da AIE, Fatih Birol.
Os países europeus investiram fortemente nas energias renováveis, como a energia solar ou eólica, de forma a reduzir as emissões de carbono. Porém, tal investimento levou a um aumento dos preços da energia para as empresas e famílias do velho continente. Para não ficar atrás a nível competitivo, o economista-chefe da AIE indica que os líderes europeus devem adoptar medidas para garantir o fornecimento de gás mais barato, tendo, para isso, de ultrapassar a oposição pública ao gás de xisto e renegociar os contratos de importação de gás a longo prazo com a Rússia.
Preços da energia deverão na Europa e Japão deverão ser o dobro dos Estados Unidos
O relatório da AIE refere ainda que, mesmo quando os Estados Unidos intensificarem a exportação de gás de xisto, a vantagem do país sobre outras potências continuará a ser considerável, apesar dos receios de que a exportação possa erodir esta vantagem competitiva.
Apesar de a AIE indicar que a maior potência mundial irá intensificar a exportação do gás de xisto nas próximas duas décadas, o elevado custo de exportação vai traduzir-se em preços mais elevados para os importadores do que aqueles praticados para os consumidores domésticos.
Face a esta probabilidade, várias empresas estrangeiras têm investido na prospecção e extracção do xás de xisto americano, de forma a poderem beneficiar de preços mais baratos, e a AIE espera que as exportações norte-americanas aumentem até 2035, por contraste com as exportações nipónicas e europeias, que deverão contrair.
“Vamos observar um florescimento da produção industrial nos Estados Unidos. As empresas norte-americanas vão gozar de uma vantagem competitiva e aumentar a sua quota de mercado ao nível das exportações”, aponta Fatih Birol.
Em 2035, a AIE espera que os preços do gás e da electricidade na Europa e no Japão sejam duas vezes superiores aos custos energéticos nos Estados Unidos. Embora as diferenças de preços actualmente não sejam consideráveis, o economista-chefe da AIE indica que, face a esta vantagem futura, várias empresas, nomeadamente as fabricantes automóveis, regressem aos Estados Unidos, de onde saíram, no passado, em busca de locais com mão-de-obra mais barata.
Riscos ambientais podem não compensar preços mais baratos
Apesar de o gás de xisto se apresentar como um combustível energético mais barato para os consumidores, a sua extracção está associada a elevados riscos ambientais.
A extracção do gás e do óleo de xisto – que estão em reservas rochosas profundas – é feita através da fracturação hidráulica. Esta técnica pressupõe a injecção de grandes quantidades de água e produtos químicos, a grande pressão, fracturando a rocha.
É na questão ambiental que a fracturação hidráulica enfrenta forte oposição pública. A técnica pressupõe a utilização de grandes quantidades de água, que deve ser transportada para o local da extracção. Por outro lado, a fracturação pode atravessar lençóis de água subterrânea, que podem ser contaminados pelos agentes químicos utilizados no processo. Além disto, a fracturação hidráulica liberta gases com efeitos de estufa e pode provocar sismos.
Os activistas ambientais dizem ainda que a fracturação hidráulica desvia as empresas energéticas e os governos do investimento em energias renováveis, mantendo o problema das fontes de energia inalterado.
Ao contrário da China (embora o país ainda não tenha começado a explorar este recurso em grande escala) e dos Estados Unidos, a Europa não possui grandes reservas de gás de xisto. França, Polónia e Reino Unido são os países europeus com as maiores reservas, sendo que a Polónia é o que tem a geologia mais propícia à exploração.
Em Portugal, existem zonas com potenciais reservas, como o Bombarral, Cadaval e Alenquer, mas até agora sem interesse comercial provado. Mesmo que que estas reservas fossem exploráveis, o início da sua extracção demoraria alguns anos e os acordos já firmados com outros países para a importação de gás natural teriam de continuar a ser pagos.
Face aos riscos associados à extracção do gás de xisto, o Bloco de Esquerda e os Verdes já fizeram chegar resoluções à Assembleia para que a exploração deste combustível seja proibida em solo nacional.
Foto: Beyond Coal and Gas, sob licença Creative Commons