Ave voadora mais pesada do mundo usa plantas para ‘automedicar-se’

Que os humanos usam medicamentos para curar um sem-fim de problemas de saúde não é novidade para ninguém, e já foi descoberto que vários outros animais, como chimpanzés, abelhas, elefantes e répteis recorrem às plantas para se sentirem melhor, evitar doenças, facilitar a digestão ou matar parasitas.
No entanto, pela primeira vez, um grupo de cientistas espanhóis descobriu que também a abetarda (Otis tarda), considerada a ave voadora mais pesada do mundo, consome ativamente, e com maior frequência, duas espécies de plantas para se livrar de parasitas, fungos e outros patógenos: papoilas (Papaver rhoeas) e línguas-de-vaca (Echium plantagineum). Os machos dessa espécie podem medir mais de um metro de comprimento e pesar até 16 quilogramas.
Os cientistas consideram que este poderá ser um “exemplo raro” de uma ave que usa plantas para combater doenças, ou seja, que se automedica.

Crédito: Carlos Palacín
Luis M. Bautista-Sopelana, cientista residente do Museu Nacional de Ciências Naturais, em Madrid, e o principal autor do estudo publicado a revista ‘Frontiers in Ecology and Evolution’, salienta que a investigação “mostra que a abetarda prefere comer plantas com compostos químicos com efeitos antiparasitários”.
Apesar de 70% da população viver na Península Ibérica, esta ave distribui-se pelas regiões da Europa ocidental, do Norte de África e da Ásia oriental, e está classificada com o estatuto de ‘vulnerável’ pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).
Azucena Gonzalez-Coloma, do Instituto de Ciências Agrícolas de Madrid, também participou neste estudo, e assinala que, pelo menos em teoria, tanto os machos como as fêmeas de abetarda beneficiam desta automedicação à base de plantas, especialmente durante a época da reprodução, “quando as doenças sexualmente transmissíveis são comuns”. Por outro lado, o consumo dessas plantas ajuda os machos a conquistarem uma parceira, pois, livres de patógenos que possam arruinar a sua performance, “parecerão mais saudáveis, vigorosos e atraentes” aos olhos das fêmeas, diz a especialista.
Durante a investigação, os cientistas conseguiram verificar que as abetardas consumiam papoilas e línguas-de-vaca com especial intensidade durante a época do acasalamento, comparativamente a outras alturas do ano.
As fêmeas não se afastam muito dos seus locais de nidificação, onde depositarão os ovos durante toda a sua vida, e a acumulação de fezes faz aumentar o risco de infeções ou reinfeções, pelo que a ingestão dessas plantas específicas ajuda-as a manterem-se saudáveis. Ainda, os machos gastam muita energia durante a época reprodutiva, com os espetáculos enérgicos com os quais pretendem atrair uma companheira, pelo que os seus sistemas imunitários ficam fragilizados. Assim, ao ‘automedicarem-se’ asseguram que continuam livres de doenças e que podem prolongar a sua linhagem genética.