Mover orangotangos de um lado para o outro não é a melhor forma de protegê-los

A translocação de orangotangos de um local para o outro é uma prática usada pelos conservacionistas e agências estatais de proteção da Natureza para evitar que esses primatas causem danos das produções agrícolas ou para transferi-los para habitats com melhores condições.
As três espécies conhecidas de orangotango – orangotango-de-sumatra (Pongo abelii), orangotango-do-bornéu (Pongo pygmaeus) e orangotango-de-tapanuli (Pongo tapanuliensis) – estão todas ameaçadas de extinção, sendo o orangotango-de-tapanuli considerada a espécie de primata que enfrenta o maior risco de extinção.
Por isso, transferir animais que possam estar em perigo, seja de retaliação humana por danos provocados a culturas agrícolas ou devido à fragmentação do seu habitat, é vista como uma forma de ajudar a proteger as espécies de orangotangos.
Contudo, uma nova investigação, publicada esta semana na revista ‘PLOS One’, revela que as translocações não só não ajudam a conservar os orangotangos, como podem ser altamente prejudiciais para os indivíduos que são capturados, retirados dos locais que conhecem e colocados em áreas que lhes são estranhas.
Analisando dados sobre centenas de translocações feitas na Indonésia entre 2005 e 2022, a equipa de cientistas, liderada pela organização Wildlife Impact (Estados Unidos da América) e pela Liverpool John Moores University (Reino Unido), mostra que mesmo quando os orangotangos são levados para locais a vários quilómetros das áreas onde foram capturados, cerca de um terço dos animais acaba por tentar regressar ao local de onde foram retirados.
Na Indonésia, dizem os autores em comunicado, a prática de transferir orangotangos de um lugar para outro é frequente quando se pretende que a área ocupada pelos animais seja usada para agricultura, extração de madeira e minerais e para construção de estradas. Mas isso não é solução, defendem os cientistas.
“Levar os animais para fora de vista pode ser conveniente para os humanos, mas está a ter consequências para estes majestosos animais”, lamenta Serge Wich, um dos principais autores do estudo.
A Indonésia e a Malásia são os últimos baluartes dos orangotangos, mas mesmo aí as populações registaram quedas entre os 15% e os 20% nos últimos 20 anos, e continuam em declínio, especialmente devido à perda de habitat fruto da expansão de produções agrícolas de grande escala, para a produção de óleo de palma, por exemplo.
Wich diz que as translocações agravam a fragmentação das populações de orangotangos e interferem negativamente com a estrutura social dos grupos e também com as dinâmicas genéticas. Além disso, uma vez que os orangotangos tendem a ser agressivos para com outros indivíduos que não conhecem e que não façam parte do seu grupo habitual, colocá-los em locais desconhecidos e com outros orangotangos pode gerar conflitos.
Mesmos quando movidas por genuínas intenções de proteger os animais, as transferências são prejudiciais, pelo que Julie Sherman, diretora da Wildlife Impact e primeira autora do artigo, considera que o foco deve estar na conservação no local “que priorize a mitigação de conflitos e a proteção do habitat” e que a translocação deve ser encarada somente como medida de último recurso.
Os autores sugerem que muitas translocações feitas sob a bandeira da proteção dos orangotangos dos efeitos negativos das atividades humanas são, na verdade, feitas porque as pessoas e as empresas olham para eles como inconvenientes.
“A maioria das translocações são realizadas porque as pessoas veem os orangotangos perto das suas culturas, não porque os orangotangos estão a causar prejuízos nessas culturas”, aponta Felicity Oram, diretora da organização conservacionista Orang JUGA e uma das coautoras do artigo.
Os investigadores apelam aos legisladores, às comunidades locais e aos conservacionistas que se foquem mais na proteção no local e menos nas translocações dos orangotangos, caso estejam a menos de cinco quilómetros de área florestada. E pedem a proprietários de terras e empresas que façam mais para preservar zonas de floresta, sejam grandes ou pequenas parcelas.
“Adotar uma estratégia holística para proteger e conectar habitats fragmentados e trabalhar com comunidades para permitir a coexistência reduzirá a procura por translocações arriscadas, protegerá as populações selvagens e melhorará a coexistência entre humanos e orangotangos”, considera Wich.