WWF: “A Comissão Von der Leyen está a desmantelar décadas de proteções ambientais arduamente conquistadas”



Hoje, a Comissão Europeia publicou o novo Environmental Omnibus e o Grids Package, que incluem a proposta de uma Diretiva para a Aceleração das Renováveis. Estes textos “confirmam aquilo que a sociedade civil, cientistas e cidadãos preocupados têm vindo a alertar há meses: a Comissão Von der Leyen está a desmantelar décadas de proteções ambientais arduamente conquistadas, colocando em risco a qualidade do ar, da água e a saúde pública, em nome da competitividade”, acusa a WWF, em comunicado.

Segundo a mesma fonte, estas propostas não são ajustes isolados ou técnicos: “fazem parte de um padrão mais amplo de ataques, desde o enfraquecimento do Regulamento da UE sobre Desflorestação à redução das proteções contra químicos e pesticidas, abrindo a porta a mais poluição. Este desmantelamento vai além da política ambiental, minando a responsabilidade democrática”.

Os avisos de cidadãos e especialistas “têm sido ignorados, levantando sérias preocupações sobre a legitimidade do processo”. Isto “é demonstrado pela conclusão da Provedora de Justiça da UE de que houve má administração na “simplificação” da PAC em 2024 e pelas quase 200.000 respostas de cidadãos à consulta do environmental omnibus, que acabaram por ser desconsideradas”.

As supostas “poupanças” da Comissão “não têm avaliação de impacto e focam-se apenas na redução de custos de conformidade, ignorando o preço muito maior da poluição, do declínio dos ecossistemas e dos desastres climáticos”. As suas próprias estimativas “mostram que a fraca ou inexistente aplicação das leis ambientais já custa à Europa cerca de 180 mil milhões de euros por ano em impactos na saúde e danos ambientais”.

Sabien Leemans, Gestora de Biodiversidade no Gabinete de Política Europeia da WWF, afirma: “Esta proposta marca mais um triste marco na loucura da desregulação. É como assistir repetidamente a um acidente de carro em câmara lenta: a Comissão propõe mudanças ‘menores’, perde completamente o controlo, e acabamos com eurodeputados e Estados-Membros a destruir leis ambientais inteiras. Já vimos isto com o primeiro omnibus, com o Regulamento da UE sobre Desflorestação, e o mesmo pode muito bem acontecer com esta proposta.”

O Environmental Omnibus “representa ameaças sérias” para os ecossistemas europeus e para a saúde pública:

Mais poluição industrial e química: Enfraquecer a Diretiva Emissões Industriais [7] e eliminar a base de dados SCIP, comprometendo a ambição da economia circular da UE [8], permite que a poluição industrial persista mais tempo, expondo as comunidades a emissões prejudiciais evitáveis e aumentando a exposição humana a químicos tóxicos.

Água insegura: A anunciada revisão e flexibilização da Diretiva-Quadro da Água é extremamente alarmante. Os ecossistemas de água doce já estão em estado crítico, e danos adicionais agravarão riscos para a saúde, reduzindo a capacidade destes ecossistemas de nos protegerem de desastres climáticos. No fundo, um presente para a indústria com um custo enorme para as pessoas e para a natureza.

“Stress” adicional sobre a biodiversidade: Lançar um “teste de resistência” às Diretivas Aves e Habitats está totalmente desalinhado com a atual crise da biodiversidade. Ecossistemas saudáveis são vitais para combater as alterações climáticas, mas a Comissão parece ignorar isto, desconsiderando avisos científicos.

A saúde dos cidadãos europeus “está seriamente em risco”. Enquanto algumas indústrias poderosas beneficiarão, regulamentos mais fracos aumentarão a exposição a químicos tóxicos, piorarão a qualidade do ar e da água e aumentarão riscos a longo prazo para as comunidades. Estes retrocessos “desmantelam salvaguardas que protegem contra o cancro, doenças respiratórias e danos ambientais. Em vez disso, a UE deveria reforçar proteções para preservar a saúde pública e garantir um ambiente limpo, seguro e saudável”.

Sofie Ruysschaert, Responsável Sénior de Política de Restauro da Natureza na BirdLife Europe and Central Asia, afirmou: “As Diretivas Aves e Habitats são a espinha dorsal da proteção da natureza na Europa. Enfraquecê-las agora não só destruiria décadas de progressos alcançados com grande esforço, como também empurraria a UE para um futuro em que ecossistemas — e as comunidades que deles dependem — ficam perigosamente expostos. A Comissão deveria apoiar um compromisso mais forte e uma implementação genuína, em linha com os requisitos legais.”

Sergiy Moroz, Gestor de Política para a Natureza no European Environmental Bureau, declarou: “As novas regras de licenciamento anunciadas hoje removem proteções essenciais da água — somando-se à decisão irresponsável da semana passada de rever a principal lei da água da UE no próximo ano sem avaliação adequada. Estas decisões são um golpe para os cidadãos europeus, para a sua saúde e para o seu direito básico de acesso a água limpa. A proteção da água não é algo a desregular; é a base de uma água limpa, segura e resiliente para milhões de europeus.”

O novo EU Grids Package “acelera ainda mais a desregulação ao remodelar fundamentalmente a forma como os projetos energéticos são aprovados”. Os elementos das propostas relativas ao licenciamento  podem criar:

Incerteza jurídica: Em vez de acelerar realmente a transição para energias renováveis através da aplicação das regras existentes, introduzem um conjunto complicado de requisitos pouco claros e terminologia vaga, fáceis de abusar e desalinhados com os procedimentos de Avaliação Ambiental existentes. Isto conduzirá inevitavelmente a projetos mal planeados, conflitos com a vida selvagem e resistência das comunidades locais.

Falta de flexibilidade: Regras rígidas removeriam a margem de manobra dos Estados-Membros na concretização das metas de energias renováveis. Prioridades nacionais como planeamento urbano ou proteção ambiental são ultrapassadas, impondo restrições desproporcionadas ao uso do solo.

Enfraquecimento das proteções ambientais: A diretiva enfraquece regras ambientais ao permitir que mais projetos contornem salvaguardas essenciais. Isto coloca áreas ecologicamente sensíveis, como sítios Natura 2000 ou rios de fluxo livre, em maior risco e pode tornar exceções em norma.

As propostas “claramente não visam acelerar as energias renováveis: favorecem interesses industriais e contradizem jurisprudência estabelecida da UE, enfraquecendo salvaguardas ambientais e ameaçando o Estado de direito”.

Ioannis Agapakis, advogado no Programa de Vida Selvagem e Habitats da ClientEarth, afirmou:
“Após meses de caos legislativo, a Comissão deu um golpe devastador nos próprios pilares da ordem jurídica da UE. Está a afastar o escrutínio democrático e a ignorar as suas próprias regras processuais, descarrilando o quadro de licenciamento ambiental. Ainda mais preocupante é que a Comissão atuou sem qualquer avaliação de impacto ou provas, apesar das recomendações claras da Provedora de Justiça — um nível de arbitrariedade que levanta dúvidas sobre a sua vontade de defender o Estado de direito.”

A aplicação destas disposições “levará a mais perda de habitat e declínio de espécies na UE. Dado o estado já frágil de muitas espécies e ecossistemas, o risco de extinções reais é muito elevado”.

A UE “deve escolher se continuará a ser líder global na proteção das pessoas e da natureza, ou se se tornará um terreno desregulado ao serviço de interesses corporativos. Apelamos agora ao Parlamento Europeu e aos Estados-Membros para rejeitarem este omnibus e travarem a vaga de desregulação que representa”, conclui.






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