“Antes eram gigantes”: Sobre-exploração reduz em quase metade tamanho dos bacalhaus-do-atlântico desde os anos 90



Entre 1996 e 2019, o comprimento médio dos bacalhaus-do-atlântico (Gadus morhua) no Mar Báltico diminuiu 48%, dos cerca de 40 centímetros para os 20 centímetros. E a causa foi a pesca excessiva.

Desde 2019 que a pesca direcionada desse peixe está proibida nessa região marinha, numa tentativa para recuperar as suas populações, que quase foram levadas ao colapso devido à sobre-exploração.

Uma investigação liderada pelo GEOMAR – Centro Helmholtz para a Investigação Oceânica (Alemanha), cujos resultados foram publicados este mês na revista ‘Science Advances’, revela que a redução tanto do tamanho da população de bacalhaus no Báltico como do comprimento dos próprios peixes “é o resultado da influência humana”. Décadas de pesca intensiva “afetaram profundamente” a composição genética de toda uma espécie, dizem os cientistas, que “antes eram gigantes”.

Há umas décadas, os bacalhaus do Báltico Oriental alcançavam comprimentos de até um metro. Esta fotografia foi tirada em 1987, durante uma expedição de científica. Foto: Jesper Bay, Danish Institute for Fisheries and Marine Research (Fonte: GEOMAR).

“A sobre-exploração seletiva alterou o genoma do bacalhau do Báltico Oriental”, uma população de bacalhau-do-atlântico que reside no Mar Báltico Central, diz, em comunicado, Kwi Young Han, primeira autora do estudo.

“Pela primeira vez numa espécie totalmente marinha, fornecemos evidências de alterações evolutivas nos genomas de uma população de peixes sujeita a exploração intensa, o que empurrou a população para o limiar do colapso”, acrescenta.

A investigação teve por base o que a equipa descreve como “um arquivo invulgar”, isto é, a análise dos otólitos de 152 bacalhaus, capturados entre 1996 e 2019 na Bacia de Bornholm, entre a Polónia e a Suécia, e maior local de desova dos bacalhaus do Báltico Oriental.

Os otólitos são pequenos pedaços de carbonato de cálcio que se encontram no sistema auditivo de vários vertebrados e que contribuem para a perceção da gravidade, para o equilíbrio e para a orientação dos animais, incluindo os humanos. Também são vulgarmente conhecidos como “cristais”. Doenças que afetem os otólitos, como a Vertigem Postural Paroxística Benigna, ou VPPB, podem provocar afetar o equilíbrio e causar vertigens.

A investigação teve por base o que a equipa descreve como “um arquivo invulgar”, isto é, a análise dos otólitos de 152 bacalhaus, capturados entre 1996 e 2019 na Bacia de Bornholm, entre a Polónia e a Suécia, e maior local de desova dos bacalhaus do Báltico Oriental. Foto: Sarah Uphoff, GEOMAR.

Os cientistas comparam os otólitos aos anéis nos troncos das árvores, uma vez que também eles servem como registos do crescimento dos animais.

Através de análises genéticas, os investigadores concluíram que os bacalhaus-do-atlântico com genomas de crescimento rápido praticamente desapareceram, fruto da exploração excessiva nessa região do mundo. Por isso, restaram apenas bacalhaus de crescimento mais lento, que atingem mais cedo, e com tamanhos menores, a idade de reprodução. Como são mais pequenos, foram sendo poupados, ao contrário dos peixes maiores.

“Quando os maiores indivíduos são sistematicamente removidos da população durante muitos anos, peixes mais pequenos e que amadurecem mais rapidamente ganham uma vantagem evolutiva”, explica Thorsten Reusch, um dos principais coautores do estudo.

“O que estamos a observar é a evolução em ação, causada pela atividade humana. É cientificamente fascinante, mas ecologicamente muito preocupante”, reconhece o investigador.

Os bacalhaus-do-atlântico mais pequenos que sobrevivem produzem menos crias e acredita-se que os traços genéticos que codificam o crescimento mais rápido e um amadurecimento mais lento podem ter mesmo desaparecimento nessa população báltica.

Tudo indica que, apesar da proibição da pesca, os bacalhaus do Báltico Oriental continuam pequenos, mostrando que a recuperação dos traços perdidos demora muito mais tempo do que o seu declínio, quando é possível.

“Os nossos resultados demonstram o impacto profundo das atividades humanas em populações selvagens, mesmo ao nível do seu ADN”, destaca Han. “E salientam ainda que a pesca sustentável não é apenas uma questão económica, mas também uma questão de conservação da biodiversidade, incluindo recursos genéticos.”






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