Anéis das árvores e documentos antigos podem melhorar previsões de eventos climáticos sem precedentes

Fenómenos climáticos poucos habituais estão cada vez mais, e um pouco por todo o mundo, a apanhar sociedades de surpresa. Um grupo de cientistas diz que é preciso ampliar o leque de ferramentas e de dados para se poder traçar previsões mais precisas que ajudem a preparar as populações.
Num artigo publicado recentemente na revista ‘Nature Communications’, investigadores de vários países europeus dizem que as previsões climáticas têm estado limitadas a registos meteorológicos convencionais e tendem a recuar apenas um século na linha temporal.
O “fator surpresa”, argumenta a equipa, reside sobretudo nas consequências inesperadas dos eventos climáticos, pelo que os cientistas consideram que para deixarmos de sermos surpreendidos é preciso, por um lado, ampliar o leque de fontes de dados e de informação sobre o passado e apostar na resiliência “a todos os níveis”.
Entre as ferramentas que devem ser incluídas nas análises e previsões estão indicadores indiretos, como amostras de gelo, recifes de coral, anéis de árvores, sedimentos oceânicos e grãos de pólen. Os autores acreditam que esses métodos menos convencionais permitem abrir a porta para o passado de formas que as abordagens mais habituais não permitem.
“Temos estado limitados pelo facto de pensarmos que os eventos meteorológicos extremos são apenas tão maus quanto as medições que temos feito desde que as estações meteorológicas foram inventadas”, aponta Timo Kelder, do Instituto de Estudos Ambientais da Universidade Livre de Amesterdão (Países Baixos) e primeiro autor do estudo.
“Mas a nossa investigação mostra que podemos usar modelo meteorológicos para recuar centenas ou mesmo milhares de anos para descobrir o que é realmente possível no nosso sistema climático”, acrescenta.
Assim, os autores deste trabalho apresentam uma lista de abordagens que permitirão, acreditam eles, que os cientistas que estudam o clima possam obter uma imagem mais completa sobre as possibilidades de eventos climáticos extremos.
Analisar registos convencionais, estudar arquivos históricos e naturais, como os anéis das árvores, criar cenários hipotéticos com base em eventos do passado, usar modelos climáticos para simular os extremos fisicamente possíveis, são algumas das vias para as quais os investigadores instam a comunidade científica a prestar mais atenção.
Sobre os segredos que se podem esconder nos troncos das árvores, os autores dizem que, através da análise dos anéis das árvores, foi possível reconstruir 850 anos de padrões de seca na região noroeste da China, revelando eventos extremos que não aparecem nos registos modernos.
Quanto a documentos antigos, salientam que conseguiram perceber que o mês de junho de 1846 em Durham, Reino Unido, foi “significativamente mais quente” do que qualquer junho registado nas últimas décadas na mesma região. E setembro de 1774 em Oxford foi o mês mais húmido de que há registo nos últimos 250 anos nessa cidade britânica.
“Provas documentais de eventos passados, na forma de registos escritos de observação, fotografias e desenhos, podem (…) mostrar que eventos recentes, por vezes, não são tão inéditos como podem parecer à primeira vista”, lê-se no artigo.
Os investigadores acreditam que usar estes métodos mais “alternativos” para ajudar a ver o que os convencionais não conseguem alcançar permitirá uma melhor adaptação das comunidades a eventos climáticos com impactos negativos.
Para Dorothy Heinrich, da Universidade de Reading e segunda autora do artigo, os fenómenos climáticos sem precedentes “não quebram só recordes – quebram comunidades, infraestruturas e vidas”.
“Quando o inimaginável acontece, não estar preparado é um desastre à espera de acontecer. Mas a ciência pode ajudar-nos a imaginar o inimaginável, a desvendar esses riscos e a preparar-nos. O nosso futuro depende da rapidez e do rigor com que nos adaptamos hoje”, salienta.