Conferência GPA: é importante repensar o significado de desperdício
Hoje consome-se mais de 50% de recursos naturais renováveis do que a Terra é capaz de regenerar. E o desperdício é gerado nos mais diferentes sectores de actividade: áreas alimentar, água, energia, agricultura, industrial.
Para ilustrar a dimensão do desperdício gerado pela actividade humana, e apenas com referência a uma tipologia de desperdício – o alimentar – Helio Mattar, presidente do Instituto Akatu, disse ontem na conferência do Green Project Awards que se o desperdício alimentar fosse um país, seria o maior consumidor de água e o terceiro em emissão de carbono (neste caso só ultrapassado pelos Estados Unidos e pela China).
Como forma de mitigar a dimensão do desperdício, que aumentou drasticamente com o crescimento do consumo registado ao longo das últimas décadas, e em grande parte devido ao aumento da população, é premente repensar o significado de desperdício e tornar o consumo cada vez mais consciente.
“Tarefa que deve ser partilhada pelos diferentes agentes da cadeia de valor”, como defendeu Ana Isabel Trigo Morais, directora-geral da APED.
Apesar do trabalho realizado nos últimos tempos em torno do desenvolvimento da economia circular, os especialistas apontaram ainda como principais barreiras à produção e ao consumo consciente, logo a um melhor entendimento sobre o desperdício:
Em primeiro lugar, a existência no mercado, por vezes ainda reduzida, de condições que ofereçam ao consumidor a possibilidade de diminuir resíduos por si gerados (por exemplo ao nível das embalagens, uma vez que o consumidor ainda se depara com produtos que têm várias embalagens).
Há também a questão da durabilidade dos produtos – o seu tempo útil de vida é cada vez mais curto o que leva ao consumo contínuo de novos produtos para substituto dos anteriores. Os investimentos ainda são elevados no que respeita ao desenvolvimento de infra-estruturas que promovam o ciclo integrado dos produtos, o que contrasta com o conhecimento reduzido sobre o ciclo de vida dos produtos. Finalmente, existe ainda um status quo associado ao consumo de determinados produtos.
Outra das dificuldades associadas à sustentabilidade do consumo é o próprio conceito de sustentabilidade ainda permanecer associado a custos elevados, ao ser caro. Quer na óptica dos agentes produtivos e transformadores como do próprio consumidor.
“Já ninguém tem dúvidas da importância da sustentabilidade mas ainda se associa a ideia de sustentabilidade ao ser caro, pelo que é absolutamente indispensável sermos capazes de associar ao conceito de sustentabilidade o conceito de simplicidade e de ser barato”, referiu João Matos Fernandes, Ministro do Ambiente, durante a conferência.
O governante revelou ser “prioritário repensar o desperdício” porque o consumo é excessivo e os recursos finitos.
Ainda na óptica de se repensar o significado de desperdício, que tem habitualmente uma conotação negativa, Fernando Leite, presidente do Smart Waste Portugal, referiu a importância de existir uma maior consciência para a criação de valor do próprio resíduo, afirmando que resíduos de uma indústria podem ser matéria-prima de outra indústria, sendo por isso “fulcral a existência de um trabalho de parceria entre diversas indústrias, bem como a existência de legislação que permita uma maior adopção da prática de reintrodução de resíduos em novos sistemas produtivos.”
Por seu turno Pedro Póvoa, da direção de investigação e desenvolvimento do Grupo Águas de Portugal, referiu-se às Etar “como as novas fábricas das cidades” pois dão origem diversos sub-produtos como fósforo, bio-plástico, lamas.
Também Isabel Jonet, presidente da Entrajuda, se referiu ao desperdício como um potencial de desenvolvimento não só económico como social e de empregabilidade.