Aquecimento do oceano afeta a simbiose entre uma pequena lula e bactérias luminosas



O aumento da temperatura do oceano pode comprometer a eclosão da lula-pigmeia Euprymna scolopes, nativa das águas do Havai, e a sua relação simbiótica com bactérias luminosas.

De acordo com uma equipa internacional de cientistas, entre eles investigadores da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE), águas mais quentes afetam negativamente a estratégia de camuflagem noturna da lula, tornando-a vulnerável à predação.

Alguns animais, como os pirilampos, conseguem produzir luz num processo conhecido por bioluminescência. No entanto, 80% de todas as espécies que criam esse tipo de luz vive no oceano. Essa luz pode ser gerada diretamente pelo animal ou através de uma simbiose com bactérias luminosas alojadas em órgãos especializados.

É o que acontece no caso dos sepiolídeos, pequenos moluscos cefalópodes que habitam zonas arenosas costeiras, e que têm uma bioluminescência simbiótica. Durante o seu desenvolvimento embrionário, formam um órgão luminoso especializado que é colonizado por bactérias luminescentes nas primeiras horas após a eclosão. A luz produzida por estas bactérias é utilizada pelos animais como camuflagem durante a noite, permitindo-lhes reduzir o risco de serem predados.

A equipa quis compreender como o aumento da temperatura e da acidez dos oceanos, bem como a intensificação de fenómenos extremos como as ondas de calor marinhas, impactam a simbiose entre a lula E. scolopes e bactérias luminosas da espécie Vibrio fischeri.

Num artigo publicado recentemente na revista ‘Global Change Biology’, revela-se que o aumento da temperatura da água, além de reduzir o sucesso de eclosão e a sobrevivência pós-eclosão das pequenas lulas, faz com que a simbiose seja mais difícil e que tenda a deteriorar-se ao longo do tempo.

O estudo revela ainda que situações de stress térmico, como as ondas de calor marinhas que se prevê que se tornem mais frequentes e intensas, comprometem a formação completa do órgão especializado em bioluminescência onde o animal armazena uma “reserva” de bactérias para condições adversas.

De acordo com os autores, esta investigação mostra que, tal como os corais perdem as suas algas simbióticas durante episódios de branqueamento, também estes pequenos cefalópodes sofrem perdas significativas nas suas relações simbióticas em eventos de stress térmico.

“Ao pensar no impacto da temperatura em animais simbióticos, geralmente pensamos no branqueamento de corais. Aqui, mostramos que os cefalópodes simbióticos também podem ‘branquear’, sendo sensíveis a altas temperaturas nos estágios iniciais da vida”, explica Eve Otjacques, primeira autora do artigo e investigadora do MARE.

“O que também foi surpreendente foi a formação incompleta do órgão de luz durante a eclosão, como se o desenvolvimento tivesse sido interrompido antes do último estágio de desenvolvimento”, acrescenta.

A quebra desta simbiose afeta diretamente a capacidade de camuflagem noturna, tornando estes sepiolídeos havaianos mais vulneráveis à predação, o que pode ter “consequências ecológicas relevantes” nas águas pouco profundas onde ocorrem, alertam os cientistas.






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