Novos compromissos climáticos reduzem apenas ligeiramente projeções de aquecimento global



As mais recentes promessas climáticas apresentadas pelos países ao abrigo do Acordo de Paris tiveram um impacto mínimo nas projeções de aquecimento global. Segundo o Relatório sobre a Lacuna de Emissões 2025, publicado esta segunda-feira pelo Programa das Nações Unidas para o Ambiente (UNEP), o planeta continua a caminho de um aumento médio de temperatura entre 2,3°C e 2,5°C até ao final do século, uma descida modesta face aos 2,6°C a 2,8°C previstos no relatório do ano passado.

Apesar desta ligeira melhoria, o UNEP alerta que o mundo segue ainda “em rota de colisão com riscos e danos climáticos graves”. Se os países mantiverem apenas as políticas atualmente em vigor, o aquecimento poderá chegar aos 2,8°C, valor muito acima da meta estabelecida no Acordo de Paris de “limitar o aumento da temperatura bem abaixo dos 2°C, com esforços para não ultrapassar 1,5°C”.

A análise mostra que menos de um terço das Partes do Acordo de Paris — 60 países, responsáveis por 63% das emissões globais — apresentaram ou anunciaram novas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) com metas de redução até 2035.

“Os cientistas dizem-nos que uma ultrapassagem temporária dos 1,5 graus é agora inevitável – começando, o mais tardar, no início da década de 2030. Mas isso não é motivo para desistir, é motivo para acelerar,” afirmou o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, numa mensagem sobre o relatório. “O limite dos 1,5 graus continua a ser a nossa estrela-guia. E a ciência é clara: essa meta ainda é alcançável, mas apenas se aumentarmos de forma significativa a ambição.”

A diretora executiva do UNEP, Inger Andersen, reforçou a urgência: “os países já tiveram três oportunidades para cumprir as promessas feitas no Acordo de Paris, e em todas ficaram aquém. Há progresso, mas é demasiado lento. Precisamos de cortes sem precedentes nas emissões, num contexto global cada vez mais difícil.”

Segundo Andersen, as soluções existem: “Temos o crescimento rápido das energias renováveis, que são cada vez mais baratas, e sabemos como reduzir as emissões de metano. Falta vontade política. É tempo de os países apostarem seriamente num futuro sustentável — com crescimento económico, mais empregos e maior segurança energética”, avisa.

A meta de 1,5°C em risco

O relatório conclui que a média global das temperaturas excederá temporariamente 1,5°C nas próximas décadas, um cenário difícil de reverter. Para minimizar o impacto, serão necessárias reduções adicionais de emissões “rápidas e profundas”, de modo a reduzir os danos económicos, ambientais e humanos, e a evitar uma dependência excessiva de tecnologias de remoção de carbono ainda incertas.

De acordo com o UNEP, para alinhar com as metas do Acordo de Paris, as emissões em 2030 terão de cair 25% face aos níveis de 2019 para limitar o aquecimento a 2°C, e 40% para o cenário de 1,5°C. Contudo, os atuais compromissos permitiriam apenas uma redução de 15% até 2035, e a saída anunciada dos Estados Unidos do Acordo de Paris deverá agravar ainda mais estas perspetivas.

Cada fração de grau conta

O relatório destaca que cada décimo de grau evitado representa menos destruição, menos perdas humanas e económicas, e uma menor probabilidade de ultrapassar pontos de não retorno no sistema climático. Para inverter um aumento de apenas 0,1°C, seria necessário remover e armazenar permanentemente o equivalente a cinco anos das emissões globais atuais de CO₂ — um desafio técnico e económico de enorme escala.

Um dos cenários estudados pelo UNEP, designado “ação rápida de mitigação a partir de 2025”, mostra que é possível limitar o excesso de aquecimento a cerca de 0,3°C, com uma probabilidade de 66%, e regressar aos 1,5°C até 2100. Para isso, seria necessário cortar as emissões em 26% até 2030 e em 46% até 2035, em comparação com 2019.

A tecnologia existe — falta vontade política

Desde a adoção do Acordo de Paris, há dez anos, as projeções de aquecimento global caíram de 3-3,5°C para cerca de 2,4°C, em parte graças ao avanço das tecnologias limpas. A energia solar e eólica conheceu uma expansão sem precedentes, tornando-se mais acessível. No entanto, o relatório sublinha que a aceleração da ação climática exige uma transformação profunda da economia global, uma maior cooperação internacional e apoio financeiro massivo aos países em desenvolvimento.

A liderança do G20 será decisiva: os seus membros, excluindo a União Africana, representam 77% das emissões globais. Apenas sete apresentaram novas metas para 2035, e outros três anunciaram intenções nesse sentido — compromissos ainda considerados insuficientes. Em 2024, as emissões do G20 cresceram 0,7%, sinal de que “os maiores emissores precisam de intensificar urgentemente a ação climática”.

“Ainda é possível evitar o pior, mas o tempo está a esgotar-se”, conclui Inger Andersen. “Cada ano de inação torna o caminho mais íngreme — e mais caro.”






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