Musgo: A ‘fénix’ do mundo vegetal que protege os solos e pode ser a chave para a sua recuperação
A presença de musgo pode, aos olhos de muitos, ser considerada sinal de desmazelo ou mesmo de abandono de um dado terreno, pelo que a tentação poderá ser para removê-lo. No entanto, tal pode deixar o solo mais vulnerável, por exemplo, à erosão.
Uma investigação realizada por dezenas de cientistas de vários países aponta mesmo que os musgos, plantas ancestrais não-vasculares que pertencem ao grupo dos briófitos, a meio caminho entre as algas e a primeira flora que colonizou o meio terrestre, são fundamentais para a saúde dos solos em todo o mundo. Estima-se que hoje existam mais de 14 mil espécies diferentes de musgos, espalhadas pelos quatro cantos da Terra.
Num artigo publicado esta semana na revista ‘Nature Geoscience’, os investigadores escrevem que quando o musgo cresce na camada mais cimeira dos solos cria as condições ideias para que as plantas prosperem. Além disso, dizem, poderá mesmo ser um aliado essencial contra as alterações climáticas, uma vez que ajuda a capturar e a reter grandes quantidades de dióxido de carbono da atmosfera.
Os mais de 50 cientistas que fizeram parte deste trabalho analisaram amostras de musgo recolhidas em mais de 123 ecossistemas espalhados por todo o planeta, desde florestas tropicais luxuriantes às paisagens aparentemente inóspitas das regiões polares geladas, passando pelos desertos. Contas feitas, os musgos cobrem uma área total combinada de 9,4 milhões de quilómetros quadrados dos ambientes estudados, algo comparável à dimensão do Canadá ou da China.
Para este estudo, os cientistas quiseram perceber “o que estaria a acontecer em solos dominados por musgos e o que estaria a acontecer em solos onde não existiam musgos”, explica David Eldridge, da Universidade de New South Whales, na Austrália, e principal autor do artigo. E constataram que o musgo é o coração pulsante dos ecossistemas de plantas, uma vez que, por exemplo, estimulam a circulação de nutrientes, impulsionam a decomposição de matéria orgânica, o que ajuda a manter o solo saudável, e até promovem o controlo de doenças prejudiciais às próprias plantas e até aos humanos.
No que toca aos seus ‘poderes’ de absorção de carbono, os investigadores calculam que, comparando com solos desprovidos de musgos, essas plantas ancestrais são capazes de armazenar, globalmente, 6,43 mil milhões de toneladas de carbono retirado da atmosfera. Como tal, o seu papel no combate às alterações climáticas é central e, argumentam os autores, podem absorver até seis vezes mais dióxido de carbono do que o que é emitido por práticas agrícolas insustentáveis, como a desflorestação e o pastoreio excessivo.
Apesar de não serem considerados plantas superiores, por não terem sistemas vasculares (xilema e floema), os musgos são exemplos flagrantes de resiliência na face da adversidade. Explica Eldridge que em áreas desérticas, os musgos, na ausência de água, secam e mirram, mas não chegam a morrer, “vivem em animação suspensa para sempre”.
O cientista recorda que certa altura foi recolhida uma amostra de musgo completamente seca que se estimava ter cerca de 100 anos. Foi borrifada com água e, tal como a mitológica fénix, renasceu. “As suas células não se desintegram como acontece nas plantas comuns.”
“O que mostramos com a nossa investigação é que onde quer que existam musgos teremos um solo mais saudável, com mais carbono e nitrogénio”, salienta, acrescentando que essas plantas primitivas são essenciais para ajudar a flora a recuperar em áreas degradadas e, assim, para regenerar florestas e muitos outros ecossistemas.
“Os musgos podem muito bem servir de veículos para catalisar a recuperação de solos gravemente degradados em áreas urbanas ou naturais”, observa Eldridge.