Desperdício alimentar: Do produtor ao frigorífico
Este flagelo mundial é muitas vezes ignorado, mas começa na produção e termina no nosso frigorífico. Todos têm de contribuir para que deixe de existir.
Os gases com efeito de estufa derivados da indústria alimentar representam entre 25 e 30% das emissões mundiais, indica o relatório do Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas (IPCC), sendo que pelo menos 10% dessas emissões podiam ser evitadas, pois correspondem ao desperdício alimentar. A Organização para a Alimentação e a Agricultura (FAO) revelou que o desperdício de alimentos nos Estados Unidos, Europa, China, Japão e Austrália ocorre, principalmente, durante a distribuição e na casa dos consumidores.
Nos países menos industrializados o desperdício ocorre em quase todos os setores da cadeia alimentar ao terem, geralmente, piores infraestruturas, tecnologias arcaicas, transportes deficitários e menos recursos para a produção sustentável. Em termos comparativos, se o desperdício alimentar fosse um país seria o terceiro emissor de gases com efeito de estufa a nível mundial, logo a seguir à China e aos Estados Unidos, contribuindo assim para o aquecimento global e para as alterações climáticas que o planeta tem vindo a sofrer.
Em números redondos, estima-se que os países industrializados desperdicem cerca de 1,3 mil milhões de toneladas de alimentos por ano, o que seria suficiente para alimentar os cerca de 925 milhões de pessoas que passam fome um pouco por todo o globo terrestre. O ano passado, a ONU instituiu Dia Internacional Da Consciencialização Sobre Perdas E Desperdício Alimentar, que se passou a comemorar a 29 de setembro.
Este dia tem como objetivo sensibilizar as pessoas para evitarem o desperdício alimentar, assim como dar a conhecer as consequências do desperdício alimental, nomeadamente o uso ineficiente dos recursos naturais e humanos neste contexto, bem como a poluição causada devido aos aterros sanitários para onde vai a comida desperdiçada.
DESPERDÍCIO ALIMENTAR EM PORTUGAL
Embora não existam dados oficiais, estima-se que mais de um milhão de toneladas de alimentos são deitadas ao lixo todos os anos. Estes alimentos dariam para produzir cerca de 50 mil refeições diárias, o que, provavelmente, daria para cobrir as carências alimentares dos 360 mil portugueses nesta situação. Em termos governamentais Portugal conta com a Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar, que tem atualmente vários projetos em execução e um grande objetivo: reduzir o desperdício para metade até 2030.
Veja também: Green Talk: “A maior fonte de desperdício alimentar vem do consumidor final”, Francisco Mello e Castro, Unidos Contra o Desperdício
A estratégia da CNCDA, tem como visão “combater o desperdício alimentar, uma responsabilidade partilhada do produtor ao consumidor” e integra 3 objetivos estratégicos – Prevenir, Reduzir e Monitorizar – estando definidas no respetivo Plano de Ação catorze medidas direcionadas para o combate ao desperdício alimentar desenvolvidas a partir do trabalho das várias entidades que compõem a Comissão Nacional. No que diz respeito a iniciativas no produtor, retalho e distribuição muitas são as empresas que já contribuem para reduzir este flagelo, adotando melhores práticas de gestão, acondicionamento e disponibilização de alimentos.
Se há uns anos era impraticável existir alimentos “feios” nas cadeias de supermercados, hoje em dia, já muitas destas superfícies os disponibilizam a preços mais acessíveis, incentivando os consumidores a comprar, dando até, muitas vezes, ideias alternativas para a sua confeção. Inúmeras associações, organizações e comunidades privadas têm também desenvolvido ações e iniciativas de extrema importância na redução deste problema.
Desde aplicações informáticas a projetos menos tecnológicos, muitas são as contribuições para a redução do desperdício alimentar, passando pela redistribuição de comida aos mais carenciados, a compra com descontos, dicas e receitas para reaproveitamento, sensibilização e consciencialização dos consumidores portugueses. A sustentabilidade do planeta passa por todos nós. E pela forma como tratamos os alimentos.
Artigo publicado na edição impressa da Green Savers nº3. Disponível para assinar aqui