Cobras-marinhas provam que perdas causadas pela evolução podem ser recuperadas
Pode pensar-se que, no decurso da evolução, quando uma característica ou capacidade é perdida está perdida para sempre. Mas um grupo de cobras vem provar que isso poderá não ser bem assim.
Uma equipa de investigadores, liderada pelo doutorando Isaac Rossetto, da Universidade de Adelaide, na Austrália, defende que as cobras-marinhas mostraram ser capazes de recuperar genes que codificam traços que tinham desaparecido durante a sua história evolutiva.
Através do estudo de nove espécies do género Hydrophis, os cientistas constataram que todas elas recuperaram as características genéticas para uma visão a cores avançada, algo que terá sido perdido, mas que estaria presente no seu antepassado comum de há cerca de três milhões de anos.
Rossetto tinha já conseguido identificar a recuperação desses componentes genéticos numa espécie de cobra-marinha em particular, a Hydrophis cyanocinctus, mas por ter sido possível encontrar o mesmo fenómeno em mais outras oito espécies, considera que, agora, existem evidências científicas suficientes para que se possa declarar, com algum grau de confiança, que as perdas ocorridas durante processos evolutivos podem não ser totalmente irreversíveis.
“Pensamos muitas vezes que a evolução é uma força que se move apenas numa direção: em frente”, explica o primeiro autor do artigo divulgado na ‘Genome Biology and Evolution’, mas “na realidade, as circunstâncias ecológicas de um organismo são continuamente dinâmicas, e, por vezes, tornar-se ‘o mais apto’ significa recuperar traços que em tempos não eram tão benéficos”.
Os investigadores acreditam que a recuperação dos elementos genéticos que permitem uma visão a cores pela H. cyanocinctus será uma resposta ao ambiente marinho pouco profundo no qual essa espécie vive, cheio de luz e repleto de tonalidades distintas. Esse tipo de habitat, sustentam, será diferente daquele no qual terão vivido alguns dos seus antepassados, com menos luz, pelo que uma visão que permite distinguir cores com maior precisão teria servido para pouco.
“Os descendentes dessas cobras mais atingas vivem hoje numa diversidade de ambientes luminosos, incluindo ecossistemas marinhos cheios de luz e cores”, observa Rossetto, em nota, pelo que a recuperação dos genes que permitem uma melhor distinção visual das cores terá sido influenciada pelas condições ambientais, para melhor adaptar as modernas cobras-marinhas aos mundos nos quais vivem.
Contudo, ainda não se sabe ao certo se a recuperação dos componentes genéticos resulta propriamente na recuperação da capacidade para distinguir cores, pelo que o cientista reconhece que “é preciso muito mais informação”, incluindo estudos comportamentais, que serão fundamentais para que se possa confirmar, com certeza, que a recuperação dos genes permite “uma sensibilidade maior às cores”.
Com esses dados, Rossetto tem esperança que seja possível desvendar uma questão intrigante, mas ainda sem resposta: “quando um traço complexo é perdido, como é que pode ser recuperado?”.