“É fundamental minimizar o risco” dos parques eólicos offshore para as aves marinhas em Portugal



A crise climática está a impulsionar fortemente a transição para formas de produção, e também de consumo, de energia que sejam mais ambientalmente sustentáveis e que reduzam as contribuições para as emissões de gases com efeito de estufa, como o dióxido de carbono.

As energias solar e eólica em Portugal, dadas as características geofísicas do país, são as que dominam o leque das alternativas aos combustíveis fósseis, e têm proliferado sobretudo em terra. No entanto, com uma extensa área costeira, uma das maiores da Europa, Portugal está cada vez mais a olhar para o mar como local de instalação de parques de turbinas eólicas, procurando tirar partido da grande extensão da costa e das águas sob jurisdição nacional.

Entre 30 de janeiro e 10 de março passado esteve em consulta pública a proposta do Governo português sobre as áreas no mar que poderão vir a albergar parques eólicos, que permitirão gerar mais de 10 gigawatts: ao largo de Viana do Castelo, de Leixões, da Figueira da Foz, da Ericeira, da zona de Sintra-Cascais e de Sines. A concretizar-se, este projeto de energias renováveis será o maior de sempre no país.

Localização das áreas propostas pelo grupo de trabalho criado pelo Governo para a instalação de parques eólicos marinhos (a vermelho) em relação às Zonas de Proteção Especial de importância para a conservação de aves (Figura A) e em relação às Important Bird & Biodiversity Areas marinhas e costeiras (Figura B).
Fonte: Artigo da autoria de Maria Ana Dias, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Finda a fase de consulta pública, os contributos estão agora a ser analisados pelo Governo. Contudo, apesar da importância desses parques eólicos marinhos para a transição energética de Portugal, é preciso ter em atenção os impactos que essas estruturas, que serão instaladas sobre plataformas flutuantes, poderão ter sobre as populações de aves marinhas que frequentam as águas portuguesas.

Maria Ana Dias, especialista em Ecologia e docente da Universidade de Lisboa, num artigo publicado no site do Centro para a Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (CE3C), dessa mesma instituição de Ensino Superior, alerta que a produção de energia eólica offshore terá “impactos significativos na biodiversidade em particular nas aves”.

As principais ameaças a esse grupo de animais prendem-se, essencialmente, com “a mortalidade direta por colisão com os aerogeradores”, com “a perda de áreas significativas de habitat de alimentação” e com “a interferência nos movimentos migratórios, uma vez que os parques eólicos podem representar uma barreira ao voo das aves”, indica a especialista.

A colisão com as turbinas eólicas, a perda de habitat e o ‘efeito de barreira’ às migrações são as principais ameaças dos parques eólicos offshore às populações de aves marinhas e costeiras.
Fonte: Artigo da autoria de Maria Ana Dias, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Atenuar esses efeitos negativos sobre as aves marinhas assume uma importância acrescida quando se considera que esse grupo de animais é um dos mais ameaçados de extinção em todo o mundo, sendo que, segundo a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), perto de um terço das espécies estão atualmente classificadas como ‘vulneráveis’, ‘em perigo’ ou ‘criticamente em perigo’.

Em Portugal, ocorrem “várias dezenas de espécies de aves marinhas e costeiras, algumas das quais de estatuto de conservação desfavorável”, sendo que, além das espécies nidificantes, “várias dezenas de outras espécies ocorrem na nossa costa e/ou sobrevoam as nossas águas durante as suas migrações, algumas delas ficando por vários meses de inverno, outras atravessando de e para zonas de invernada mais a sul”, explica Maria Ana Dias.

Entre as que marcam presença na costa e nas águas marinhas portuguesas, contam-se espécies como o alcatraz (Morus bassanus), a ameaçada de extinção pardela-balear (Puffinus mauretanicus), a negrola (Melanitta nigra), o garajau-de-bico-preto (Thalasseus sandvicensis) e o alcaide (Catharacta skua).

Alcatraz (Morus bassanus).
Foto: Hobbyfotowiki / Wiki Commons

“Considerando o frágil estatuto de conservação e a importância da nossa costa durante várias fases do ciclo de vida das aves marinhas, é fundamental minimizar o risco que novas infraestruturas eólicas possam vir a ter para a sua sobrevivência nos nossos mares”, salienta a cientista, acrescentando que, por isso mesmo, “torna-se imperativo a realização de uma avaliação ambiental estratégica à localização de novas infraestruturas eólicas offshore, a qual deve ser informada por estudos detalhados sobre os movimentos e a distribuição das várias espécies”.





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