Entrevista a Bernardo Soares: Interações “complexas” entre humanos, animais e ecossistemas criam “cenário propício” a novas doenças



Licenciado em Medicina Veterinária pela Universidad Alfonso X El Sabio, Madrid, e com uma pós-graduação em marketing e comunicação pela Universidade Católica Portuguesa, Bernardo Soares é atualmente diretor da área de saúde (humana e animal) na UPPartner e responsável pelos One Health Pet Awards, uma iniciativa que terá lugar no dia 28 de novembro, em Lisboa, e cujo objetivo é promover uma abordagem integrada à saúde e discutir o impacto da saúde animal na saúde humana e na saúde ambiental.

Em entrevista à Green Savers, fala sobre o objetivo desta iniciativa, explica de que forma é que a saúde dos humanos, dos animais e dos ecossistemas está intimamente ligada e como é que as alterações nestas relações aumentam o risco de novas doenças.

“Criámos este projeto para destacar e reconhecer todos aqueles que já implementaram ou estão a desenvolver projetos que tocam, e cujo contributo melhora os três âmbitos: as pessoas, os animais e o ambiente”, afirma Bernardo Soares, revelando que haverá sete categorias: produtos&serviços, saúde&bem-estar, proteção&seguros, inovação&conhecimento, marketing&comunicação, impacto social e personalidade One Health.

Para o médico veterinário, proteger a saúde animal e ambiental “é imprescindível para preservar a ordem natural e o equilíbrio do planeta em que todos (co)existimos”.

– Como é que surgem os One Health Pet Awards?

Os OHPA surgem da forma natural de estar e pensar da UPPartner. Enquanto agência com um foco muito grande nas pessoas enquanto seres humanos, é inevitável considerarmos tudo o que lhes proporciona saúde, como é o caso dos animais e do ambiente. Assumindo desde já que os animais de companhia são, cada vez mais, considerados como família – tendo inclusivamente feito emergir o conceito de família multi-espécie –, é para nós um passo perfeitamente coerente centrar igualmente as nossas atenções na saúde e bem-estar dos animais e do meio que a todos nos rodeia. Um exemplo que ilustra esta nossa preocupação é uma das medidas internas que implementámos, em que concedemos dias de luto aos colaboradores que perdem um animal. Outra, foi a aposta pouco comum feita num veterinário para liderar uma área específica dentro da agência.

– Qual o objetivo e quais as principais categorias dos prémios?

São vários objetivos. Primeiro, contrariar a transformação do conceito One Health num chavão. O que nos importa realmente é evoluir através das nossas ações diretas e da repercussão que elas têm no planeta. Nesse sentido, criámos este projeto para destacar e reconhecer todos aqueles que já implementaram ou estão a desenvolver projetos que tocam, e cujo contributo melhora os três âmbitos: as pessoas, os animais e o ambiente. Paralelamente, enfatizar o papel dos veterinários na saúde pública, fator que é ignorado por muitos. Por último, mas não menos importante, enaltecer o importante papel e amplificar o extraordinário potencial que os animais de companhia podem ter na nossa vida. Haverá sete categorias: produtos&serviços, saúde&bem-estar, proteção&seguros, inovação&conhecimento, marketing&comunicação, impacto social e personalidade One Health. E teremos também um prémio destinado a todos os tutores de animais, o prémio Pawrtners in Life, que premiará as histórias mais impactantes e partilhadas entre ambos. 

Criámos este projeto para destacar e reconhecer todos aqueles que já implementaram ou estão a desenvolver projetos que tocam, e cujo contributo melhora os três âmbitos: as pessoas, os animais e o ambiente.

– Quais os Critérios utilizados para a seleção dos vencedores?

Através de um painel de jurados de reconhecida excelência, e com uma imparcialidade mandatória, basearemos os critérios na aplicação de práticas inovadoras e orientadas para a sustentabilidade, no impacto dos três pilares One Health, na repercussão na sociedade e, muito importante, no fator replicabilidade, numa ótica de expansão e evolução dos projetos em causa.

– De que forma é que a Saúde dos humanos, dos animais e dos ecossistemas está intimamente ligada e como é que as alterações nestas relações aumentam o risco de novas doenças?

Vivemos num mundo em permanente transformação e com uma influência (e afluência) humana cada vez maior, para o melhor e para o pior, mas com uma exacerbada tendência para este último. Mesmo tendo em conta a capacidade auto-regenerativa do nosso planeta e da natureza, estes possuem os seus próprios limites que devemos evitar a todo o custo transpor. As palavras-chave são equilíbrio e respeito. Estes dois só se alcançam se reconhecermos e agirmos em função da íntima ligação entre humanos, animais e ecossistemas. A título de exemplo, a desflorestação e a perda de biodiversidade provocam um aumento da proximidade entre humanos e animais selvagens, aumentando a probabilidade de transmissão de zoonoses como a malária. Outro exemplo muito claro são as alterações climáticas. Aumentando a temperatura média, expande-se o habitat de vetores de doenças, como mosquitos, propagando doenças como a dengue.

A desflorestação e a perda de biodiversidade provocam um aumento da proximidade entre humanos e animais selvagens, aumentando a probabilidade de transmissão de zoonoses como a malária.

– As relações entre a saúde humana, animal e ambiental exigem uma estreita colaboração, comunicação e coordenação entre os setores relevantes. Que colaboração deve ser essa?

A colaboração deverá ser multidisciplinar e deve envolver a integração de profissionais de saúde humana, veterinária e ambiental para monitorizar e responder a surtos de doenças, promover práticas agrícolas sustentáveis, regular o comércio de animais selvagens e implementar políticas de conservação ambiental. Esta cooperação transetorial, e sempre que necessário transfronteiriça, é essencial para detetar precocemente ameaças à saúde, desenvolver estratégias de prevenção e resposta eficazes, e garantir um ambiente saudável para todos.

– De acordo com os dados mais recentes da Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 60% das doenças infeciosas relatadas mundialmente são zoonoses, sendo que os animais domésticos são umas das principais fontes de partilha do vírus, ainda mais do que os animais selvagens. O que são estas zoonoses?

A colaboração deverá ser multidisciplinar e deve envolver a integração de profissionais de saúde humana, veterinária e ambiental para monitorizar e responder a surtos de doenças, promover práticas agrícolas sustentáveis, regular o comércio de animais selvagens e implementar políticas de conservação ambiental

As zoonoses são doenças naturalmente transmissíveis entre animais vertebrados e humanos. Podem ser causadas por uma variedade de agentes patogénicos, incluindo bactérias, vírus, parasitas e fungos. A sua transmissão pode acontecer através de várias vias, como contacto direto com animais infetados, ingestão de alimentos ou água contaminados, picadas de insetos vetores, ou pelo ambiente.

– É preciso cuidar da saúde animal e ambiental também para evitar futuras pandemias?

É crucial valorizar e cuidar destas três saúdes com o mesmo grau de zelo. As interações complexas, e muitas vezes irrefletidas, entre humanos, animais e ecossistemas criam um cenário propício para a emergência de novas doenças. Proteger a saúde animal e ambiental é imprescindível para preservar a ordem natural e o equilíbrio do planeta em que todos (co)existimos.

 

 

 





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