Mercado do cânhamo em Portugal com margem de crescimento mas regras são penalizadoras



O mercado do cânhamo tem margem para crescer em Portugal, permitindo a regeneração dos terrenos e a captação de dióxido de carbono, mas as regras em vigor são penalizadoras para o setor, defendeu Graça Castanho da confraria cannabis Portugal.

O cânhamo é uma planta da espécie ‘cannabis sativa’, utilizada nas indústrias têxtil e cosmética, na alimentação, produção de papel e na construção.

“Na literatura da especialidade estão consagrados 25.000 produtos e subprodutos à base de cânhamo, uma vez que se trata de uma super-planta com potencialidades tremendas, capazes de dar uma resposta eficaz, sustentável e biodegradável às mais poluentes e devastadoras indústrias poluentes do mundo, como o combustível fóssil, indústria automóvel, têxteis com fibras sintéticas, plásticos, cosméticos e construção civil”, apontou, em resposta à Lusa, a presidente da Assembleia da Confraria Internacional Cannabis Portugal, Graça Castanho.

De acordo com a também docente universitária e fundadora da CannaPortugal e CannaAzores (Expo de canábis e cânhamo), em Portugal continental, a matéria-prima que resulta da produção de cânhamo destina-se, sobretudo, ao fabrico de blocos têxteis.

Já nos Açores contabilizam-se agora oito produtores, em São Miguel, Terceira e Flores, que pretendem focar-se em áreas como a construção civil, gastronomia, alimentação para animais, têxteis, chá, cosméticos e tabaco.

Ainda assim, lembrou que Portugal aguarda a possibilidade de utilização das flores para a produção de óleos terapêuticos.

“A população em geral está cada vez mais aberta às soluções que o cânhamo permite. Sente-se, porém, que os jovens são os mais informados e entusiastas”, referiu, destacando que em Portugal existe margem para o crescimento deste mercado.

Para Graça Castanho, Portugal está ainda muito abaixo do seu potencial, sendo necessário produzir em larga escala para a “regeneração dos terrenos, despoluição das águas, descontaminação de solos, captação de CO2 [dióxido de carbono] e expansão de novas indústrias da sustentabilidade”.

As maiores produções de cânhamo em Portugal estão no Alentejo, em particular, em torno da fábrica de blocos da Cânhamor.

A Confraria Internacional Cannabis Portugal espera um ‘boom’ neste setor, nos próximos anos, tendo em conta o número de interessados em projetos de produção de cânhamo. Contudo, deseja que a regulamentação possa ser “mais flexível e ajustada” ao mercado.

Neste âmbito, considerou que os produtores de cânhamo estão a ser penalizados face aos restantes, exemplificando que estes não se podem candidatar a créditos de carbono.

Atualmente, as restrições aplicam-se, por exemplo, às dimensões dos terrenos, além da proibição da exploração das flores e da reutilização de sementes de ano para ano.

“Com estes constrangimentos mal temos matéria-prima para as necessidades das indústrias existentes. Exportar cânhamo é, neste cenário, algo fora do nosso alcance”, concluiu.

Por sua vez, a Associação Portuguesa do Cânhamo (CannaCasa) lamentou que o setor tenha vários dos seus agricultores “com processos judiciais” a decorrer ou com os seus materiais apreendidos.

Alguns destes casos dizem respeito ao início da produção, sem a aprovação regulamentar específica, o que já foi descrito como um ato de protesto contra os atrasos no licenciamento, a cargo da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV).

A CannaCasa vincou ainda que as restrições violam princípios como o direito ao minifúndio ou à agricultura familiar.

“Os limites de área, os limites relativos aos métodos de cultivo e propagação, a restrição à fibra e sementes […] fazem com que esta atividade seja muito pouco atrativa para os pequenos agricultores”, insistiu.

Os esclarecimentos técnicos da DGAV revelam que a produção de semente certificada para sementeira, da espécie cannabis sativa, independentemente do uso, está abrangida por um decreto que regula a sua produção, o controlo e a certificação.

Os produtores são obrigados a estar licenciados pela DGAV e as variedades têm de estar inscritas no Catálogo Comum de Variedades de Espécies agrícolas.

No caso da produção de plantas para plantação, os operadores têm de ser licenciados pelo Infarmed (Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde).

É necessário um passaporte fitossanitário para cada lote de plantas destinadas a ser movimentadas dentro da UE.

Para as plantas destinadas a outro operador de Portugal é necessária uma declaração da entidade recetora das plantas, a identificação do número de licenciamento, denominação dos clones e número de plantas, bem como a assinatura de um técnico responsável.

Caso estas sejam destinadas a um operador de outro Estado-membro, é exigida uma cópia do certificado de exportação e de importação e a descrição da remessa.

Segundo dados da Comissão Europeia, a superfície dedicada ao cultivo de cânhamo, na União Europeia (UE), passou de 19.970 hectares para 34.960 hectares entre 2015 e 2019.

Neste período, a produção aumentou de 94.120 toneladas para 152.820 toneladas, um acréscimo de 62,4%.

Destaca-se França, que representa 70% da produção da UE, seguida pelos Países Baixos (10%) e pela Áustria (4%).

 





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